Desigualdade econômica entre gerações

As gerações atuais são maioria, trabalham mais, estudam mais, produzem mais, entendem mais o mundo, sabem mais sobre finanças, mas mesmo assim são mais pobres que as gerações anteriores.

Bruno Oliveira
Revista Marginália
5 min readOct 14, 2020

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Three Generations Painting (Eugenio Zampighi)

Para este texto vamos adotar as seguintes divisões de gerações: (i) Geração Silenciosa: nascidos entre 1925 e 1945 (hoje possuem mais de 75 anos); (ii) Geração Baby-Boomer: nascidos entre 1946 e 1964 (hoje possuem mais de 56 anos); (iii) Geração X: nascidos entre 1965 e 1980 (hoje possuem mais de 40 anos); (iv) Geração Millennial: nascidos entre 1981 e 1996 (hoje possuem mais de 24 anos); e (v) Geração Pós-Millennial: nascidos a partir de 1997.

Hoje, os Millennials já são maioria na vida econômica. Eles já são mais de um terço (35%) de toda a força de trabalho dos EUA. No Brasil, de acordo com o Itaú BBA, os Millennials (também chamados de Geração Y) são ainda mais presentes e correspondem a 46% da força de trabalho brasileira.

Participação das gerações na força de trabalho nos EUA em 2016 [Artigo]

Entretanto, de acordo com o Federal Reserve (FED), ainda que a participação dos Millennials na vida econômica esteja em franca expansão, a distribuição de riqueza ainda é desproporcional: apenas 4% da riqueza está com os Millennials, contra 25,5% da Geração X e 53,2% dos Baby Boomers.

O que ocorreu ao longo dos anos foi uma vertiginosa transferência de riqueza da Geração Silenciosa majoritariamente para a Geração Baby Boomer, que passou a acumular a riqueza, e minoritariamente para a Geração X, que comeu alguns farelos dela. Para os Millennials, não houve participação nessa distribuição, numa relação inversamente proporcional a sua participação na geração desse montante financeiro.

Dados do FED — Distribuição de riqueza entre as gerações ao longo dos anos

Claro que é esperado que os mais velhos tenham maior participação da riqueza, pois tiveram mais tempo para acumular dinheiro. O que causa incômodo nesses dados é a desproporcionalidade que esse acúmulo ocorre. Há claro acúmulo de capital, e aumento da desigualdade econômica, injusta com a participação de cada geração na criação dessa riqueza. Em 1989, quando os baby boomers tinham mais ou menos a mesma idade que a geração de millennials hoje, eles controlavam 21% da riqueza do país, quase cinco vezes mais do que os millennials possuem hoje.

Nos EUA, enquanto a renda média domiciliar dos millennials são de $40.581 por ano, ela é 20% menor do que a renda média dos baby boomers no mesmo estágio da vida — apesar de terem melhor educação. De acordo com a pesquisa do ItauBBA, os millennials mostram-se mais produtivos e conscientes do que outras gerações em diversos aspectos. Eles preferem as coisas mais rápidas e imediatamente, possuem mais consciência e necessidade social e estão sempre em busca do mundo melhor. Com certeza não vai ser preparo e esforço que vai diminuir a desigualdade econômica entre as gerações.

Atitudes e Comportamentos dos Millennials brasileiros [ItaúBBA]

As gerações anteriores aproveitaram o crescimento econômico que vivenciaram e se preparam para acumular capital, sem se preocupar com a desigualdade social que isso iria causar nas próximas gerações. Falar em meritocracia em uma estrutura que impede a igualdade econômica é desumano. Não importa quanto os millennials, detenham mais conhecimento, sejam mais criativos e produtivos, sejam mais conscientes, estamos em uma estrutura que premia a desigualdade econômica. É cada vez mais difícil, e improvável, ascender no sistema.

Na mídia em geral, temos o costume de ver casos de pobres que estudam por 18h diárias e conseguem entrar na Universidade, ou de trabalhadores que aliam três atividades laborais para trazer o sustento de sua família. Todos esses casos são vendidos como exemplos de sucesso, e pasmem, de meritocracia — Gabriel Costa (Revista Marginália)

E o futuro é ainda mais desanimador. O Fórum Econômico Mundial estima que até 2050, o deficit da previdência global será de R$ 1,5 quatrilhões. O montante é seis vezes maior que o de 2015, de R$ 250 trilhões. Mas a esperança dos economistas parece residir no fato de que os Baby Boomers podem salvar os Millennials. Como a riqueza não some da economia, a longo prazo os pais e avós deixarão as heranças para seus filhos, atuais Millennials, e estes poderão usufruir desta riqueza — tal como estes fizeram as gerações anteriores. Ou seja, a resposta para os problemas financeiros dos Millennials não é a correção de um sistema que perpetua a desigualdade, mas prolongar a desigualdade para as próximas gerações. Não há meritocracia, apenas herança. O modelo de transferência de riqueza intergeracional, no qual a geração millennial se tornaria a geração mais rica por herança, faz sentido apenas para o grupo do 1% mais rico do mundo.

Se pensarmos nos 99% restante, a passagem de gerações pode representar perda de riqueza, inclusive. Em reportagem do Estadão, é apresentado diversas histórias de famílias que contavam com a renda/aposentadoria dos mais velhos, que ao morrerem, deixou a renda familiar significativa mais baixa, e a família passou a ter necessidades. Segundo o estudo, 35% dos domicílios brasileiros possui ao menos um idoso e em 18,1% eles eram os únicos provedores da família. Para esta parcela da população, quando morre um idoso, a família inteira ingressa na pobreza — até porque boa parte das rendas dos idosos advém de pensões ou aposentadoria (62,5%)que não são transmitidas através de herança. Por isso pandemias como a que vivemos hoje que afetam diretamente os mais velhos só nos leva cada vez mais a desigualdade econômica.

Referências:

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Bruno Oliveira
Revista Marginália

Auditor, escritor, leitor e flanador. Mestrando em TI, tropecei na bolsa de valores. Acredito nas estrelas, não nos astros. Resenho pessoas e o tempo presente.