O valor da jornada do usuário

Ana Romaguera
Bemobi
Published in
7 min readJul 24, 2020

Um dos maiores desafios hoje para um product designer — aquele que trabalha com um produto de ponta a ponta (UX e UI) — é trazer valor ao seu layout. E o que eu quero dizer com isso? Que o designer de interfaces que não trabalha com foco nas metodologias de design thinking (DT), é um mero fazedor de telas. E você quer se resumir a isso?

Se a sua resposta é não, você deve então se familiarizar com as ferramentas de DT, e criar o hábito de utilizá-las na evolução de seu projeto. E um dos principais recursos é a jornada do usuário, que nada mais é do que uma representação gráfica de todos os pontos de contato do público com seu produto ou serviço. Desenhar essa jornada é uma tarefa enriquecedora, uma vez que gera contextualização e empatia, pois mapeia:

  • As ações do usuário no decorrer do uso de seu produto/serviço;
  • Os sentimentos envolvidos em cada tarefa;
  • A régua de comunicação, que caminha em paralelo com as ações do usuário;
  • Possíveis pontos de dor e, consequentemente, melhorias em seu produto.

E como desenhar uma jornada? Primeiro, é preciso fugir de achismos e trabalhar com empatia. Pois se desenharmos tudo baseado em nossas experiências pessoas, você pode ter um resultado enviesado. Com isso, fique atento aos pontos a seguir.

1. Defina um objetivo

Antes de tudo, é preciso traçar o objetivo de sua jornada. A empresa que você trabalha quer melhorar a avaliação de um produto ou serviço? Quer entender o porquê muitas pessoas não retornam ao seu site ou app? É preciso entender o que aconteceu no meio do processo que possa ter atrapalhado a experiência do usuário.

2. Conheça o seu público

Você deve identificar, através de pesquisas e dados, qual o tipo de consumidor central sua empresa tem, ou se existem grupos distintos, e nomeie-os. A partir disso, crie personas (voltaremos a esse ponto mais pra frente).

3. Conte uma história

Já conhecendo o público, agora é preciso trazê-lo para a experiência com seu produto ou serviço. Dessa forma, você entenderá melhor suas dores durante o processo.

Analisando a estrutura da jornada

Tendo em vista o objetivo da jornada, esquematize os pontos de contato dos consumidores com seu produto. Desde o primeiro impacto (um banner, um e-mail marketing, uma indicação em redes sociais), o uso propriamente dito, até a conclusão do processo. Nessa etapa, é importante identificar os canais de comunicação envolvidos, as emoções sentidas pelas pessoas e suas ações. Com isso, chegamos a essa estrutura macro:

  1. Consciência: é quando o consumidor toma ciência da existência de seu produto, a partir de uma necessidade percebida;
  2. Consideração: é quando o consumidor entra em contato direto com o seu produto e passa a conhecê-lo melhor;
  3. Aquisição: é quando o consumidor utiliza seu produto;
  4. Conclusão: é quando o consumidor conclui uma tarefa e finaliza o contato com o produto.

Além desses quatro pontos, não podemos ignorar a etapa mais importante: a fidelização. Caso a experiência do público com seu produto/serviço tenha sido satisfatória, ele retorna à fase de aquisição. E toda empresa quer isso: um consumidor que se mantenha no looping aquisição + conclusão e, para isso, você deve mantê-lo interessado.

Por exemplo, vamos supor que eu administro um site de um mercado com e-commerce. E, analisando os dados de minha empresa, notei que boa parte do meu público não retorna ao site após uma primeira compra. Com isso, já tenho um objetivo traçado para montar a minha jornada, que é entender porque isso está acontecendo.

Uma vez definido o objetivo, você deve identificar o seu público e criar personas. E o que são personas? São representações de seus principais consumidores, com um resumo descritivo dessas pessoas. Você inclui a idade, cria um nome, cita dados sócio-econômicos. Pode incluir também frases típicas, atividades realizadas (carreira). Tudo isso baseado em dados de sua empresa, para criar empatia com o consumidor e tentar entender seu modo de pensar e agir.

Para cada jornada, foque em uma persona, e conte uma história para cada uma delas. No meu exemplo de e-commerce de mercado, eu criei uma persona, a Sofia. No cenário montado, ela é uma arquiteta autônoma, solteira e tem uma filha. Por ter uma rotina muito corrida, ela não tem tempo de ir ao mercado físico para fazer suas compras. Com isso, ela recorreu a uma solução digital, e acabou conhecendo meu site. Mas, por algum motivo, ela acabou não retornando, e precisamos entender o porquê disso ter ocorrido.

Dessa forma, mapeei alguns possíveis pontos de dor vivenciados pela Sofia ao utilizar meu serviço de entrega de compras de mercado. O pedido está chegando no prazo prometido? Houve substituição ou ausência de algum produto? O consumidor é informado que há possibilidade de substituição e ele está de acordo com isso?

A partir dos pontos de dor, conseguimos enumerar melhorias no processo como um todo.

  • Checar logística de entrega para garantir o prazo prometido.
  • Melhorar a comunicação sobre possibilidade de ausência de produtos.
  • Perguntar ao consumidor no checkout se aceita substituição de produtos, e informar antes da entrega que produto não há, e oferecer opções de produtos equivalentes.

Após as sugestões de melhorias serem colocadas em prática, deve-se checar se a quantidade de consumidores que retornou ao meu site após a primeira compra aumentou. O ideal é envolver colaboradores de diferentes áreas da empresa, para que cada um possa dar sua contribuição no diagnóstico da qualidade dessa experiência. Então, converse com designers, desenvolvedores, profissionais da área de negócios e, é claro, com consumidores. Quanto mais partes envolvidas, mais rico é o resultado. Faça reuniões e apresentações dos resultados e engaje seus colegas de trabalho a enxergarem a jornada como uma importante ferramenta de resolução de problemas.

O que podemos destacar disso tudo?

  • Fuja de achismos e trabalhe com empatia: Se desenharmos tudo baseado em nossas experiências pessoais, você pode ter um resultado enviesado.
  • Conheça seu público e defina personas para entender seu modo de pensar: Lembrando que personas são representações de seus principais consumidores, com um resumo descritivo dessas pessoas. Utilize dados de sua empresa para montar esses perfis.
  • Foque em um objetivo para sua jornada: A empresa que você trabalha quer melhorar a avaliação de um produto ou serviço na loja online? Quer entender o porquê muitas pessoas não voltam a utilizar seu produto ou serviço?
  • Represente graficamente os pontos de contato entre consumidor e produto/serviço: Não existe receita de bolo. A representação pode ser uma linha do tempo, um gráfico circular, uma ilustração elaborada. Encontre o formato que faça mais sentido para você, mas mantenha as etapas de contato.
  • Identifique os canais de comunicação envolvidos, as emoções sentidas pelas pessoas e suas ações: O que o público sente em cada etapa do processo? Será que estou contribuindo ou atrapalhando sua tomada de decisão?
  • Reconheça pontos de dor e potenciais melhorias: É necessário melhorar algum ponto da régua de comunicação com o público? É preciso rever o tom da comunicação?
  • Compartilhe os resultados com sua equipe: Converse com designers, desenvolvedores, área de negócio e, inclusive, com consumidores. Quanto mais partes envolvidas, mais rico é o resultado.

E não podemos nos esquecer de que uma jornada é uma ferramenta útil não somente para produtos digitais, mas para qualquer produto ou serviço em que se queira mapear a experiência do consumidor. Um hospital pode desenhar a jornada de seu público, para averiguar se o atendimento na emergência é eficaz. Uma escola pode querer diagnosticar se o modelo de aula adotado está sendo bem assimilado pelos alunos.

Além disso, é possível também desenhar uma jornada de um novo produto ou serviço, que ainda será lançado no mercado. No entanto, será um mapeamento baseado em hipóteses e em dados mais genéricos, o que torna essencial uma checagem após a implementação do produto no mercado.

Dessa forma, percebemos que o Design Thinking tem possibilitado a aproximação do jeito de pensar e projetar de um designer a diversas pessoas. E a jornada do usuário mostra-se uma excelente ferramenta de contextualização.

Por fim, uma citação de Abby Covert, UX designer e autora do livro “Como fazer sentido na bagunça: arquitetura da informação para todos”.

Quando você vê o mundo através dos olhos de outras pessoas, pode identificar pontos fracos e oportunidades de melhoria.

Envolva as pessoas no processo, não se esconda de outras partes interessadas nem espere até o final do projeto para conversar com os usuários.

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