A maternidade nossa de cada dia

Andressa Spata
mammavera
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6 min readOct 7, 2017

Mesmo depois que o Miguel nasceu, eu continuei no mestrado. Sim, estou de licença-maternidade no trabalho, e tenho o privilégio de trabalhar em uma empresa que adota a licença de 6 meses. Mas não parei o mestrado. Como ele foi um “menino bonzinho”, nasceu no final do primeiro semestre, e eu pude ficar com ele por quase 2 meses antes de voltar.

Quando eu digo isso, as pessoas me fazem várias perguntas: mas ele fica com quem? Você não fica com pena de deixar um bebê tão pequeno com outra pessoa? Você deve morrer de saudades, né? E como você amamenta?

Vamos por partes: Miguel fica com a avó paterna, uma das pessoas em quem eu mais confio no mundo. Eventualmente, fica com a minha mãe, com o pai — felizmente, o pai dele, meu marido, assume suas responsabilidades e cuida do Miguel com perfeição — , com as tias, com minha dinda… Enfim, fica com pessoas que o amam e cuidam dele com o maior carinho do mundo.

Não, eu não fico com pena de deixar um bebê tão pequeno com outra pessoa, e sim, morro de saudades. Eu, pessoalmente, fico muito feliz ao ver o Miguel criando vínculos com pessoas tão importantes na vida dele. Não sou uma mãe possessiva, que acha que só ela, e mais ninguém sabe cuidar do seu bebê. Pelo contrário! Adoro vê-lo dando gargalhadas para as avós, ou cheio de dengo com o pai. Acho fundamental que ele confie em outras pessoas, além da mãe, e não acredito que nosso laço será mais fraco por isso. Mas lógico que sinto saudades! Volta e meia, eu me pego olhando as fotinhos dele no celular, falando das conquistas diárias dele, pensando naqueles olhinhos curiosos…

E não, não amamento o Miguel, como já escrevi em outro texto. Mas, enquanto estava grávida, pesquisei e me informei sobre como tirar, armazenar e dar o leite materno para que eu pudesse me ausentar. Infelizmente, não pude usar esses conhecimentos em benefício próprio. Felizmente, consegui ajudar algumas amigas com o que eu aprendi.

Decidi continuar no mestrado por vários motivos, práticos e emocionais. Do ponto de vista prático, quando eu voltar ao trabalho no ano que vem, praticamente só precisarei me dedicar à dissertação, o que vai facilitar bastante a minha disponibilidade.

Do ponto de vista emocional, já que eu sou muito sortuda e tenho várias pessoas maravilhosas me ajudando, por que não aproveitar? Desde que eu me formei, eu tinha vontade de fazer mestrado, mas só no ano passado consegui definir o que eu queria, de fato. Acontece que eu descobri que estava grávida uma semana depois de ter sido aprovada para o mestrado. Fiquei bem confusa no começo, mas contei com professores maravilhosos no primeiro semestre e tenho essa rede de apoio incrível ao meu lado.

Além disso, eu confesso que estava enlouquecendo 24 horas por dia, 7 vezes por semana em casa, ainda mais com todos os problemas que eu tive para amamentar. Por isso, foi um grande alívio quando as aulas começaram e eu pude colocar minha cabeça em outras coisas. Mas não é nada fácil! Eu não estou de férias, estou de licença-maternidade, e há muitos dias em que eu fico mais cansada do que se tivesse passado 12 horas seguidas em campo, fazendo entrevistas e observações, e coletando dados sob o sol do Sertão.

E tem as segundas-feiras, quando ficamos sozinhos e ele não quer sair do colo. Eu mal conseguia ir ao banheiro ou almoçar! Já cansei de ler texto com ele no colo, ou de picotar um raciocínio porque ele começava a chorar. Felizmente, isso tem mudado e agora Miguel está começando a criar uma rotina de sonecas e brincadeiras, embora sempre tivesse de mamadas. Mas foi um sufoco!

Eu também não deixei de fazer pilates. 3 vezes por semana, às 7 da manhã, lá estou eu “pilateando”. Não tem como não fazer nada! Ainda mais com um bebezão pesadão como ele, minha coluna e meus braços vão para o espaço. Graças a isso, e a uma boa alimentação — na medida do possível — , aos nossos passeios na pracinha, minha recuperação tem sido excelente e eu já estou a 2 kg de voltar ao meu peso normal. Sou vaidosa e uma das coisas que mais me deixava para baixo era ver como meu corpo estava mudado… Ok, julguem-me, mas ver partes do meu corpo que eu sempre curti, um tanto quanto “deformadas” — ainda que por um bem maior — me deixavam meio mal…

Tampouco deixei de sair, de ir a aniversários de pessoas queridas, de ir a eventos de família, de receber visitas, de viajar… Na maior parte das vezes, Miguelito está conosco. Mas quando eu quero sair com o marido para curtirmos a sós, ou quando é um programa mais tarde, combinamos com nossa rede de apoio, Miguel fica e nós vamos. É verdade que hoje em dia, tudo tem que ser combinado com certa antecedência e dá um trabalhinho montar os nossos esquemas. Não é mais ir e pronto. Mas acho que, na medida do possível, estamos conseguindo manter nossa vida social.

Essa foi a maternidade que eu escolhi viver. Repito que tem sido muito facilitada pelas pessoas incríveis que eu tenho ao meu lado. E, em partes, pela mãe que eu escolhi ser. Acima de tudo, uma mãe que, ao assumir o papel de “mãe”, não deixou de ser a Andressa: a esposa, a amiga, a filha, a profissional, a mestranda, a mulher… Super respeito quem incorpora o papel de mãe, ponto, e é feliz com ele. Sou a favor da felicidade e cada um sabe da sua. Porém, eu sou feliz assim: sendo mãe e todo o resto.

Acredito que dessa forma, estou montando a base para que o Miguel se reconheça como um indivíduo inserido em um núcleo familiar e social, mas, acima de tudo, um ser dotado de personalidade própria, com suas questões particulares, seus gostos, seus desejos… De alguns deles eu sequer farei ideia — afinal, que pai ou mãe, ainda mais de adolescente, sabe tudo da vida dos filhos, e não quero Édipo na minha casa — , mas outros eu conhecerei.

Eu não preciso ter controle da vida dele 24 horas por dia durante a vida toda. Enquanto ele for criança sim, mas depois, conforme for crescendo e for se tornando um homem com seu caráter e seus valores, esse controle vai diminuindo até ele ter a vida dele. Assim, eu espero que ele se torne independente. Lembrando que independência não é indiferença! Por isso, não sinto medo e não acho que ele não vai querer mais saber da mãe conforme for crescendo.

E a melhor forma para isso é justamente transmitindo confiança para ele. É desde cedo respeitando os seus sonhos, seus objetivos, desejos e anseios, orientando, apoiando e dando aquele suporte financeiro e emocional quando for necessário, é transmitindo valores e dividindo a minha experiência de vida. Mas respeitando as escolhas dele — desde que não façam mal a ninguém, nem mesmo a ele.

Ser assim não é fácil. Infelizmente, a sociedade julga e cobra das mães dedicação única, total e exclusiva. Por isso, tão logo uma mulher se torna mãe, se ela ousa buscar a sua individualidade, é vista como pouco dedicada, indiferente, fria… Quando, na realidade, ao menos no meu entendimento, para ser uma boa mãe, eu preciso também ser feliz. E a minha felicidade está em várias coisas das quais eu não preciso abrir mão só porque me tornei mãe.

Por isso, não acredito nessa maternidade da devoção aos filhos e da renúncia completa. Em vários momentos, sei que isso irá acontecer, e tenho me preparado para eles dia após dia. Por exemplo, eu jamais serei irresponsável de deixar de levar o Miguel no médico para ir à aula. Ele é a minha prioridade sempre! Mas, estando tudo bem, como tem estado, por que não voltar à minha vida normal e fazer as outras coisas de que eu gosto e que me dão prazer, e que nem sempre incluirão ele? Por que não investir na minha carreira e continuar me aprimorando para ser uma boa profissional? Por que deixar de viver a minha vida para viver a dele?

Mas, novamente, respeito muito quem acredita. A maternidade nos ajuda a desenvolver o sentimento de empatia pelo outro, mesmo quando não concordamos com o que o outro acredita… Por isso, eu acho que cada mãe precisa descobrir como é a maternidade que lhe faz feliz! E vivê-la intensamente, dia após dia. Porque passa tão rápido!!!!

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