Esfenoidectomia

Vitor Abraão
Manual de Cirurgia Nasossinusal
8 min readAug 3, 2022

Anatomia

Para realizar uma abertura segura do seio esfenoidal deve-se identificar alguns pontos anatômicos importantes:

  • A concha superior: Em 98–100% dos pacientes, o óstio natural do esfenoide é encontrado medialmente à base da concha superior;
  • As coanas: O óstio natural se localiza aproximadamente 10–15 mm acima das coanas;
  • O septo nasal: Situa-se medialmente ao óstio, a poucos milímetros de distância;
  • Base do Crânio: O óstio natural se localiza aproximadamente 11 mm abaixo da base do crânio;
  • O teto medial do seio maxilar: Essa região corresponde a uma crista formada pela margem superior da antrostomia do seio maxilar e representa o nível do assoalho orbital medial . O óstio do seio esfenoidal e o teto do seio esfenoidal estarão, respectivamente, cerca de 3 mm e 11 mm superiores ao teto medial do seio maxilar. Assim, realizar a abertura do seio esfenoidal nesse nível fornece uma margem razoável de segurança em relação à base do crânio.

Esfenoidectomia Transnasal

Geralmente indicada quando há acometimento isolado do seio esfenoide (p ex. sinusite esfenoidal isolada), ou combinada a uma septectomia posterior para a abordagem transnasal endoscópica à hipófise.

Técnica Cirúrgica:

  • Para a realização desta esfenoidectomia é utilizado o endoscópio de 0 °, que é passado medialmente à concha média, em direção ao recesso esfenoetmoidal;
Visualização do Óstio natural do Seio Esfenoide direito. CM: Concha Média; CS: Concha Superior; OE: Óstio do Esfenoide; SN: Septo Nasal.
  • Identificar a concha superior. Para uma exposição adequada do óstio natural é recomendada a remoção da porção inferior da concha superior com uma pinça cortante, até a sua inserção na parede anterior do seio esfenoide. Não há prejuízo no olfato com essa remoção parcial da concha superior;
Remoção da porção inferior da concha superior com uma pinça cortante
  • Nesse ponto, o óstio natural do esfenoide geralmente pode ser visualizado diretamente. Geralmente localizado a 10–12mm acima das coanas, entre o resquício da Concha Superior e o Septo. Um instrumento rombo, como um aspirador ou uma cureta, pode ser utilizado para palpar o óstio, caso ele não esteja aparente;
  • O óstio natural do esfenoide deve ser penetrado com um instrumento rombo e ser ampliado inicialmente com uma cureta reta, pinça Hajek-Kofler, pinça micro Kerrison, ou pinça cogumelo reta. Cuidado deve ser tomado ao progredir esta ampliação inicial. Neste momento, não progredir lateralmente além da inserção da concha superior, pois isto evitará uma possível lesão do nervo ótico e artéria carótida interna. Outro cuidado é não progredir muito inferiormente para evitar sangramento decorrente de lesão da artéria septal posterior, ramo da artéria esfenopalatina, que passa acima do arco das coanas;
  • Após uma ampliação inicial, o endoscópio de 0 graus ou 30 graus poderá ser introduzido dentro do seio esfenoide, para visualizar a localização do nervo óptico e canal carotídeo nas paredes laterais do seio esfenoide. Após a devida visualização, será possível progredir o restante da ampliação do óstio de uma forma segura utilizando as pinças citadas anteriormente;
  • Uma ampliação do óstio natural, de pelo menos 5–10mm garantirá uma chance menor de reobstrução.

Vídeo demonstrativo da Esfenoidectomia Transnasal abaixo:

Esfenoidectomia transetmoidal

Esta abordagem geralmente é utilizada em situações em que há necessidade concomitante de abordagem do seio etmoide.

Técnica cirúrgica:

  • Após a etmoidectomia anterior, identificar a lâmina papirácea e a lamela basal;
Aspecto pós etmoidectomia anterior à esquerda. SN: Septo nasal; CM: Concha Média; LM: Lamela Basal; LP: Lâmina Papirácea.
  • Realizar a abertura da porção medial da lamela basal (ao nível do teto do seio maxilar);
Abertura da porção medial da lamela basal (ao nível do teto do seio maxilar)
  • Após a abertura nesta área, a concha superior geralmente pode ser identificada. Se a divisão entre a concha média e a concha superior não puderem ser visualizadas, uma cureta reta ou uma sonda angulada “ball-tip” podem ser utilizados para palpar e delinear a divisão entre as duas estruturas (o meato superior);
  • Após a identificação do meato superior e da concha superior, progride-se a remoção do restante da lamela basal. Cuidado deve ser tomado para preservar parte da inserção inferior da lamela basal na parede nasal lateral.
  • Nesse ponto do procedimento, os limites inferior e medial da dissecção etmoidal foram definidos;
  • A dissecção é então direcionada lateralmente, realizando a abertura do etmoide posterior com a finalidade de identificar a lâmina papirácea. A lâmina papirácea deve ser exposta e sua superfície regularizada, retirando as espículas ósseas das septações etmóides, delineando assim o limite lateral da dissecção.
  • Completa-se a dissecção de células etmóides posteriores no sentido superior para identificar e definir amplamente a base do crânio (limite superior).
  • Quando todas as septações etmoidais são ressecadas, os limites da esfenoidectomia transetmoidal tornam-se evidentes:
    o Medialmente, a porção lateral da concha superior;
    o Lateralmente, a lâmina papirácea;
    o Superiormente, a base do crânio;
    o Inferiormente, a inserção horizontal da concha superior à parede nasal lateral e
    o Posteriormente, o rostro do esfenoide, que geralmente possui coloração em tom azulado.
  • A parede anterior do esfenoide (parede posterior da “Caixa de Bolger”) é, então, dividida em dois triângulos, por meio de uma linha imaginária, traçada da região superomedial para a região inferolateral. A dissecção no triângulo inferomedial será segura, enquanto a dissecção no triângulo superior será perigosa devido à proximidade do nervo óptico e de artéria carótida interna;
  • Embora a abertura do seio esfenoidal possa ser realizada neste momento através da sua parede anterior em localização inferior e medial, é mais seguro localizar primeiramente o óstio natural do seio esfenoidal. A porção inferior da concha superior pode ser removida com pinça cortante reta para facilitar a visualização do óstio natural do esfenoide, localizado medialmente ao coto remanescente da concha superior. A identificação do óstio natural evita uma abertura inadvertida do teto posterior do etmoide, onde a penetração levaria à fístula liquórica. Nos casos em que o cirurgião não tenha certeza se abriu um seio esfenoide de tamanho pequeno ou uma célula etmoidal posterior, a identificação do óstio natural do esfenoide removerá essa dúvida. Além disso, essa técnica garantirá que o óstio natural esteja em continuidade com o óstio cirúrgico alargado.
Remoção da porção inferior da Concha Superior com pinça cortante;
  • Após a identificação do óstio natural do seio esfenoide, ele deve ser penetrado e alargado com uma cureta, inicialmente no sentido inferomedial;
  • O óstio natural deve ser ampliado em direção lateral com uma cureta, pinça Kerrison ou cogumelo reta. Toda a parede anterior do seio esfenóide pode ser removida, se necessário; no entanto, uma abertura de 10 mm é geralmente suficiente para garantir a permeabilidade no pós-operatório
Abertura do óstio natural do esfenoide através da etmoidectomia posterior.

Vídeo demonstrativo da Esfenoidectomia Transetmoidal abaixo:

Esfenoidectomia transseptal

Indicada em casos em que será abordado o septo nasal e em casos de doença isolada do seio esfenoide. Como vantagens desta técnica temos um menor risco de sangramento, pois o espaço subcondral-subperiosteal possibilita um plano avascular. Menor chance de dano à concha média e concha superior. Maior facilidade em inspecionar o recesso esfenoetmoidal no pós-operatório, pois o septo posterior (sem osso) estará flexível, possibilitando o avanço do endoscópio no recesso esfenoetmoidal e interior do seio esfenoide.

Técnica Cirúrgica:

  • Injetar solução vasoconstritora ao longo do subpericôndrio septal bilateralmente para facilitar o descolamento da mucosa;
  • Realizar completo descolamento da mucosa septal, no plano subpericondral-subperiostial. Se houver desvio septal, realizar sua remoção antes de abordar o esfenoide;
  • Após descolamento completo da mucosa, identificar parede anterior do esfenoide e a coana óssea;
  • Realizar a remoção do septo posterior até o nível do rostro do esfenoide. Descolar a mucosa que recobre a parede anterior do seio esfenoidal o mais lateralmente possível. Em alguns casos, ocorrerá sangramento oriundo do ramo septal da artéria esfenopalatina e um aspirador-cautério pode ser utilizado para controlar o sangramento;
Descolamento completo da mucosa septal e identificação do óstio natural do seio esfenoide. SNP: Septo Nasal Posterior; CO: Coana Óssea; OE: Óstio do Esfenoide; MS: Mucosa Septal descolada.
  • Na maioria dos casos, os óstios naturais poderão ser localizados. Se os óstios naturais não forem visualizados, a parede anterior do seio esfenoide pode ser perfurada em sua área mais fina, o mais baixo possível com um aspirador ou uma broca;
  • Realizar a ampliação do óstio no sentido medial, lateral e inferior com uma pinça cogumelo cortante reta ou Pinça Kerrison;
Ampliação do óstio do esfenoide com pinça Kerrison
  • Pode-se optar por remover o septo intersinusal do esfenoide de modo a gerar uma cavidade única;
Remoção do osso do septo posterior até o rostro do esfenoide
  • Rebater a mucosa septal para sua posição inicial;
  • Por via trans-nasal, dilatar a mucosa que recobre os óstios naturais do esfenoide. Dobrar essa mucosa para o interior do seio esfenoide de modo a recobrir a margem óssea do óstio com a mucosa, evitando deixar áreas de osso exposto.

No vídeo abaixo é demonstrado uma esfenoidectomia transseptal para abordagem de macroadenoma hipofisário que ocupava toda a extensão do Seio esfenoide:

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Vitor Abraão
Manual de Cirurgia Nasossinusal

Médico pela UnB. Otorrinolaringologista e Mestrando pela USP.