Relatos de um Náufrago é a tradução do desespero

Diego Mahs
Entrelivros
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3 min readJun 11, 2019
Photo by Evgeni Tcherkasski on Unsplash

Gabriel García Márquez é famoso tanto por sua obra de ficção, quanto por seus livros de reportagens. Ele consegue mesclar um estilo de fácil assimilação a críticas políticas. Tanta criatividade culminou em muitos prêmios, inclusive o Nobel de Literatura, em 1982.

Aos 28 anos, quando Gabo (como é carinhosamente chamado) trabalhava no jornal El Espectador, recebeu uma proposta para escrever a história de Luis Alejandro Velasco, um marinheiro que estava a bordo de um destróier da marinha colombiana que havia afundado quando voltava da cidade americana de Mobile.

Com um senso de inovação muito apurado, Gabo decidiu contar uma história em primeira pessoa, passando-se pelo náufrago Luis Alejandro Velasco. Tarefa difícil, porém executada com maestria por um dos maiores escritores latino-americanos. Poderia facilmente ter ganhado reconhecimento por tamanha façanha, mas, ao em vez disso, publicou a história no nome do próprio Velasco.

Quando chegou ao jornal El Espectador, a história de Luis Velasco já havia sido divulgada por vários meios de comunicação. Ele ganhou fama por ter sobrevivido 10 dias no mar, sem água e sem comida. Após o naufrágio, a poucas horas da costa colombiana, o marinheiro foi o único a conseguir chegar a uma pequena balsa e nela ficou até alcançar uma vila de pescadores na Colômbia

Na época, a Colômbia vivia uma ditadura militar, por isso parte da história foi usurpada pelos militares. Velasco virou um herói nacional, símbolo da ditadura, ganhou fama e dinheiro. Foi só depois disso que o então herói se dirigiu ao El Espectador, quando sua popularidade começou a diminuir.

O repórter Gabriel Garcia Marquez percebeu que faltava algo na história e, nessa brecha, viu que poderia trazer uma nova abordagem, um novo jeito de contar de uma vez por todas o naufrágio. A iniciativa ajudou a dar fim ao seu emprego.

A história contada e o fim do El Espectador

Quando o navio partiu de Mobile em direção a Cartagena de Las Índias, o destróier carregava produtos contrabandeados pela própria ditadura. Esse foi o ponto central que trouxe dor de cabeça à ditadura, ao jornal e a Velasco.

Quando as matérias de Gabo começaram a sair no jornal, o governo colombiano não só elogiou, mas também as divulgou. As coisas começaram a mudar com a publicação da parte em que contava sobre o contrabando. Os militares negaram tudo, desmentiram o jornal, mas a reviravolta aconteceu quando fotos tiradas do destróier, dias antes do naufrágio, apareceram no jornal mostrando o contrabando e desmascarando o governo.

Em represália, o governo fechou o jornal, a matéria ficou esquecida e Gabo ganhou destaque com outras obras, como Cem anos de Solidão, de 1967. Foi só em 1970 que o crédito pela história foi dado a Gabo.

Veredito

Relatos de um Náufrago é uma aula do começo ao fim, com descrição impecável. Gabo consegue se colocar no lugar do marinheiro, resolver o problema de ter apenas uma fonte a falar do naufrágio e dos dez dias à deriva no mar. Contou como Velasco sobreviveu, as alucinações. o que ele comeu e como foram os dias sem tornar o livro monótono. Cada página puxa o leitor a ler outra, e outra, e outra. Não é difícil afirmar que este livro é uma das principais obras de jornalismo da América do sul.

Onde encontrar

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Diego Mahs
Entrelivros

Estudante de jornalismo e apaixonado por livros.