“Pacote do Veneno”: debate sobre uso de agrotóxicos no Brasil

Instituto Maniva
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4 min readMay 15, 2018
Divulgação/Greenpeace

O Projeto de Lei (PL) 6299/02, popularmente denominado “Pacote do Veneno”, de autoria do senador e atual Ministro da Agricultura, Blairo Maggi (PP-MT) vem sendo discutido em Brasília. De acordo com o documento de tramitação, seu objetivo é modificar o sistema de registro dos agrotóxicos, seus componentes e afins, flexibilizar o processo de liberação de novos produtos tóxicos e alterar o nome agrotóxico para “produto fitossanitário”.

Se houver aprovação do Executivo, o controle do registro de agrotóxicos será de competência exclusiva do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), descaracterizando o poder de veto das áreas de saúde e meio ambiente, o que pode fragilizar o controle de produtos atualmente proibidos no Brasil por serem cancerígenos, causarem anomalias, má formação do feto e danos ao material genético de um indivíduo.

Contrárias à aprovação do PL, organizações como Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Instituto Nacional do Câncer (Inca, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e Associação Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) entendem que a população será colocada em risco, em especial, grupos vulneráveis como mulheres grávidas, crianças e trabalhadores rurais, cujas atividades dependem da produção e uso de fitossanitários

Em nota pública, a Fiocruz expressa sua opinião: “A regulação de agrotóxicos não pode ser tratada de forma simplista, com a proposição de mudanças voltadas para atender aos interesses do mercado (..). A falsa justificativa de que é preciso ‘dar celeridade aos processos de registro’ trata as avaliações hoje conduzidas como burocracias desnecessárias que representam entraves à economia. (..). Ao invés de resolver a precarização técnica e humana da estrutura reguladora, propõem sua desregulação. É preciso que haja rigor no processo de avaliação e que sejam ofertados aos órgãos competentes, tais como a Anvisa e o Ibama, condições adequadas de trabalho — materiais e pessoais — para que o processo de avaliação e registro de agrotóxicos possa ser conduzido com todo o rigor necessário para a proteção da vida e a defesa de um ambiente equilibrado.”. (Nota divulgada pela Fiocruz em 07/05/18).

Também contrário à aprovação do Projeto de Lei, o IBAMA, em nota técnica manifestada no dia 26/04/18, afirma que “a flexibilização de procedimentos e análises concernentes ao registro, tal como proposto no Substitutivo, não visa assegurar que produtos mais seguros estejam disponíveis no mercado, mas tão somente que mais produtos ingressem no mercado e os já registrados tenham maiores garantias de permanência.”. Concluiu afirmando: “Sugerimos que a manifestação do Ibama seja contrária à aprovação do Substitutivo ao Projeto de Lei n° 6.299, de 2002 e apensados, (..) se implantadas, reduzirão o controle desses produtos pelo Poder Público, especialmente por parte dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde e do meio ambiente. (..) O procedimento básico e inicial de controle a ser exercido pelo Poder Público e sua manutenção e aperfeiçoamento se justificam na medida em que seja, primordialmente, um procedimento que previna a ocorrência de efeitos danosos ao ser humano, aos animais e ao meio ambiente.”. (pg 7., Nota técnica Ibama, 26/04/18)

Por outro lado, Nishimori entende que os procedimentos de avaliação no Brasil se baseiam em análises de perigo, enquanto os Estados Unidos e a União Europeia os avaliam a partir do GHS (Sistema Harmonizado Globalmente para a Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos) e riscos gerais. Aduz, ainda, que o processo de registro é “burocrático e demorado” e defende a melhoria de tal processo para que o mercado que engloba desde a agricultura familiar até grandes cooperativas, tenha acesso a esses produtos. O tempo de espera para um produto ser registrado chega a 5 anos em média e, com a implantação da nova lei, o tempo reduziria para, somente, 1 ano.

A construção do relatório que acompanha o PL completou dois anos de discussão, envolvendo profissionais da saúde, meio ambiente, cientistas, universidades e representantes de órgãos públicos nos debates. Na última reunião, do dia 08/05, Nishimori afirmou:Estou seguro de que chegamos à melhor proposta para a sociedade, mas estou disposto a receber contribuições e sugestões concretas e bem elaboradas”. A presidente da Comissão Especial, a deputada Tereza Cristiza (DEM-MS), também se posiciona: “Passamos dois anos ouvindo a sociedade, setores e todos os interessados. O debate sempre foi fomentado nesta Comissão. Não podemos é deixar que discursos ‘apaixonados’ interfiram numa discussão técnica, que moderniza e aproxima o Brasil do padrão internacional de desenvolvimento agrícola”.

Campanhas e manifestos vêm sendo criados contra o Projeto de Lei e contra a utilização desses defensivos químicos. Cozinheiros, profissionais da saúde e alimentação promovem uma movimentação em redes sociais, visando uma união e um poder de voz dos consumidores para se apresentarem contrários à aprovação do PL.

Desde 2008, o Brasil lidera no pódio de país que mais utiliza agrotóxicos no mundo, sendo um consumo equivalente a 5,2 L por pessoa/ano.

O Instituto Maniva se posiciona contra a aprovação do Projeto de Lei 6299/02 e defende o direito de uma alimentação livre de produtos e aditivos químicos que causem danos à saúde humana e agroecológica.

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O Instituto Maniva é uma associação sem fins lucrativos que tem como missão promover a melhoria da qualidade alimentar das sociedades rural e urbana.