Casa Agrícola Brum — Uma Casa Centenária na Produção de Vinho

Rogério Sousa
Made in Azores
Published in
6 min readMay 12, 2020
Entrada da Casa Agrícola Brum — Biscoitos | Foto: Carlos Luís da Cruz

Com 130 anos de existência, a Casa Agrícola Brum representa a história de uma família açoriana, que há cinco gerações se dedica à produção vitivinícola na Região dos Biscoitos, ilha Terceira, e à gestão do Museu do Vinho dos Biscoitos, espaço etnográfico dedicado à cultura da Vinha e do Vinho nos Açores.

A freguesia dos Biscoitos é a freguesia mais a norte da ilha Terceira, com uma extensão de três quilómetros, situada entre as freguesias de Quatro Ribeiras e Altares. Desde a altura do povoamento da ilha, a zona dos Biscoitos estabeleceu fama pela sua produção de vinho de qualidade, que se mantém até aos dias de hoje, traduzindo-se na designação Vinhos de Qualidade Produzidos em Região Demarcada (VQPRD).

Ilha Terceira e a Zona Vitivinícola dos Biscoitos | Ilustração: Made in Azores

Tal como na ilhas do Pico e Graciosa, a produção do vinho Verdelho na ilha Terceira faz-se com recurso às características “curraletas” (ou currais) — pequenos quadrados de pedra que protegem as plantações do vento marítimo mas deixam entrar o sol necessário à sua maturação, criando uma espécie de “efeito de estufa” que permite o pleno desenvolvimento das vinhas.

As “curraletas” constituem uma arquitectura rural edificada que vem resistindo às diversas intempéries que têm assolado a principal zona vitícola da Terceira. Cada “curraleta” tem em média nove covas, também conhecidas por covachos ou caldeiras. À medida que nos vamos afastando da costa marítima, as curraletas atingem tamanhos maiores, comportando por vezes vinte e mais covas, estando estas à distância de 0.70 m umas das outras.

Dadas as suas características, este sistema cultural recorre ao uso de muita mão-de-obra, sendo difícil, ou quase impossível, a sua mecanização. Cada curraleta comporta um número variável de cepas, número este que é condicionado pela respectiva área e fisiografia.

Curraletas com Verdelho | Foto: Revista Verdelho — Boletim Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos nº 7 2002

A Família Brum

Por volta de 1870, a praga da filoxera atingiu a ilha Terceira, particularmente a produção vitivinícola dos Biscoitos, dizimando colheitas e obrigando à utilização do bacelo americano como porta-enxerto, de modo a evitar esta doença nas castas seleccionadas.

Nessa altura, e graças ao seu enorme espírito de iniciativa, Francisco Maria Brum fundou a primeira Adega Regional do seu tempo, a 2 de fevereiro de 1890, na freguesia das Fontinhas. Sete anos depois, mudou-se para os Biscoitos, tendo liderado o processo de requalificação da vinha dos Biscoitos, com puas vindas de pés francos recolhidos, inicialmente, no Porto Martins e na Caldeira das Lajes.

Cerca de dez anos depois da fundação da Adega, deu-se início à produção do vinho. Os resultados dos testes iniciais foram satisfatórios e a produção galopante. Em 1901, produziram-se três potes de vinho verdelho; no ano seguinte uma pipa; em 1903, foram 6 pipas e meia; no ano seguinte, 11 pipas. E os números de pipas foram crescendo, assim como a fama do vinho Verdelho dos Biscoitos, reconhecida aqui e Além-mar como um vinho licoroso de elevada qualidade.

Filho de Francisco Maria Brum, Manuel Gonçalves Toledo Brum seguiu as pisadas do pai e construiu uma nova adega. O seu filho, Fernando Linhares Brum, não fugindo à regra dos antecessores, com produção acrescida, dotou a Casa com novas e adequadas infraestruturas.

Reconhecendo e louvado o seu esforço e empenho como empresário, em 1987, o Presidente da República Portuguesa, Mário Soares, em 10 de Junho, atribuiu o Grau de Comendador da Ordem de Mérito Agrícola e Industrial (Classe de Mérito Agrícola) a Fernando Brum.

Filho de Fernando Brum, Luís Mendes Brum continuou o legado da sua família, levando-o a modernizar uma das adegas destinadas a vinhos tranquilos, com equipamentos vindos da Itália. Lançou o vinho branco de mesa “Donatário” e o “Da Resistência”, ambos referências no vinho dos Açores.

Luís Mendes Brum foi o principal impulsionador do movimento que levou à criação da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos. Em 2007, a Casa Agrícola Brum passou para a sua 5ª Geração, com a inclusão de Luís e Maria Cristina Brum nos seus órgãos de gestão.

Foto: https://historias-john-soares.blogs.sapo.pt/museu-dos-vinhos-nos-biscoitos-ilha-94107

O Museu do Vinho dos Biscoitos

A 2 de fevereiro de 1990, data comemorativa do primeiro centenário da fundação da Adega Regional de Francisco Maria Brum, os seus herdeiros inauguram ao público o Museu do Vinho dos Biscoitos.

Um espaço que no seu percurso museológico se pode apreciar todo o processo de produção de vinho, desde o cultivo da videira até à maturação da vinha e à transformação da uva em vinho ou nos seus subprodutos. Aqui encontram-se também toda uma colectânea de alfaias agrícolas ligadas ao amanho das “curraletas” onde a videira é cultivada.

O museu é a fachada de uma propriedade com 10 alqueires, para além dos mais 60 que englobam a exploração de Verdelho e é constituído pelas seguintes secções: uma adega destinada ao Vinho Verdelho, uma destilaria, uma Sala etnográfica, uma Sala de provas, uma Casa típica onde é feito o engarrafamento do Verdelho do Museu, uma Casa típica que é a sede da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos, um campo ampelográfico, uma latada, vários pátios que alojam peças de lagares, uma torre, uma eira, e um palheiro com dois pisos.

Assumindo-se como um museu temático, este espaço procura apresentar aos visitantes os mais de quatro séculos de história da cultura da vinha nos Biscoitos. Como espaço cultural ao serviço da população, vem disponibilizando as suas instalações para a Festa da Vinha e do Vinho dos Biscoitos, assim como para outras acções culturais.

Interior do Museu do Vinho dos Biscoitos

Os Vinhos da Casa

A Casa Agrícola Brum produz vinhos brancos de mesa e vinhos licorosos (VLQPRD). Os vinhos brancos são o “Donatário” e o “Da Resistência”, os licorosos, “Chico Maria”, evocam a memória do fundador da Casa — Francisco “(Chico) Maria” Brum.

Vinho Branco “Da Resistência” — “Da resistência, não só por dar continuidade ao primeiro vinho produzido na ilha Terceira, há mais de 400 anos atrás, com a mesma casta, mas também porque procura resistir ao assalto de uma urbanização desenfreada e desnecessária” (Oliveira Figueiredo).

Vinho Branco Donatário — feito com Verdelho dos Biscoitos, alcança um teor alcoólico de 12%. Cor: ouro pálido com reflexos verdes. Aroma: muito fino de fruta verde e discreta maresia (algas frescas). Sabor: bastante volumoso e macio, de correcta acidez, com gosto muito agradável do nariz, sobretudo a frutos do mar, longo. Temperatura de consumo entre 8 e 10º C

Chico Maria (Angelica) — vinho licoroso “Angelica”, de cor palha com tonalidades esverdeadas, com um aroma elegante, de frutos secos (nozes e avelãs), com realce e algumas especiarias e com um sabor seco, suave, harmonioso, com um final de boca persistente.

Chico Maria (Doce) — vinho licoroso doce, elaborado com Verdelho dos Açores e vestígios de Terrantez da Terceira, alcançado um teor alcoólico de 19%. Cor: ouro novo desmaiado. Aroma: algas, maresia, madeiras nobres.
Sabor: doce, muito aveludado, com uma acidez equilibrada, mostrando uma grande harmonia e um gosto muito persistente.

Chico Maria (Meio Seco) — vinho licoroso meio seco, elaborado com Verdelho dos Açores e vestígios de Terrantez da Terceira, alcançado um teor alcoólico de 18%. Cor: ouro palha definido. Aroma: fino, de tabaco, maresia e frutos secos. Sabor: aveludado, bastante encorporado, agridoce persistente.

Chico Maria (Seco) — vinho licoroso Seco, elaborado com Verdelho dos Açores e que alcança um teor alcoólico de 17%. Cor: ouro palha com tonalidades esverdeadas. Aroma: elegante, de frutos secos (nozes e avelãs), com realce e algumas especiarias. Sabor: seco, suave, harmonioso, com um final de boca persistente.

Brum — vinho branco licoroso, com mais de 18 anos de estágio, para ser apreciado com a sabedoria que lhe é devida. Esta garrafa é a comemoração da centésima oitava colheita da Casa Agrícola Brum, um marco da perseverança no meio de uma terra vulcânica. Teor alcoólico: 19%.

Vinhos brancos e licorosos da Casa Agrícola Brum | Foto: Made in Azores

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