Do marketing para design e produto: como migrei para UX writing

Ulisses Lisboa
Magnetis Design
Published in
6 min readJul 21, 2020

Há exatamente cinco meses deixei o marketing para trabalhar com design e atuar como UX Writer. Ao trabalhar com tecnologia e ter amigos e amigas designers, passei a escutar bastante sobre essa tal posição de escritor da experiência do usuário em startups. Hoje estou aqui para te contar como fui parar nesse mundo e como tem sido todo o processo. Vamos lá?

Ao longo desses últimos anos trabalhando com marketing em diferentes empresas, a minha maior experiência sempre foi com engajamento e captação de clientes por meio de conteúdo. Newsletter, texto para o blog, e-mail marketing, redes sociais, mídia, comunicados, releases para imprensa. Por aí vai. Como ~analista de comunicação~, sempre fui procurado para todo tipo de tarefa que envolvesse escrita e conteúdo. “Chama o menino do marketing”. E assim fui desenvolvendo bastante experiência com comunicação generalista. De tudo, pelo menos eu fiz um pouco.

Há um ano e meio entrei para o time de marketing na Magnetis Investimentos. Ao chegar, meu desafio era de ajudar a alavancar a presença digital da fintech por meio das redes sociais. Nesse caso, meu trabalho seria totalmente focado em instagram, facebook, twitter e linkedin. Mais especialista, menos generalista. Tive o desafio de criar novas editorias para as redes sociais, envolver pessoas da equipe de consultoria para aparecer em lives e vídeos, enquetes, sorteios, campanhas e tudo que fosse possível para repaginar as redes. Foi divertido, tive altos tropeços e trabalhei com uma equipe incrível, que sempre me ajudava com ideias, sugestões e apoio nas atividades da área.

E cadê ux writing nessa história?

Eita, vamos lá. Eu estava lá no marketing todo marketeiro fazendo os paranauês de redes sociais e um belo dia meu gestor pediu para eu começar a cuidar dos releases — aqueles textinhos de atualização do nosso aplicativo na apple e play stores. “Vamos para cima”. Nisso, quem me pedia para escrever esses textos eram os desenvolvedores e nas primeiras vezes que falaram comigo, eu disse: calma lá. Quê? Oi? Eram tantos termos de tecnologia que já começou ali meu desafio em traduzir e simplificar uma nova funcionalidade na experiência.

O que me gerou um incômodo no começo, de repente se tornou uma curiosidade. Confesso que sou uma pessoa enxerida, então decidi começar o flerte com esse tal ambiente de produto e tecnologia. Como era algo mega novo para mim, precisei levantar a mão e pedir ajuda. Como? Fui atrás de ouvir pessoas que já trabalham com isso. Marquei reuniões de benchmarking com uma galera. Rolou papo com Ifood, Loggi, Porto seguro, Submarino, Americanas, Gympass, Conta Azul. Nisso fui me empolgando tanto que consegui falar até com a UX Writer do spotify, direto de Estocolmo. Ó que chique, hehe.

Mas peraí, ainda não tinha nenhuma pessoa cuidando de UX writing na Magnetis? Para minha “sorte”, não. A partir disso, comecei a conversar com meus gestores sobre o meu interesse e as coisas foram fluindo. Como já havia a necessidade de contratarem alguém para cuidar de UX writing, providenciaram um processo interno de migração para mim, em que envolvia algumas tarefas, como realizar um curso sobre o assunto — que fiz com o incrível Bruno Rodrigues, ler alguns artigos no medium, ler o livro Microcopy, além dos benchmarks com pessoas da área. Foi empolgante.

Do texto marketeiro para o microtexto orientativo

Não vou dizer que o processo são só flores, não, viu? Confesso que eu adorava criar legendas despojadas para as redes sociais, criar enquetes, me divertir trabalhando e ver resultado nisso depois. Porém, nas primeiras horas do curso de UX writing do Bruno Rodrigues, já veio o primeiro tapa na cara. “O texto engraçadinho fica lá no marketing. Em UX writing não há espaço para isso”. Fiquei pálido e pensei: poxa vida, eu queria escrever pushs engraçadinhos. Quê que estou fazendo aqui?

Ao me aprofundar no assunto, ler os livros indicados no curso e acompanhar artigos de pessoas que já estão colocando a mão na massa em microtextos para o produto, a dor foi amenizando e fui me inserindo nesse novo norte para meus dias: orientar e criar microtextos úteis para os usuários. Do nada, isso começou a me animar. Chega de gracinha, quero orientar a galera a concluir uma ação.

Hoje sempre faço o exercício de olhar para um texto — ou copy como a gente fala nesse linguajar startupeiro — e me pergunto: está orientando? Está sendo útil? Está claro? Como uma fintech de investimentos e com a realidade de dinheiro ainda ser um tabu, o nosso desafio diário é conseguir comunicar e explicar contextos super complicados com textos pequenos, orientativos, leves. O bom e velho: o menos é mais.

Não é terapia, mas é hora de colocar o ego atrás da porta

Se antes a gente escrevia com a carteirada da nossa formação e experiência — o que, obviamente, compõe e agregam ao que fazemos hoje -, agora é hora de se colocar a estaca zero. Ave, mas que chato esse UX writing, né? Não, é pé no chão. Escrever para um produto é entender o que as pessoas esperam daquela experiência. Logo, precisamos entender e compreender profundamente essa expectativa para escrever textos mais assertivos. Na verdade, eu diria que seria uma evolução da arte de escrever. Entender e ouvir para escrever.

Por isso, tive que virar uma chave na minha cabeça. Não é o que o Ulisses acha legal nessa tela. É o que as pesquisas com usuário vão me guiar a escolher o melhor termo para esse público. Afinal, quem usa esse produto são essas pessoas. Precisamos ouví-las.

E ouvir o nosso público é como se você tivesse acesso a ferramenta “pergunte para os universitários”, que são as pessoas que, de fato, usam o seu produto. Se está com dúvida de usar uma palavra, um termo, uma expressão, para quê ficar quebrando a cabeça consigo mesmo se a resposta está com as pessoas que usufruem desse produto?

Posso dizer que estou em um ambiente de trabalho muito privilegiado, pois temos uma UX Researcher fera, a Elisa Volpato, que ajuda todo o time quando o assunto é pesquisa. Nisso, criamos um ritual para eu estar mais próximos dos nossos clientes e entender como eles falam, como se expressam, como se posicionam: toda a semana escuto pelo menos 2 ligações de clientes. Porque trabalhar com experiência do usuário é, literalmente colocar o ego atrás da porta e ouvir o que o usuário tem a dizer. E quer saber? Isso só ajuda todo mundo no final do dia com a tomada de decisões em todas as pontas de um produto. Por exemplo, eu passo por diversas dúvidas em decidir pelo termo “x” ou “y” em uma determinada tela e meus pares me ajudam a revisar. Porém, quando a gente pesquisa e ouve o usuário, essa dúvida se desfaz de forma mais assertiva e data-driven — palavra que a galera das startups adora.

Eita, agora sou do time de design e produto

Em minha perspectiva, é muito importante apostar. Aposta em nós e nas oportunidades que aparecem em nossa frente. Sinceramente, nunca pensei em trabalhar como UX Writer, mas esse caminho surgiu e eu decidi percorrê-lo e estou a percorrer. Na verdade, tem muita coisa para percorrer e sempre será assim, em constante aprendizado.

Com essa nova posição, tem sido um enorme aprendizado em ouvir, pesquisar, validar dados, e pesquisar de novo. Trabalhar com UX writing é fazer o exercício diário de abrir o coração para ouvir as considerações que muitas pessoas vão fazer em cima do que você escreve. Todos os dias. A gente fica mal acostumado de achar que tudo que escrevemos é o suficiente e está bom, mas vivenciar o dia-a-dia de um produto digital é o inverso. Questionar, revisar e sugerir mudanças em texto às vezes arranha aquele ego lá no fundo. Mas é o único jeito possível de amadurecermos nossa escrita e escrevermos textos mais orientativos, assertivos e ideias para o seu público.

E seguindo esse pensamento, estamos em um processo experimental. Estamos descobrindo muitas coisas, UX writing é um filho que nasceu recentemente. Tudo é muito novo e o mato está alto, mas já estamos conseguindo alguns machados para ir cortado essa grama. Hoje já temos muitos materiais, cursos, artigos, webinar, etc. Tem muita gente produzindo conteúdos incríveis, como Yuvan Keshtcher, Bruno Rodrigues, Cris Luckner, Ariana Neves, Ludmilla Rocha, Greta van der Merwe (tentei marcar essa galera aqui, mas o medium não deixou) e essa lista vai ficando cada vez mais grande. Bora aumentar essa rede?

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