The Whale | Muito mais que uma luta pela sobrevivência

Anna Clara Lôbo
Lôba no Covil
Published in
4 min readApr 16, 2023
Créditos: filmaffinity

The Whale vem causando muitas emoções por aí desde que o Brendan Fraser vinha sido cotado para ganhar o Oscar de melhor ator, e não foi por menos.

The Whale é um filme que carrega uma narrativa desoladora, e muito próxima da nossa realidade.

Com filmes como Mother!, Cisne Negro e Requiem for a Dream em sua carreira, Aronofsky nos entregou mais uma obra difícil de engolir e que mexe com algo mais profundo do que o que está sendo mostrado na tela. Mexe com algo dentro de todos nós, e principalmente com aqueles que já sofreram ou sofrem com distúrbios alimentares.

Tivemos inúmeros debates sobre como retrataram erroneamente uma pessoa obesa no cinema, que, pelo contrário, pessoas nessa condição de saúde conseguem fazer atividades rotineiras e viver igual qualquer outro. Entretanto, nas telas pudemos ver a personificação emocional da realidade de uma pessoa obesa.

Crédito: Town&Country

Vou falar brevemente aqui que essa não é uma questão a ser debatida em uma thread de twitter entre militantes que não chegam nem perto de vivenciar uma realidade tal qual a retratada no filme. Em 2012, a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou que 2,8 milhões de pessoas morriam de obesidade por ano. Em 2018, ela já era a segunda principal causa de morte no mundo inteiro e, em 2022, já era responsável pela morte de quase 4 milhões de pessoas no mundo inteiro, segundo dados da ONU.

Que fique claro que estamos falando de níveis graves de obesidade.

The Whale é isso e muito mais.

Esse é um filme que explora relações familiares, religião, redenção, amizade, e o grande peso de ser uma pessoa solitária e envergonhada por não conseguir transformar sua realidade do dia para a noite.

Percebemos isso quando Charlie nunca se mostra ao dar suas aulas online. Sua câmera está sempre desligada, e os alunos vivem perguntando quando vão poder ver o seu professor, recebendo como resposta uma afirmação de que em breve, que a câmera está quebrada e passando por manutenção.

Além da narrativa autodestrutiva que temos do personagem principal, outra pessoa presente na tela e que é perceptível já ter salvo a vida de Charlie inúmeras vezes graças à sua experiência como enfermeira é Liz, sua amiga de longa data. Hong Chau faz um trabalho impecável como Liz, colocando a angústia, fardo, preocupação e algo muito mais profundo em sua atuação.

Ainda que Charlie estivesse vivendo com sua obesidade e também um luto, ainda tinha algo em sua vida que ele precisava buscar redenção, seu relacionamento com sua filha.

Sadie Sink nos trouxe Ellie, uma adolescente no pico da sua revolta, trazendo para o espectador um lado cruel da juventude, que nos assusta e faz perceber como o período de desenvolvimento de uma pessoa é importante, seja do lado materno quanto do lado paterno.

Em tela vemos cenas cotidianas e normais se transformarem em atividades que vão requerer grande preparação psicológica e física. Um levantar se torna uma atividade que carrega tensão. Um escorregão pode significar uma queda que vai colocar a vida de Charlie em perigo. Se ele deixa o celular cair da sua mão, precisa esperar Liz chegar e alcançar para ele.

São coisas pequenas, ínfimas, que sequer pensamos que podem significar a morte se for feito muito esforço para alcançar, porque Charlie também tem problemas cardíacos. E Darren Aronofksy é praticamente um expert e nos deixar sem fôlego com simples cenas cotidianas.

Apesar da existência dessa pressão em cima de Charlie, das narrativas que aparecem e do andar da história, não consegui achar nenhum motivo para não gostar do personagem, ou ter sentimentos negativos. É possível enxergar na atuação que Brendan Fraser nos entrega um personagem que quer agradar a todos, que dá tudo de sí para que as pessoas ao redor não se preocupem com ele ou se sintam obrigados a continuar fazendo o que fazem, apesar da sua condição.

É um filme que você precisa de alguns segundos no final para a respiração voltar ao normal. Processar o que se passou não é uma tarefa fácil, e não deveria ser debatido de forma superficial ou com achismos. Acredito que só quem vive um um nível tão grave de obesidade, que não consegue nem realizar atividades cotidianas, pode realmente ter uma opinião crítica e determinar se Aronofsky nos entregou um filme gordofóbico ou não.

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Anna Clara Lôbo
Lôba no Covil

Jornalista que se apaixonou pela área de experiência do usuário.