Zoom tenta explicar suposto uso de videochamadas para treinar IA

Rodrigo Ghedin
Manual do Usuário
Published in
3 min readAug 8, 2023
Janela de videochamada do Zoom, com um rapaz de traços orientais, fones de ouvido e camiseta preta em destaque, contra um fundo azul.
Imagem: Zoom/Divulgação.

Uma atualização de março de 2023 nos termos de uso do Zoom, popular aplicativo de videochamadas, colocou a empresa na defensiva nesta segunda (7).

Alguns sites acusaram o Zoom de estar usando dados dos usuários para treinar modelos de inteligência artificial, sem dar a chance de rejeitar a cessão de dados para essa finalidade.

É verdade, mas uma verdade menos maquiavélica do que algumas manchetes levam a crer.

A celeuma está centrada em duas cláusulas:

  • A cláusula 10.2, que prevê que o Zoom pode usar “dados gerados por serviços” para, entre outras coisas, “aprendizado de máquina ou inteligência artificial (inclusive para fins de treinamento e ajuste de algoritmos e modelos)”.
  • E a cláusula 10.4, que prevê que o usuário do Zoom concede uma licença ao Zoom que pode usar seu conteúdo (aí sim: videochamadas, arquivos e mensagens de texto) para, entre outras coisas, “fins de desenvolvimento de produtos e serviços […] aprendizado de máquina, inteligência artificial, treinamento […]”.

“Dados gerados por serviços”, os que são usados de maneira compulsória, são “quaisquer dados de telemetria, dados de uso do produto, dados de diagnóstico e conteúdo ou dados semelhantes”.

Em outras palavras, nada relacionado ao conteúdo do usuário — videochamadas, arquivos ou mensagens de texto — , apenas metadados que, regra geral, empresas comerciais e até algumas não-comerciais usam para aprimorar o serviço, identificar falhas etc.

Os recursos do usuário, previstos na cláusula 10.4, podem ser usados para treinar IAs, mas apenas com o consentimento explícito do usuário.

Ao entrar em uma chamada em que esse uso é possível (ele precisa ser ativado previamente pelo anfitrião ou empresa), um aviso é exibido com a opção de deixar a sala, caso a pessoa não concorde com a cessão de dados para treinar IA.

Smita Hashim, diretora de produtos do Zoom, tentou apagar o incêndio de relações públicas com um post no blog da empresa. Em dois momentos, ambos em negrito para dar ênfase, ela escreveu:

Para IA, não usamos conteúdo de áudio, vídeo ou mensagens para treinar nossos modelos sem o consentimento do cliente.

Uma variação da mensagem também foi adicionada à cláusula 10.4 dos termos de uso, por ora apenas na versão em inglês, nesta segunda (7).

Em março, o Zoom lançou recursos de inteligência artificial que automatizam algumas tarefas típicas em videochamadas, como redação de um resumo da conversa/reunião, sob a marca Zoom IQ.

Desde a surgimento meteórico do ChatGPT, as pessoas aprenderam melhor o funcionamento de modelos de IA e a natureza dessa tecnologia, subproduto de quantidades gigantescas de conteúdo, tão grandes que é quase impossível trabalhar apenas com conjuntos de dados sintéticos.

Perto do que OpenAI, Google e outras fizeram — pegar dados da web aberta e de plataformas como Reddit e Twitter sem nem avisar — , a postura do Zoom me parece menos pior.

E até as piores situações têm um lado bom. A confusão com os termos de uso e IA abafou outra notícia com potencial polêmico ainda maior para o Zoom: a empresa, que cresceu horrores durante a pandemia ao viabilizar o trabalho remoto por videochamadas, vai obrigar todos os funcionários que residam num raio de ~80 km de um dos seus escritórios a trabalharem presencialmente pelo menos dois dias na semana.

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