The Last Of Us Parte II e a sua aflitiva proximidade com o mundo real

O mais recente jogo da Naughty Dog reinventa a forma de contar uma história dentro do mundo dos games trazendo a maturidade e a realidade para a narrativa naquilo que pode ser, o melhor jogo da geração atual de consoles.

Lucas Almeida De Sousa
CRITTIQ
5 min readAug 13, 2020

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Reprodução/Playstation

Quando meu querido amigo de faculdade e redação do BVG, Tales Fernandes, deixou em minhas mãos The Last of Us Parte II, eu me senti um pouco aflito. Não por ser um jogo ruim (ele está muito longe de ser) ou por não saber o que dizer. Na verdade, sei exatamente o que sinto sobre esse gigantesco evento, mas colocar em palavras é a parte mais difícil.

Colocar em palavras uma experiência que você precisa vivenciar para senti-la por completo é uma tarefa muito difícil. O famoso termo imersão, aparece muito aqui e em outros vídeos games dessa geração. Os usuários tanto comuns quanto hardcores dentro deste universo estão cada vez mais fomentados pela experiência imersiva que os distancia cada vez mais da realidade, mas este jogo é diferente. Mesmo se tratando de um apocalipse estilo The Walking Dead (porém, muito mais difícil de se sobreviver), com monstros gigantes e um estilo de zumbi bem original, The Last Of Us Parte II sem dúvidas é, o jogo que mais evoca a realidade e os dias atuais.

A partir deste ponto, contém SPOILERS DO GAME THE LAST OF US PARTE II. SIGA POR SUA CONTA E RISCO!

O game se inicia logo após o fim dos acontecimentos de seu antecessor e ainda acompanhamos a história e o dilema que Joel, um de nossos protagonistas, carrega. Logo que a narrativa se inicia, presenciamos um resumo do primeiro jogo, de uma forma não muito gratuita, para nos lembrar de que o velho amargurado que conhecemos na jornada passada, matou um exército inteiro sozinho para salvar aquilo que seria o seu trabalho, Ellie. A única pessoa que podia trazer a cura para este mundo quebrado, mas ela teria que morrer por isso.

Acredito que, aquilo que mais cativa dentro do mundo de TLOU2, são suas questões morais que tomam um rumo mais emocionais do que racionais. Vemos constantemente em universos parecidos que o protagonista sempre toma a decisão que beneficia o grupo no geral ou quando toma a decisão mais emocional, não sofre com as consequências. Aqui o caso é diferente. Em um ato de quase extermínio total de um exército, Joel salva Ellie e a leva para a comunidade de seu irmão Tommy e lá eles vivem.

A ideia de levar a história para esse rumo não é original, mas é muito bem trabalhada. Se fizermos uma comparação rápida, podemos notar uma certa semelhança no enredo de Game Of Thrones, onde o Rei do Norte Rob Stark, escolhe se casar com a mulher que ama ao invés de cumprir o acordo que fazia para conseguir recrutar mais exércitos para sua causa. No final, ele acaba sendo morto em uma emboscada feita pelos seus próprios aliados por não ter cumprido sua parte do trato. O mesmo acontece com Joel. Quatro anos após o ocorrido no hospital com o exército dos vagalumes, Joel é emboscado e morto por ex-integrantes do grupo. Ainda mantendo a comparação, é interessante como a causa e efeito regem as duas histórias. O mais instigante é que as duas consequências vieram da causa amor, seja ela paterna ou romântica.

Outra semelhança interessante de notar é a morte repentina e/ou banal que acontece com os personagens. Durante muito tempo, Game Of Thrones foi conhecida como a série de “Nunca ter personagens favoritos, porque eles morrem”. Tanto no jogo atual quanto em seu antecessor, TLOU sempre trabalhou a morte como algo diário e que isso pode acontecer nesse mundo mais fácil do que se imagina a qualquer momento. É aflitivo pensar que os mundos fictícios mais parecidos com nosso são aqueles em que a morte é retratada como algo banal e que as nossas decisões emocionais podem levar a uma causa e consequência desastrosa e que podem perdurar por meses e até mesmo, anos.

Durante esta semana que esse texto está sendo escrito, passamos a marca de 100 mil mortos pela COVID-19. Atualmente, deve ser mais. Chega a ser quase uma piada irônica e de muito mal gosto de pensar que um jogo fez algo tão próximo com a realidade em que estamos vivendo. Mas, assim como Game Of Thrones ou The Last Of Us mostram, a maioria das pessoas pensam no bem próprio e não no geral. O assunto fica ainda mais perturbador de se pensar que sofremos mais consequências de nossos atos dentro de um mundo virtual do que na vida real.

Reprodução/Playstation

Assim como falei no meu último texto “O Paradoxo no mundo dos games”, o diretor do jogo Niel Druckmann, sempre definiu que esse jogo é sobre ódio. Nada poderia descrever melhor TLOU2 como a palavra ódio. Tudo que o envolve possui isso. O conflito de Ellie com o ex-grupo de vagalumes, Abby e a vingança contra Joel, a guerra dos dois novos grupos que é apresentado, o choque dos novos personagens Yara e Lev contra o preconceito de sua mãe e seu grupo, entre outros. Apesar de mostrar o ódio de uma maneira que parece exagerada, a forma como o game conversa com a realidade é quase literal.

Vemos um grupo religioso que usa da dor, preconceitos conservadores, tortura, fanatismo para passar uma mensagem do seu Deus. Enquanto isso, eles lutam contra um exército muito bem armados, preconceituosos e muito bem organizados que buscam vingança por dois integrantes do grupo assassinados. Soa familiar? Em paralelo, vemos a história principal da protagonista Ellie em busca de vingança junto da sua namorada, Dina (que sofrem homofobia logo no início do jogo).

Ao decorrer das 25 horas de gameplay, o game nos mostra constantemente relações de ódio e de preconceitos que parecem absurdo, mas são tão reais quanto o próprio jogo. Podemos interpretar esses sinais como pequenos forshadowing (elemento muito usado no cinema quando o filme mostra pistas ou o final de sua história ao decorrer da narrativa) para a conclusão do arco de Ellie. Todos os ciclos de violência do game, terminam de forma desastrosa e triste. O mesmo acontece com nossa protagonista. No fim ela percebe que, sentir ódio e sempre buscar uma vingança nunca nos leva a nada e sempre nos deixa sozinhos.

Reprodução/ Playstation

Além de nos entregar uma experiência imersiva e impressionante, The Last Of Us Parte II nos entrega a visão mais selvagem do nosso mundo. Do inicio ao fim ele trata dos assuntos mais polêmicos e presentes na nossa sociedade atual de forma densa e complexa, sempre fazendo o jogador pensar no mundo aqui fora sobre como o ódio está mais presente na sociedade como imaginamos.

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Lucas Almeida De Sousa
CRITTIQ

18 anos, morador de São Paulo, Brasil. Sempre tive entusiamo para escrever e tirar fotos. Futuro jornalista e se tudo der certo, escritor também.