Sinceramente, amor.

andy souza
literato
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4 min readOct 17, 2021

As flores ainda irão brotar com a passagem das cores das estações. O sol continua a despencar e aninhar-se no horizonte em um ciclo repetitivo, o faz religiosamente todos os dias. E com sua despedida temporária, a noite também chega, convidando as estrelas a darem seus últimos ou mais novos suspiros, porque nem todas elas se perpetuarão para a eternidade, mas mesmo assim, tantas outras nascem para não deixarem a imensidão azulada sozinha e apagada.

Essas inconstantes chegadas e partidas me lembram do quanto o sentimento que carrego não apazigua em sua latência nem por um segundo. Nem mesmo quando a vida chama e as horas acabam me soterrando com o acúmulo de pendências que não tenho como fugir, ainda que as postergue para o amanhã. Mas, com esse sentimento, nunca é assim. Não há antídoto para a doença da qual eu sofro, não há cura para o que envolve o meu peito e me carrega no colo sem que nem ao menos seja perceptível aos olhos mundanos, porque na realidade, ele me queima por dentro.

Ele irriga a minha alma e a desidrata ao mesmo tempo. O sentimento que me traz paz, guarda em sua essência o desespero em forma de espera. Uma espera da qual nunca me vem uma resposta, e eu a interrogo: “onde ele está”, com as lágrimas solitárias derramadas em minha face, como se um oceano feito delas fosse capaz de cortar a agonia que mastigo em silêncio.

E não é. Nunca é.

A coleção de esperança que me sorria, já não me preenche como antes. Foi perdendo a força em meu âmago. Ao longo dos verões eu pegava aquela cadeira de madeira e a colocava em frente a porta. Sentada ali, encarava a vida acontecer do lado de fora de mim, sempre levada por uma sensação, sempre procurando por um vestígio, sempre apegada a crença de que eu te veria de novo, de que você voltaria para mim, de que eu finalmente poderia te dizer o nome daquele sentimento que me põe para ninar e me faz levantar no dia seguinte.

Eu tateava com os olhos o mundo pronta para carimbar a silhueta do seu ser, mas também era cega demais para entender que o chumaço de fios escuros, que a altura compatível com a sua, que uma voz ao longe, tão fora de alcance, mas legível o suficiente para disparar o meu coração, não eram o bastante para que você retornasse.

Antes de compreender o meu sofrer, eu ficava inquieta, com a expectativa consumindo além das evidências deixadas nas unhas roídas. E o tanto de vezes em que coloquei aquela cadeira para fora, resultou em uma tortura auto infligida com a sua partida, a ânsia em te rever era catastrófica, porém, a incerteza de não saber se isso poderia acontecer era ainda mais devastadora.

No aguardo, aprendi a rezar. No canto ecoado pelo meu choro, desejei que você estivesse diante de mim. No praguejar feroz movido pelo ódio momentâneo, invoquei o inferno e desrespeitei todos os santos. Na secura da temporada, quando nada mais poderia ser extraído do meu íntimo, meu peito gritava cada sílaba do seu nome, só para testar, só para ver se ainda me lembrava de como seria dizê-lo, só para quem sabe assim, eu pudesse te invocar em presença, por toda parte, não somente dentro de mim.

Mas o não foi a sentença que vingou no meu destino. Não te vi, não te vivi, não te envolvi nos meus braços, não te cheirei com meu sentir, não provei da tua pele, não pude mais te ouvir. E me fiz de pedra, não saí do lugar, não parei de estender minha mão para te buscar, não joguei aquela cadeira fora, nem esse sentimento e muito menos a coleção de esperança que após tanto tempo, reside aos prantos, embora tão brilhante quanto antes, na minha caixinha de memória empoeiradas.

Uma caixinha tão pequena, mas que guarda o segredo de duas vidas que mantive aceso até o fim do meu existir. Um segredo que sempre pertenceu a você, que apenas poderia ser decifrado pela sua frequência cardíaca que batia no mesmo compasso, no mesmo ritmo, na mesma melodia que a minha, porque eu sempre fui sua.

Eu sempre serei.

E mesmo após tudo, ainda espero por você, anseio por você. Querendo tanto você, eu carrego aquela mesma velha cadeira, com a mesma caixinha mantida em segurança me fazendo companhia e vou visitar o oceano que nos separou. Sento, olho o manto azul imenso de cima abaixo; céu e mar compondo a sinfonia do meu peito. Em poucos segundos, pego mesma carta, a qual te escrevo. E com o sentimento que tanto nos cuidou até aqui, recito ao ar, fazendo um pacto com o divino em que ele me prometeu conduzir estas palavras até você, audível o suficiente para que ambos os nossos corações pudessem escutar, revelo:

“Aquele sentimento que nunca pôde ser dito sempre teve um nome, o seu nome era apenas um codinome para ele, mas o verdadeiro sempre foi: amor. E amor, eu amo você”.

“Eu também te amo”. Foi o que eu pude ouvir de volta.

Antes que a minha despedida desse mundo pudesse finalmente me levar embora, ao seu encontro.

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andy souza
literato

pseudo-várias coisas relacionadas ao viver, especialmente em ser escritora.