Projeto Patagônico — El Calafate

Ramon Fernandes Lourenço
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7 min readApr 23, 2020

E finalmente havia chegado o dia, o dia de conhecer a sonhada Patagônia. Buenos Aires que me perdoe mas a sensação de pisar pela primeira vez naquela terra, respirar aquele ar seco das estepes patagonicas foi indescritível. Logo ao sobrevoar a área vimos o contraste da bela cor verde-azulado do imponente lago argentino contrastando com a paisagem desértica dos terrenos irregulares, tudo isso com uma bela moldura de montanhas nevadas ao fundo. Ali eu redescobri aquela sensação boa de conquistar algo que há muito se espera. Aos poucos vou contando o tanto que estar este lugar foi incrível e transformador.

A esperada chegada — ansiedade

Bom, havíamos embarcado em Buenos Aires muito cedo, chegando em El Calafate por volta das 09 horas. Fiquei com receio de ter de ficar enrolando na cidade com as malas pesadas, pois o check-in no hotel estava marcado somente para 14 horas. Mas mesmo assim embarcamos numa van e seguimos direto para o hotel. Tenho que dizer que o caminho já foi incrível, poder ver com calma aquela paisagem que vimos pelo avião foi muito bom e aos poucos se aproximar do Lago Argentino.

Nós selecionamos o hotel Terraza Coirones pois sua localização nos encantou de primeira. Um pouco isolado da cidade, mas localizado no alto de uma planície com uma bela vista para o Lago Argentino.

Chegando no hotel fomos muito bem recebidos por um simpático senhor, aparentemente é um hotel familiar. Não só ele antecipou nosso check-in como nos serviu o café da manhã com as maravilhosas medialunas!! Recomendamos o hotel com toda segurança, pois além de ter uma visão incrível do lago, é um espaço muito charmoso com sua construção em madeira rústica, típico dos acolhedores chalés de inverno.

Do hotel saímos caminhando até a cidade, seguindo pela Costanera que margeia o lago até o centro da cidade de El Calafate. Pelo caminho existe o acesso para a Reserva Laguna Nimez, uma pequena reserva ambiental bem ao lado da cidade, mas que por conta do tempo escasso não pudemos conhecer.

No caminho chegamos de frente com o Centro de Interpretación Histórica de Calafate, um pequeno museu de história natural que reconstrói toda a história da Patagônia Austral. Lá é possível ver os fósseis de principais dinossauros que habitaram aquelas terras há milhões de anos, além de conhecer um pouco como foi a história da humanidade por lá. Este foi mais um sonho antigo se realizando, pois desde pequeno sempre tive fascínio por dinossauros, alimentando a vontade de ser paleontólogo.

Por fim chegamos nas ruas centrais de El Calafate, super charmosas, repletas de restautantes, cafés e ótimas cervejas artesanais feitas com a água dos glaciares.

Trekking no Glaciar Perito Moreno

Certamente um dos pontos altos dessa nossa viagem foi conhecer o imenso paredão de gelo, o glaciar Perito Moreno.

Os glaciares são imensas massas de gelo comprimido que se formam ao longo de milhares de anos. Alguns cientistas dizem que são remanescentes da última era do gelo.

O glaciar fica localizado no Parque Nacional Los Glaciares, situado a cerca de 80 km da cidade de El Calafate. O trajeto todo foi feito com o transporte da agência Hielo e Aventura, a única autorizada a realizar o passeio “Big Ice”, que detalharei logo mais. Todo o caminho da cidade até o Parque Nacional é incrível, margeando o belíssimo Lago Argentino. Vale um adendo para o Parque Nacional Los Glaciares, criado em 1937, que conta com 724.000 hectares e possui um total de 356 geleiras!! Um verdadeiro paraíso gelado.

O Perito Moreno é um dos únicos glaciares que ainda se mantém preservado, não sofrendo tanto com o aquecimento global. Isto é constatado pois sua dinâmica anual de crescimento e retração ainda é vista anualmente. Como é um glaciar que se inicia no topo das montanhas, a neve que cai nesta região vai produzindo novas placas de gelo e empurrando o glaciar montanha abaixo. Em uma determinada época do ano, o paredão de gelo chega a tocar a outra margem do rio, produzindo uma ponte de gelo entre o glaciar e a rocha. A queda desta ponte no período de derretimento e contração do glaciar é um espetáculo procurado por turistas.

Ao transitar pelos mais de 4km de passarelas no Parque Nacional Los Glaciares, observando os bosques e as montanhas ao redor, aos poucos foi se revelando o gigante paredão de gelo. Este é o segundo maior glaciar do mundo, tendo mais de 60 metros de altura e 5km de comprimento, e é considerado umas das reservas de água doce mais importantes do mundo.

Big Ice

O passeio “Big Ice” começa no porto “Bajo de las sombras”, embarcando em uma navegação de 15 minutos até os pés do glaciar. Durante o trajeto é possível perceber como o paredão é gigante, e ainda ter a sorte de ver seus pedaços enormes boiando ao redor.

Chegando na base da montanha é preciso realizar uma caminhada na borda da montanha, para chegar até o local onde se pode subir no glaciar e começar os preparativos para o trekking no gelo. São uns 30 minutos passando por um bosque, subindo e descendo barrancos até a chegada ao local do início do passeio.

Ao chegar os guias fazem as explicações sobre como é caminhar no gelo, quais os cuidados que deverão ser tomados por todos. A principal orientação é: Pisar somente onde o guia pisou! Como estávamos caminhando no gelo, existem sumidouros, rachaduras e outras “armadilhas” que pés não treinados poderia cair.

A caminhada no gelo começa ao calçar os crampons, um tipo de solado com pregos que são amarrados em sua bota. É muito importante que se vá de botas, pois elas garantem a segurança na pisada necessária e deixam bem estável a amarração dos crampons. Quanto ao fato de serem impermeáveis, em nosso caso não foi um fator crucial pois não choveu! Mas as nossas eram, só para garantir!

Caminhar em um imenso bloco de gelo é uma experiência única! Só lá você consegue perceber uma infinidade de tonalidades de azul.

São cerca de 3h30 de caminhada com os guias mostrando os melhores caminhos e contando detalhes deste espetáculo da natureza. O passeio todo, da saída do hotel ao retorno são 12 horas, sendo o trekking no gelo a cereja do bolo.

Ao longo do trajeto passamos por profundas rachaduras, enormes sumideiros, escalamos paredes de gelo e vimos surgir a imensidão desta geleira. Um dos pontos altos é encontrar as mágicas lagoas azuis, com cores que nunca tínhamos visto.

Por lá começamos uma tradição que perdurou ao longo de toda a viagem, “Os melhores almoços do mundo”.

As comidas mais simples em lugares incríveis.

Aqui vale retomar uma memória. Nunca havíamos feito trekking ou hiking na vida, eu esta muito ansioso para este roteiro. Não sabia qual a intensidade da caminhada, havia lido que são alguns kilômetros no gelo, mas não tinha visto quase nada sobre o tanto que se caminha para chegar no gelo! Não sabia se iria aguentar bem o trajeto, se conseguiria fazer os outros trekkings lá em El Chaltén, mas a vontade estava ali, viva como nunca antes.

E voltamos deste roteiro no gelo com a alma renovada, prontos para seguir a viagem e continuar vivendo a Patagônia de uma forma muito pura, caminhando por ela!

Ao final do trekking, já dentro do barco novamente, os guias servem um copo de whiskey com os gelos do Perito Moreno, um detalhe carinho para fechar esta experiência de vida, a realização de um sonho!

O próximo passo foi dado em El Chálten, a capital nacional do trekking!

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Ramon Fernandes Lourenço
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Relações públicas na UNILA, mestre em Ciência da Informação e curioso sobre as formas como estabelecemos relacionamentos mediados pelas tecnologias.