Liderança em Design: um movimento de dentro para fora

Reconstruindo parte do que acreditamos para nos tornarmos líderes melhores

Diogo Kpelo
Loft
11 min readJul 29, 2019

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Interface19 no Rooftop da Loft

Esse artigo é uma transcrição da palestra que rolou no Interface19, no Rooftop da Loft

TL;DR

  1. Liderança, um mundo à parte
  2. Expectativa vs Realidade
  3. Mudança de postura
  4. O primeiro passo
  5. Ciclo da ação
  6. Sentimentos são a base da liderança
  7. Confiança é a base de um relacionamento
  8. Mensagem final

1. Liderança. Um mundo à parte

Quando o assunto é liderança, existe um mundo de possibilidades dentro desse tema. Eu quero compartilhar nesse artigo alguns pontos que estão sendo fundamentais para a minha jornada.

Eu não sei você, mas quando eu falo em liderança, me vem dezenas de pensamentos e características na cabeça. Coisas como: referência, confiança, exemplo, respeito, justiça e direcionamento. E, honestamente, durante um bom tempo eu não via—e talvez não tivesse mesmo—muitas delas em mim. Mais do que isso, durante muito tempo eu não me via em um papel de liderança. A Letícia Pires, do Quinto Andar, tem um Manifesto pelo fim da Liderança Acidental em Design, que eu apoio e concordo com tudo que ela escreveu, mas, infelizmente, eu sou mais um na estatística dos líderes por acidente.

Existem diversas e diversas definições sobre liderança, algumas que eu gosto bastante são:

  1. Ser líder é assim: se você precisa provar que é, então você não é—Margareth Tatcher
  2. Um líder é aquele que capacita as pessoas — Bill Gates
  3. Líder é alguém que leva as pessoas aonde elas não iriam sozinhas—Henry Kissinger

Em outras palavras, liderança não é poder. É respeito e influência. Liderar está relacionado a direcionamento, exemplo e companheirismo.

Existe sempre uma preocupação de explicar a diferença entre liderança e gestão. No geral, eu gosto de dizer que você pode ser um líder sem ser um gestor, mas você não deveria ser um gestor sem ser um líder. Não vou entrar no detalhe de cada definição, uma vez que o foco aqui é de olharmos através da lente da liderança em um time de design.

Quando falamos de liderança, estamos automaticamente falando de pessoas. Não existe liderança sem pessoas. Trazendo para a rotina de uma empresa, liderar pessoas invariavelmente está relacionado a liderar um time. Eu gosto muito de uma frase que diz:

Você não constrói uma área, uma empresa. Você constrói um time. E esse time constrói uma área, uma empresa.

Aqui na Loft focamos em encontrar as melhores pessoas. São elas que vão nos ajudar a construir uma área de design. Parece um detalhe bobo, mas pensar primeiro em pessoas faz toda diferença no time que você constrói.

Liderar um time dentro de uma empresa envolve fazer a gestão de tarefas, processos, indicadores, metas e resultados. Acontece que muitos líderes focam nessa parte e se esquecem que também é preciso cuidar do clima. Se preocupar com as pessoas, ideias, opiniões, ambiente e colaboração.

2. Expectativa vs Realidade

Quando pensamos em liderança, pensamos em todas aquelas definições positivas e inspiradoras. Tendemos a projetar essas características nas outras pessoas. É isso que buscamos em nossos futuros chefes. Por mais que você seja o líder de um time, ao menos que você seja o CEO de uma empresa, você terá um líder acima de você. E a expectativa é sempre de encontrar um líder inspirador. Porém, infelizmente, para a maioria de nós a realidade é bem diferente. Alguns dados do mercado:

— 50% da rotatividade é pelo desejo do empregado de se livrar do chefe;

— 30% dos trabalhadores se sentem comprometidos a fazer um bom trabalho. O restante faz por fazer;

— 20% está tão descontente que age de forma contraprodutiva para toda a empresa;

— 70% do nível de engajamento dos empregados é atribuído à qualidade do chefe.

Todos esses dados estão diretamente relacionados a liderança.

Nossa geração está cada vez mais buscando significado em tudo que faz. Inclusive no trabalho. Entendendo dinheiro como uma consequência e não como o seu porquê. Uma mudança de mindset, onde cada vez mais as organizações precisam ser ágeis e com comunicação transparente. Trabalhos orientados a projetos, baseado em confiança e relacionamento. A vida e trabalho se misturam.

3. Mudança de postura

Simon Sinek — não, ele não é apenas o cara do Golden Circle—defende um mundo onde as pessoas amem seu trabalho e que isso não seja um previlégio para poucos. Ele define sua missão como inspirar pessoas a fazer as coisas que as inspiram. Ele diz que se o seu chefe ou ambiente de trabalho for abusivo, você deve sair imediatamente. Por outro lado, tirando essa situação extrema, normalmente as pessoas tomam a decisão de sair cedo demais—em 2–4 meses definem que aquele ambiente não é para elas e desistem. Ele diz que levamos cerca de seis meses para nos estabelecermos em um novo ambiente, e que se pudesse dar um conselho para as pessoas o conselho seria de não tomar essa decisão cedo demais. Mais do que isso, Simon diz uma frase que mudou minha forma de enxergar a rotina envolvendo liderança:

Seja o líder que você gostaria de ter — Simon Sinek

Se você se comprometer a ser o líder que deseja ter e ver seus amigos e colegas amando seu trabalho, isso realmente afeta a liderança, acredite ou não. Você pode construir uma pequena subcultura. Nós tendemos a projetar o líder perfeito nos outros, na nossa expectativa de que o nosso chefe imediato seja um deles. Acontece que na maioria das vezes não é esse tipo de líder que encontramos e nos frustramos. Quando isso acontece nós acabamos fazendo parte daqueles dados de pessoas que não estão super comprometidas com seu trabalho. Fazemos parte das pessoas que querem mudar de chefe. E pouca vezes percebemos que ao nos enquadrarmos nesse cenário, provavelmente estamos replicando essa frustração em nossos liderados.

Por isso essa frase me fez refletir muito sobre liderança. Consigo ver com clareza as vezes que eu me frustrei com meu líder e o quanto eu não fui o melhor que eu poderia ter sido para o meu time. Tendemos a esperar mais do outros do que de nós mesmo. Focar em ser o líder para o seu time que você gostaria de ter é o caminho para construir uma boa liderança, mas não significa que isso é simples.

4. O primeiro passo

Quando estamos estudando sobre liderança é comum vermos que a lição número um é que você deve entender as pessoas. Eu acredito mais na definição que o primeiro passo é você entender a si mesmo. Lidere a si mesmo, para então liderar pessoas e negócios. E quando falamos em si conhecer, si liderar, invariavelmente estamos falando de inteligência emocional.

Basicamente, inteligência emocional, é a capacidade de reconhecer os seus sentimentos e dos outros. Assim como a capacidade de lidar com eles. Existem alguns pilares que formam a base da IE que são: autoconhecimento, autogestão, vulnerabilidade, empatia e feedback. Cada um desses pilares é extremamente profundo e não vou entrar no detalhe nesse artigo. Eu quero só focar em dois pontos que abriram minha mente e moldaram minha forma de pensar: o ciclo da ação e vulnerabilidade.

5. Ciclo da ação

É dividido em 4 etapas. Repertório > Crenças > Atitudes > Resultados

Nosso perfil de liderança é moldado diretamente por nossas experiências, que é o nosso repertório. E esse nosso repertório, infelizmente em sua maioria, é formado por líderes ruins e praticamente sem líderes de design. Em toda minha carreira eu tive apenas um líder que era designer. E tive muitas e muitas experiências com péssimos líderes. Esse nosso repertório nos afasta do caminho da liderança, pois não temos grandes motivações e nem exemplos que nos inspiram a seguir esse caminho. Quase todo designer que você conversa não almeja uma posição de liderança, a maioria está focada em ser o melhor possível na trilha de referência técnica. Isso tem muita sinergia com o artigo da Letícia. Acabamos nos tornando líderes por acidente, sem estarmos preparados para assumir esse papel.

Para melhorar o que somos, precisamos destruir parte do que acreditamos

Essa frase do livro Além da Liderança resume bem o que precisamos fazer. Precisamos estar dispostos a ouvir e aprender. Precisamos atuar em cima das nossas crenças e mudar nossas atitudes para nos prepararmos e nos tornarmos líderes melhores.

Porém, inteligência emocional, não se resume apenas em nossas ações e experiências. Nossos sentimentos são a base de tudo. E quando falamos de sentimentos, estamos falando de vulnerabilidade.

6. Sentimentos são a base da liderança

Vulnerabilidade é comumente relaciona a fraqueza. Brené Brown—pesquisadora que estuda esse tema há mais de 12 anos—não define vulnerabilidade como algo bom ou ruim, ela diz que é o centro de todas as nossas emoções e sensações. Então, acreditar que é fraqueza, é a mesma coisa que acreditar que todos os nossos sentimentos são fraquezas.

A nossa rejeição à vulnerabilidade vem da associação com sentimentos negativos, como medo, vergonha, tristeza e decepção. Porém, ela também é o berço de emoções e experiências que tanto buscamos. Como a alegria, coragem, aceitação e o amor. Brené usa o amor como exemplo. Ela diz que não tem nada mais vulnerável do que amar e correr o risco de não ser amado. Mas mesmo assim não conseguimos imaginar uma vida sem corrermos esse risco. Porque, por outro lado, não tem nada mais incrível do que amar e ser amado. Ela define vulnerabilidade como risco emocional, exposição e incerteza. É a nossa precisa doze de coragem. Ser vulnerável é permitir que nos vejam, é ser honesto. Vulnerabilidade é o berço da inovação, criatividade e mudança.

O dia que palestrei pude compartilhar com as pessoas a angústia que senti pela minha relação de vulnerabilidade com sentimentos negativos. Eu quase desisti de me apresentar. Eu me questionava o tempo todo se meu material era bom o suficiente. Me perguntava "quem sou eu pra palestrar sobre liderança?". Ficava pensando no que as pessoas iriam achar. E se não gostassem? A verdade é que o medo da humilhação nos congela. Nos faz querer desistir. E quando desistimos, é a vergonha dizendo que não somos bom o suficiente. Acontece que em 99% das vezes somos nós mesmos que julgamos que não somos capazes.

Mas eu estava lá. Falando, me expondo e ficando vulnerável. É assustador, mas também é extremamente gratificante. Eu estava feliz e realizado com a minha coragem. Porque esse é o outro lado da moeda da vulnerabilidade. Precisamos estar dispostos ao risco para alcançarmos os sentimentos que tanto buscamos.

Eu usei minha palestra de exemplo, mas isso serve para a nossa rotina. Quantas vezes não nos questionamos se somos bons o bastante para aquela vaga na empresa que tanto sonhamos trabalhar. Quantas vezes nos questionamos se somos bons o bastante para um determinado projeto. Quantas vezes deixamos de dar nossa opinião por medo de falar besteira e passar vergonha. Essa vergonha de não ser bom o bastante vem de estarmos sempre nos comparando com uma visão de perfeição inatingível propagada pela mídia e redes sociais. Eu sempre usei o meu perfeccionismo como arma de defesa, uma desculpa. Mas a verdade é que eu sempre achei que não era bom o bastante. Desde a tela que eu entregava, a apresentação no Behance, a liderança de um time, até uma palestra para um monte de pessoas que eu admiro. Mas a verdade é que a cada dia que passa eu venho me conhecendo melhor e aprendendo a me liderar melhor. E cada vez que eu pratico a empatia, aceitação e adaptabilidade comigo mesmo, eu tenho certeza que isso faz de mim um líder melhor para o meu time.

Brené define vergonha como a epidemia em nossa cultura. E que a empatia é a cura. É engraçado porque estamos tão acostumados a praticar empatia com os outros, com nossos usuários, mas raramente fazemos isso com nós mesmos.

7. Confiança é a base de um relacionamento

Todos esses sentimentos, ações, autoconhecimento, empatia… isso tudo forma a base de um relacionamento que é a confiança. Seja do líder para o liderado. Do liderado para o líder. Seja de você com você mesmo. Essa imagem abaixo exemplifica um pouco da estrutura disso na gestão e liderança na rotina de um time.

Os 5 desafios das equipes, por Patrick Lencioni

Muitas vezes quando o resultado não vem, tendemos a cobrar. Cobramos resultados. Cobramos responsabilidade, comprometimento e maior participação. No entanto, dificilmente focamos na base dessa pirâmide. Para gerar conflitos de forma positiva é preciso confiança. Um exemplo disso é quando não somos honestos em nossos feedbacks. Kim Scott, autora do livro Radical Candor, diz:

Uma vez que você se torna um líder empresarial, é seu dever ser igualmente claro sobre o que está dando errado e o que está dando certo. Apontar as falhas dos colaboradores não é apenas o seu trabalho, mas, na verdade, sua obrigação moral.

Esse é só um exemplo de comportamento que não temos quando não temos uma base construída.

Se você ainda não conhece o Simon Sinek, aqui vai um trecho de um vídeo onde ele fala um pouco sobre liderança:

8. Mensagem final

Muitas vezes pensamos em planos de carreira, OKRs e tantas outras coisas — que obviamente também são importantes—mas esquecemos dos pequenos detalhes. Quantas vezes já não sentimos isso na pele? Admiramos alguém por sua inteligência e história, mas a falta de atenção aos detalhes no dia a dia nos frustra. Nos faz querer mudar de ares. Consistência, respeito, interesse e atenção são os pequenos detalhes fazem toda a diferença.

Se você terminar esse artigo com o interesse em conhecer mais sobre o Simon Sinek, Brené Brown e inteligência emocional, eu realmente vou sentir que pude contribuir um pouco para o seu repertório e impactar em suas novas crenças e atitudes.

Quem você é torna-se um fator essencial para prever que efeitos poderá causar nos outros

Acredito que o mais importante aqui é entender que tudo começa em você. Se você não souber controlar os próprios sentimentos, você jamais será o líder que você gostaria de ter.

Não existe liderança sem autoconhecimento. Não existe liderança sem pessoas.

Obrigado!

Dicas de conteúdos que me inspiraram para montar essa palestra/artigo:

Livros

A Coragem de ser Imperfeito.

Radical Candor

Encontre Seu Porquê

Além da Liderança

Palestras

How great leaders inspire action

Why good leaders make you feel safe

The power of vulnerability

Listening to shame

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Diogo Kpelo
Loft
Editor for

Diretor de Design na Unico. Reconstruindo parte do que acredito todos os dias para me tornar um profissional e uma pessoa melhor.