A angústia e o medo do desconhecido

Já chegaram a te paralisar?

Luana Reis
Releituras da Vida
4 min readApr 25, 2021

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Você já enfrentou alguma circunstância de sofrimento corporal (sintoma de dor, mal estar etc) e, principalmente pela preocupação de ser algo grave, aquela dor parecia ser ainda mais intensa? E então, caso tenha tido a oportunidade de desvendar e confirmar que não era nada grave, aquele sintoma simplesmente reduziu significativamente sua intensidade?

Outra situação: já lhe aconteceu de estar prestes a vivenciar uma situação nova, cheia de possibilidades inusitadas e, antes de encarar aquela vivência de fato, ela parecia coberta por um “véu negro do desconhecido”? E sua mente ficava ansiosamente imaginando umas série de desafios e dificuldades que você poderia ter que enfrentar?

Bem, essas situações já aconteceram comigo — algumas vezes. Tenho um palpite de que com você também. Deixe-me então contar algumas histórias…

Eu trabalho como médica, mas não faz muito tempo que me formei (quase 1 ano). Iniciei meu trabalho no posto de saúde, por ser mais o “meu estilo” (ou por parecer mais “seguro” para uma iniciante, pelo menos ao meu ver) e, após um tempo, ao me sentir mais confiante, optei por começar a dar alguns plantões em hospitais.

Você mal poderia imaginar quantas coisas passaram pela minha cabeça antes dos primeiros plantões, como a “espiral da loucura das catástrofes— será que vou dar conta”?

Na sequência, após enfrentar aquele “monstro desconhecido” e agir firme, apesar do medo, pude sentir o “véu negro do desconhecido” se dissolvendo, pouco a pouco. Fui percebendo que, por mais desafiador que pudesse ser em alguns momentos, a cada plantão, eu me adaptava melhor aquele novo desafio.

Alguma vez o medo do desconhecido já chegou a te paralisar? Chegou a impedir que você enfrentasse alguma situação?

Talvez por isso mesmo que eu tenha demorado algum tempo após me formar para ter a coragem de assumir um plantão. E eu sei que alguns colegas enfrentam esse desafio logo nas primeiras semanas pós formados.

Claro, cada um tem seu tempo, seu ritmo e suas peculiaridades.
É preciso saber respeitar o nosso tempo e o tempo do outro.
Além de buscar a sabedoria para saber a diferença.

Em complemento a essas indagações e angústias internas, despertei meu olhar para outra situação enfrentada, também durante o trabalho.

Durante alguns desses plantões, quando estou escalada para trabalhar na enfermaria de COVID19, tenho também a missão de comunicar notícias aos familiares, em um horário definido durante a tarde, em que os familiares comparecem para ter notícias de seus entes queridos internados.

Normalmente, este seria o horário de “visitas”, porém essas não são permitidas, pela segurança do familiar e de todos aqueles que com ele convivem.

Sendo assim, o plantonista responsável por aquele paciente será o porta-voz da notícia. Pode até parecer banal, mas ser o porta-voz em uma situação assim é de uma extrema responsabilidade.

O tom de voz usado, as palavras, a clareza, a velocidade da fala, tudo isso pode interferir na percepção do familiar com relação ao estado do doente.

Nesse caso, o desafio aumenta por se tratar de uma doença que, por si só, pode representar um monstro desconhecido e imprevisível, coberto por um véu negro.

Foi assim que optei por, sempre que eu for conversar com os familiares para dar essas notícias, fazer isso necessariamente em um consultório, para que possamos nos assentar com calma e ficar frente a frente com o familiar, além de levar a folha da evolução do dia, para conferir os detalhes e esclarecer as possíveis dúvidas da melhor forma.

Para mim, essa postura seria o minimamente razoável, porém fui surpreendida ao escutar de alguns deles: “Doutora, a senhora foi a primeira que explicou direito, muito obrigado!”

Aquele gesto de reconhecimento me reconfortou e me despertou para um olhar ainda mais amplo com relação a tudo que envolve o cuidar do outro, e não apenas do outro, mas também do núcleo em que ele estiver inserido.

Ressalto que não tenho nenhuma intenção em trazer esse relato para qualquer tipo de autopromoção, apenas considero uma reflexão importante e gostaria de compartilhar com você.

Quando não se pode ver com os olhos, toda clareza verbal é necessária. Diante do desconhecido, toda informação que pudermos ter para nos confortar apresenta grande valor.

Mas é preciso coragem para transpor, e seguir em frente, sem se paralisar.

“A coragem não é ausência do medo, e sim a capacidade de agir apesar dele” — John McCain

Sei que agir em situações novas e aparentemente fora do nosso controle traz um enorme desconforto e, muitas vezes, evitar aquilo ou não fazer nada parece a melhor opção.

Contudo, é preciso buscar a força interna necessária para dar o primeiro passo, a força de querer fazer diferente, de nos superar e fazer melhor do que conseguimos até então.

Por isso considero que não teria forma melhor de fechar esse texto do que citando umas das minhas frases favoritas do Guimarães Rosa:

“O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria. Aperta e depois afrouxa. Sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”

Be brave. Be kind.

Bem, isso são apenas algumas reflexões baseadas em minhas vivências. E você? O que pensa sobre?
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Luana Reis
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Releituras da vida. A arte da busca pelo equilíbrio entre o que importa e o que é necessário.