O quão audível é o silêncio de um homem que espera a morte?
Em O Nome do Vento, primeiro livro de A Crônica do Matador do Rei, escrita pelo norte-americano, Patrick Rothfuss, somos apresentados à Kvothe — ou Kote — e para ele, esse silêncio se divide em três partes, assim como sua história se divide em três dias, e é com este melancólico prenúncio de pesar, que o leitor inicia sua aventura pela obra.
O Nome do Vento é o romance de estreia de Rothfuss, lançado pela primeira vez em 2007, nos Estados Unidos, onde entrou para a lista dos mais vendidos do The New York Times e foi aclamado pela crítica, o que é considerado uma enorme conquista, uma vez que anteriormente o livro foi enviado para diversas editoras, sendo rejeitado. Em 2009, o primeiro volume da trilogia A Crônica do Matador do Rei foi publicado no Brasil pela Editora Arqueiro.
O UNIVERSO APRESENTADO
Há melodia nas palavras de Rothfuss e na forma com a qual elas se encaixam umas nas outras, algo que é trabalhado ao longo de todos os livros que compõe o universo de A Crônica do Matador do rei, para essa história, nomes e palavras, são as coisas mais importantes e toda a narrativa gira em torno disso, algo que é mencionado não só pelo protagonista Kvothe, como também por outros personagens, como o enigmático Professor Elodin, que diz em determinado momento que “As palavras são sombras pálidas de nomes esquecidos. Possuem poder, tal como os nomes. As palavras conseguem atear chamas nas mentes dos homens. Conseguem extrair lágrimas ao coração mais duro…”
O Nome do Vento é uma história sendo contada. Primeiramente, somos introduzidos à vida de Kote, dono da pousada Marco do Percurso, e também do terceiro silêncio, o silêncio de um homem que espera a morte. Logo depois, descobrimos que ele é ninguém mais ninguém menos que Kvothe, alguém que é uma espécie de lenda naquele mundo fantasioso e que por motivos ainda desconhecidos, se esconde. Ele é encontrado pelo Cronista, Devan Lochees, que busca contar sua história. Kvothe aceita e decide que irá contá-la em três dias, devido a isso, cada livro da trilogia, é um período da vida de Kvothe que se encerra.
Kvothe é o narrador de todos os feitos que o tornaram uma lenda e o levaram até o presente momento, em que se tornou um mero dono de pousada chamado Kote, e por sua vez, não é confiável, como dito por ele mesmo nas páginas iniciais da história “Eu sou um mito. Um tipo de mito muito especial, que cria a si mesmo. As melhores mentiras a meu respeito são as que eu contei.” A cronologia, portanto, é um jogo temporal, com idas e vindas entre passado e presente, o que move o leitor em sua leitura, uma vez que ficamos exasperados por respostas de como alguém que queimava com porfia, apagou-se ao ponto de ser cercado por três tipos de silêncio, sem sequer ouvir melodia em algum deles, o que nos leva a outro ponto importante da história: a música.
Se há palavra, há música e nosso protagonista entende de ambos. A infância vivida em uma trupe itinerante garantiu isso. Ao decorrer do livro, somos apresentados a diferentes canções, algumas perigosas e outras divertidas, entretanto, todas carregam um significado oculto, que instiga o leitor a permanecer ali e descobrir os mistérios que cada mínimo detalhe guarda consigo.
Outro ponto que vale destacar na escrita de Rothfuss, são os personagens secundários aos quais somos apresentados. Todos eles surgem como um contraponto ao personagem principal, seja sendo tudo o que ele não é, seja representando partes dele que foram perdidas ao longo de seu crescimento nada fácil. No presente, somos introduzidos unicamente à Bast, aprendiz de Kvothe e que busca de todas as formas, fazer com que ele volte a ser quem era, assumindo a identidade da lenda que se tornou. No passado, porém, somos apresentados a um grupo mais fechado de amigos felizes, que aproveitam o melhor que a juventude pode oferecer, apesar de toda adversidade. O que outra vez guina o leitor por entre as páginas, afinal, o que aconteceu com aqueles amigos? O elo que os ligava era forte, é difícil imaginar algo que faria com que aquelas amizades se perdessem. E, como em toda boa história fantástica, em O Nome do Vento, também há mulheres e interesses, por elas e por trás delas, o que faz com que a mesma pergunta se repita de forma incansável: o que aconteceu com tudo isso?
O Nome do Vento, a escrita de Rothfuss e tudo o que compõe esse maravilhoso universo fantástico, são uma ode às palavras, o dever do leitor portanto, não é lê-las, mas senti-las e junto de Kvothe, ir atrás do desejo de seu coração, que será o grande responsável por selar seu destino e fazer com que voltemos ao presente, ao dono da pousada, à chama apagada e a lenda desaparecida.