Com direção de Grace Passô, uma das artistas mais inventivas da vanguarda teatral dos últimos tempos, “Herança” traz ao público uma nova maneira de contar as histórias tecidas no cotidiano: falar de um futuro com o espelho do passado. Ela, que ouviu cada história familiar, reinventou e adornou a trama com a serenidade de uma sábia bordadeira, devolvendo aos artistas a possibilidade de apresentar ao público a sua ancestralidade na concha das mãos.
O espetáculo cênico-musical da Cia. Burlantins integra a programação do Sesc Palco Giratório, maior festival itinerante do país. No último dia 26 de agosto, o Sesc Centro Campina Grande recebeu a companhia, festejando os 50 anos de carreira do ícone Maurício Tizumba, um dos baluartes da cultura afro-mineira.
As histórias — antes íntimas — quando postas no palco, refletem a vida de milhares de pessoas que veem em “Herança” um norte para a diáspora do povo negro. Encontrar a sua própria história sendo contada pelos multiartistas Júlia Tizumba, Sérgio Pererê e o próprio Maurício Tizumba, esquadrinha as memórias mais afetivas e viscerais.
A trama desafia a linearidade com os seus elementos poéticos e leva o público a reescrever o enredo da vida com os olhos postos em África. O passado, projetado no presente, nos apresenta a realidade de que o futuro é ancestral, poderoso e cheio de representatividade.
O protagonismo negro que permeia toda a construção do espetáculo desafia o óbvio. As projeções do povo Bamum e toda a sua história, esmiúçam a lembrança de que, apesar de toda tentativa de roubo e apagamento histórico, não há fogo que venha consumir as raízes dos nossos ancestrais.
Cada elemento do palco joga o foco para o que verdadeiramente importa: a história e quem a vive na pele, que pode ser você, Tizumba, eu ou Pererê. Todas as músicas e monólogos que atravessam os corpos dos artistas e invadem a plateia, formam um enlace genial, assim como cada ruptura nas narrativas apresentadas.
“Herança” abre a porta de casa, serve um chá de consciência racial, mostra que o belo nem sempre estará isento de dor, mas que o futuro carrega em si a glória de toda força ancestral. Os cânticos não encerram o espetáculo, mas abrem portais ao âmago da perpetuidade da vida, com o movimento, prosperidade e transformações trazidos por Oxumarê. Arroboboi! O que será, já é e carrega muita força.
Confira mais imagens de “Herança” e a ficha técnica do espetáculo:
Ficha Técnica do espetáculo:
Realização: Cia Burlantins e Napele Produções Artísticas
Idealização: Pedro Kalil
Elenco: Júlia Tizumba, Sérgio Pererê e Mauricio Tizumba
Participação especial: Rosa Moreira
Direção: Grace Passô
Assistência de direção: Aline Vila Real
Dramaturgia: Aline Vila Real, Grace Passô e Tomás Sarquis (Elaborada a partir de narrativas produzidas por Júlia Tizumba, Mauricio Tizumba, Rosa Moreira e Sérgio Pererê)
Direção musical: Sérgio Pererê
Músicas: Sérgio Pererê e Mauricio Tizumba
Assistência de movimento: Sérgio Penna
Vídeo arte: Renato Pascoal
Intervenções visuais: Desali
Projeções: Vjs Bah e Kraken
Cenário e figurino: Alexandre Tavera
Iluminação: Edmar Pinto
Sonorização: Cahuê Teixeira
Reportagem: Samya Amado
Fotografia: Rostand Melo
Supervisão Editorial: Rostand Melo
O Luz Negra é um projeto de extensão do curso de Jornalismo da UEPB, aprovado no edital da @proex_uepb para a cota 2024–2025.