Feriado

Um dia, afinal, tinham direito a uma alegria fugaz.

Guilherme Oliveira
Literatura Brasileira

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Júlio acordou sobressaltado com o alarme que apitava. Piscou algumas vezes, esfregou os olhos e tateou em busca do celular na mesa de cabeceira. Ficou parado por alguns segundos com a tela próxima ao rosto, procurando distinguir, na escuridão do quarto, o mostrador da hora.

Cinco e meia.

Cinco e meia???

É, cinco e meia.

Levou algum tempo para lembrar que é mesmo, é verdade, são cinco e meia e eu tenho que levantar. Desvencilhou-se preguiçosamente das cobertas, bocejando, calçou o único pé de chinelo que encontrou imediatamente e arrastou-se para o banheiro.

Lavar o rosto. Fazer a barba. Escovar os dentes. Fazer a bar… não, peraí, isso já foi. Tomar café. Cadê a máquina de Nespresso? Ah é, na cozinha. Pra onde mesmo? Atravesse a porta. Cheguei. Não, aqui é o box. A outra porta.

Bebida pronta, Júlio voltou ao quarto de xícara em mãos para reunir e vestir as roupas. Verificou rapidamente o cheiro da camisa do dia anterior, que encontrou embolada sobre uma cadeira, e aprovou-a. Calça, cinto, meias, sapatos. Por fim, a gravata, colocada de qualquer jeito. Ajustaria no ônibus.

Saiu de casa empunhando a maleta e contando moedas, rumo à parada. Encontrou-a já cheia de caras amarrotadas e pernas impacientes que trocavam entre si o peso de seus corpos ainda pesados de sono. Embarcou no primeiro baú que chegou, acotovelando pessoas e tentando ganhar terreno na multidão.

Engraçado. Aglomeração, tumulto, empurra-empurra. Lembrou do que o esperava a partir do dia seguinte. Riu silenciosamente. Mas ainda tinha o último dia pela frente.

Depois de meia hora em pé, sacolejando e trombando nos coirmãos de trajeto a cada freada e curva, Júlio chegou ao destino. Era uma curta caminhada até o escritório, com uma rápida escala na padaria para abocanhar um pão na chapa e comprar um maço de cigarros. Optou por levar vários. Não sabia quando, nem se, ia encontrar alguma coisa aberta depois do expediente e nos dias que se seguissem.

Chegou dando um apressado alô aos colegas. Sentou-se, ligou o computador e de pronto abriu o arquivo do relatório que estivera escrevendo naquela semana. Faltavam ainda algumas páginas, mas queria terminá-lo. Nada deveria ficar para depois do Carnaval.

Batucou o dia inteiro, parando de quando em quando para pedir alguma informação importante a determinado setor ou solicitar instruções ao chefe. Depois de um almoço rápido, reunião de departamento. Conseguiu se livrar dela a tempo de revisar o relatório antes de imprimi-lo e pousá-lo, aconchegado dentro de uma pastinha personalizada da empresa, na mesa do patrão. Meta cumprida.

Faltavam ainda alguns minutos para bater o ponto e ir embora. Recostou-se descontraído na cadeira, com um copo de café, e passou a bater papo com os colegas. Compartilharam planos, programas e festas até a hora de largar. Despediram-se efusivamente, antevendo esbarrarem-se em qualquer farra por aí, quem sabe. Se é que fossem se reconhecer, do jeito que estariam.

“Caso a gente não se veja”, concluiu Júlio, acenando, “até o ano que vem!”

Voltou para casa sorridente, satisfeito por mais um feriado de dever cumprido. Após aqueles dias de trabalho duro, era hora de voltar ao Carnaval. Essa fantasia de escritório já estava ficando ridícula, o cavaquinho precisava ser afinado e havia uma morena para quem ele havia ficado de ligar logo na manhã seguinte. A velha rotina de novo.

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