Sinusectomia Frontal — Draf IIA e IIB

Vitor Abraão
Manual de Cirurgia Nasossinusal
7 min readAug 4, 2022

Anatomia

A anatomia do Seio Frontal (SF) tem algumas particularidades que tornam o acesso a ele especialmente passível de complicações.

Os seios frontais repousam acima do bico frontal (Processo Nasal do Osso Frontal) no osso frontal. A Via de Drenagem do Seio Frontal (VDSF) se localiza entre as órbitas, lateralmente, e a base do crânio, posterior e medialmente. Esses limites fixos levam a uma sinusectomia estreita, com maior risco de complicações e de estenose. A VDSF tem um formato parecido com uma ampulheta e é formada pelo SF superiormente, pelo óstio do frontal (OF), em sua região mais estreita, e pelo recesso do frontal (RF), inferiormente.

O Recesso do Frontal é o espaço para o qual o seio frontal drena. Possui a forma de um cone invertido, com a extremidade superior estreita (em contato com o Óstio do Frontal) e o limite inferior mais largo (em contato com as células etmoidais anteriores).

Os limites do Recesso do Frontal são:
· Anteriormente, a Célula do Agger Nasi (a célula etmoidal mais anterior, que fica acima da inserção da porção anterior da concha média na parede nasal lateral), e o Bico Frontal;
· Posteriormente, a Bula Etmoidal, células suprabulares e a Base do Crânio;
· Lateralmente, a Lâmina Papirácea e o osso lacrimal e
· Medialmente, a porção vertical da Concha Média;

Sinusotomia Frontal Draf I

No Draf I é realizada a remoção das células etmoidais ântero-superiores que obstruem o Recesso do Frontal, portanto o Seio Frontal é tratado através de uma etmoidectomia que visa melhorar sua drenagem no etmoide. É o procedimento mais simples e menos invasivo do SF. Utilizado para abordar doenças inferiores ao óstio do Frontal.

Técnica:

  • Utilize um endoscópio de 30 graus;
  • Deslocar suavemente a Concha Média para a posição Medial;
  • Realizar Uncinectomia e exposição do Óstio do Seio Maxilar;
  • Realizar Etmoidectomia anterior completa, ressecando células etmoidais anteriores que estão ao redor do RF;
  • Com uma cureta curva, entre no infundíbulo etmoidal e remova a lamela medial da célula do Agger Nasi (Barra vertical) com movimentos de posterior para anterior;
  • Não manipular o teto do Agger Nasi e possíveis células frontoetmoidais;
  • Com o aspirador angulado de seio frontal, localize o trajeto do recesso do frontal, posteriormente às estruturas removidas (PU e agger nasi);
  • Remova todas as células frontoetmoidais anteriores quando existirem (K1, K2 ou K3 — checar minuciosamente na tomografia) e suas respectivas espículas ósseas. Use as pinças anguladas delicadas do frontal, com abertura latero-latera ou antero-posterior;
  • Remova todas as células posteriores do recesso do frontal, incluindo a porção alta da BE e das células suprabulares/supraorbitárias/frontobular quando presentes (checar minuciosamente sua presença na tomografia).

DICA: O movimento de sondagem do frontal deve ser de medial para lateral, nunca de lateral para medial, pelo risco de lesão da lâmina crivosa;

CUIDADO: Faça movimentos delicados, evitando forçar na região medial da concha média, local comumente associada à fístula iatrogênica devido à fragilidade da lâmina crivosa;

Preservar a mucosa da VDSF circunferencialmente.

Sinusotomia Draf IIA

Em um Draf IIA, a abertura do SF ocorre após a ressecção de todas as células etmoidais relacionadas ao SF e RF, entre a Concha Média, medialmente, e a Lâmina Papirácea, lateralmente. Isso possibilita a exposição direta da cavidade interna do SF e a remoção de todas as células etmoidais que se projetam para o seio frontal. O teto da célula do agger nasi e da célula suprabular mais superior são ressecados até alcançar um neo-óstio do SF com diâmetro antero-posterior máximo (Com cerca de 6 a 8 mm).

Técnica:

  • Utilizar inicialmente um endoscópio de 0 ° para realizar a uncinectomia;
  • Sempre que possível, preservar a bula intacta neste momento;
Aspecto após uncinectomia, mantendo a Bula Etmoidal Intacta. SN: Septo Nasal; CM: Concha Média; BE: Bula Etmoida (Intacta); LM: Linha Maxilar; CI: Concha inferior.
  • Trocar para um endoscópio de 30/45°;
  • Remover a parede óssea anterior da célula do agger nasi com uma pinça cortante. Atentar para preservar sua parede medial (Barra vertical) neste momento;
Ressecção da Parede anterior do Agger Nasi com Pinça Kerrison. SN: Septo Nasal. CM: Concha Média.
  • Introduzir uma sonda de SF para identificar o OF. Sua abertura geralmente estará localizada posteromedialmente à barra vertical;
  • Em seguida, remover a barra vertical, a parede posterior e o teto da célula do Agger Nasi com uma cureta de 45°. Se houver células frontais presentes, estas poderão ser visualizadas e removidas;
Remoção da Barra Vertical. SN: Septo Nasal. CM: Concha Média. BV: Barra Vertical.
  • O limite posterior da ressecção é a parede anterior da Bula Etmoidal, que neste momento, ainda estará intacta (Técnica da Bula Intacta). Esta técnica protege a artéria etmoidal anterior;
  • Neste momento, se necessário, a parede anterior da Bula etmoidal poderá ser ressecada;
  • Remover as células frontoetmoidais restantes com pinças de corte anguladas, pinças Kerrison, curetas anguladas ou microdebridador. Essa remoção progride até que o OF interno esteja completamente visível sem fragmentos ósseos recobrindo-o;
Remoção das células frontoetmoidais restantes com pinça Kerrison (Visualização com ótica de 70º)
Remoção das células frontoetmoidais restantes com pinça Kerrison (Visualização com ótica de 70º)
  • Atentar para preservar a mucosa e para manter a dissecção anteriormente à parede posterior do SF.
Vídeo de cirurgia cedido gentilmente pelo Dr. João Mangussi Gomes

Sinusectomia Draf IIB

No Draf IIb ocorre a ressecção de todo o assoalho do SF entre a lâmina papirácea e o septo nasal. Para isso é realizada a ressecção da axila e da porção mais ântero-superior da Concha Média.

As indicações do procedimento são doença frontal crônica, como RSC refratária ao manejo tradicional médico e cirúrgico, mucocele e tumores benignos limitados a um lado do SF, com seio contralateral aerado e assintomático

· A parte inicial do procedimento é a realização de um Draf IIa;

· Identificar a localização da artéria etmoidal anterior na base do crânio. Este será o limite posterior da dissecção frontal de cada lado;

· Ressecar a porção anterior da lamela vertical da Concha Média. Usar micro tesoura curva para fazer um corte logo abaixo da fixação anterior na base do e progredir até o nível da artéria etmoidal anterior. Realizar um segundo corte inferior e angulá-lo para encontrar o primeiro corte;

· Remover a cunha ressecada e preservar a porção posterior da CM.

· Progredir a ressecção do assoalho do frontal em direção superior e medial, alcançando como limite medial o septo nasal. Utilizar uma pinça cogumelo de 45 graus ou uma pinça Bachert para realizar a remoção óssea. Se for necessário aumentar o diâmetro do óstio, utilizar broca diamantada para expandir o diâmetro na direção de anterior para medial.

O limite anterior será obtido após a dissecção do bico frontal, realizada com escopro ou broca;

O Draf IIB será concluído após a obtenção da abertura do assoalho do SF até o nível da Concha Média, mantendo o septo nasal íntegro

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Vitor Abraão
Manual de Cirurgia Nasossinusal

Médico pela UnB. Otorrinolaringologista e Mestrando pela USP.