Design no quintal: Sai da internet e vai lá fora!

André Fernandes
Méliuz Design
Published in
4 min readNov 7, 2019

Ah, a internet! Que maravilha, não é mesmo? Ela, que faz o mundo girar, promove integração e acessibilidade a quem a utiliza, gera informação em tempo real, nos permite viajar e conhecer lugares sem sair de casa, proporciona relacionamentos a distância e carrega nosso dinheiro virtualmente pelo mundo.

Lembro até hoje de quando a internet chegou aqui. Meu primeiro contato com ela foi na escola, nas aulas de informática lá pelos anos 90. Quem tinha internet em casa era rico; aliás, quem tinha um computador, aí sim, era muito rico. Banda larga, que nada! O bom era ouvir o som de conexão do modem com a linha telefônica, hahaha. Esses detalhes, quem viveu, nunca mais vai esquecer.

Onde moram as suas referências?

Bem, hoje eu queria falar um pouco com vocês que utilizam a internet pra achar qualquer tipo de referências. Hoje é muito fácil encontrar algo nos Google, Pinterest, Instagram e Behance da vida. Acho maravilhosa a facilidade que é simplesmente ligar o computador ou celular, e pronto: as informações vão brotando na tela. Mas você que trabalha com criatividade, deixa eu te dar uma dica: sai dessa tela. Tem muita referência incrível no teu quintal, na tua rua, na tua família, faculdade, escola, shopping — muita mesmo.

Uma vez eu fiz um projeto de um aplicativo bem específico, para uma empresa nacional que queria mapear as cidades do Brasil, registrando suas áreas de atuação nos estados. Lembro que a parte mais difícil (e chata, confesso) foi a concepção de toda a interação do aplicativo. Tive que aprender como os funcionários iriam usar o app: no caso, seria a pé mesmo, andando e marcando no mapa os locais de atuação. Depois, deveriam visualizar a cidade inteira e os locais registrados como escolas, restaurantes, shoppings, casas, comércios, igrejas, academias etc.

Com essas informações, eu já tinha entendido que o projeto teria muita informação visual, tanto para inserir os registros quanto para visualizar os resultados. Lembro de passar horas na internet procurando referências de projetos similares, referências visuais, cores, formas, tipografias, qualquer coisa que pudesse me ajudar. Mas eu tenho certeza que ninguém vai adivinhar onde eu encontrei a referência perfeita e que levei para o projeto. Só uma dica: não foi na internet.

Eu saí do trabalho e fui dar uma volta em um shopping — fiquei passeando por um tempo e depois fui lanchar. Enquanto eu esperava o meu lanche, na praça de alimentação, ouvi um locutor convidando as pessoas para um desfile de moda que iria acontecer ali. Como eu já estava por lá, acabei indo, e foi exatamente ali que encontrei o que eu procurava. Os vestidos eram apresentados de forma muito elegante: eram totalmente lisos, sem estampas, brincavam com cores complementares e análogas, o azul e rosa eram muito fortes e utilizados em todas as roupas, as costuras eram bem retas e com pequenas curvas na barra das saias e vestidos. O desfile durou cerca de uma hora — várias modelos passaram pela passarela, e não foi cansativo, pois havia unidade no que tinha sido apresentado. No fim, a gente conseguia visualizar a coleção, já que as roupas conversavam entre si.

Pronto, eu tinha acabado de encontrar minhas referências: iria desenvolver uma interface com aquelas cores, trabalhando de forma simples e direta, sem muitas informações desnecessárias. E se fosse para fazer algum detalhe mais rebuscado, seria nos cantos da tela, na parte inferior da interface. Seguindo isso, construí uma interface que transmitiu exatamente o que eu senti naquele desfile. O funcionário que iria inserir os dados tinha em mãos um aplicativo tão simples que, à medida que ele fosse marcando os pontos no mapa, poderia visualizar as informações sem poluições visuais. E no fim da atividade, ele visualizava um mapa com poucas cores, iconografia em outline bem fina (como as pernas das modelos) e com formas retas.

Não foi só comigo, eu juro!

Tive amigos que compartilharam de experiências parecidas. Um amigo, certa vez, percebeu que mãe dele sempre utilizava roupas de cor roxa com detalhes de bolinhas laranjas, e isso o influenciou a fazer um ilustração de um robô metade roxo e metade laranja — mais tarde, essa ilustração virou um quadro que ele até conseguiu vender.

Outro amigo compartilhou que uma vez presenteou sua sobrinha com um brinquedo muito caro, mas a criança só queria saber mesmo era da tampa do desodorante, que era vermelha e chamava muita atenção. Depois, essa experiência lhe serviu na hora de criar uma campanha de dia das crianças, quando ele utilizou a mesma cor na comunicação.

Bem-vindo ao seu quintal

Eu sei que estamos conectados, e que, se eu piscar, já brota uma super referência na minha tela — e que vai ser incrível. Mas aprendi o valor de olhar mais ao meu redor, e enxergar detalhes como uma árvore engraçada em uma rua, um cachorro sentado no banco de um carro só espiando a vizinhança, uma formiga carregando uma folha seca e velha, um cara usando um tênis de unicórnio no supermercado, uma caixa de papelão molhada. Coisas do mundo real, referências que gritam por atenção e interpretação.

Por isso, eu te convido a parar de olhar um pouco pra essa tela e prestar atenção agora mesmo ao teu redor — tenho certeza que tem alguma coisa maneira por perto, e que se tu prestar atenção nos detalhes, ela um dia vai te ajudar muito — seja em qual projeto for.

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