Quarentena

Maria Anna Leal Martins
Maria Anna Martins
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3 min readJul 18, 2020
Foto de Samanta Gades no Unsplash

Escuto falar que na casa de Deus e o mundo, a quarentena está sendo um momento para fazer coisas diferentes, ter tempo para cursos, para fazer exercícios, se conhecer…

Hum! sei…

Tem gente que mora sozinha, eu não. Tenho três filhos, um marido e dois cachorros. Trabalho como professora de ensino médio enquanto faço meu mestrado e, por isso, nos dias normais, contrataria uma faxineira para dar uma geral aqui em casa, pelo menos três vezes na semana. Hoje não posso mais, óbvio, visto que não quero colocar ninguém em risco. Estou pagando o salário dela sim, mesmo sem vir aqui, porque sei que as pessoas precisam de dinheiro para aguentar esse período em casa.

Mas minhas contas não sumiram e as aulas agora são online: é preciso preparar, gravar, enquanto escuto cachorro latindo, criança correndo e a música alta do vizinho.

Meu marido faz trabalho essencial, então não ficou isolado. Logo, é preciso ter cuidado redobrado quando ele chega: tirar a roupa no quintal e ir direto ao banho, evitando tocar nas coisas.

Estou enlouquecendo.

Não dá, realmente, com as crianças em casa todo o tempo, a atenção precisa ser em dobro, a sujeira é em dobro e com certeza o trabalho é em dobro.

Para você ter uma ideia, meu dia começa assim: às oito horas eu estou de pé, escovando os dentes, tomando banho e me preparando para ir fazer o café; às dez horas as crianças levantam e preciso fazê-las comer. Não o mais velho de 16 anos, mas os dois mais novos com certeza. Depois eu limpo tudo, varro a casa, passo pano, ajeito as coisas, só para ver as crianças desarrumando de novo; às onze horas tenho que fazer o almoço e ao meio-dia sirvo. Ai vem o momento em que sento no computador e de lá não saio até ter terminado de preparar e ministrar as aulas.

MINTO, na verdade, eu preciso parar para fazer as crianças assistirem as aulas deles e realizarem as tarefas.

Às vinte horas, quando posso, finalmente, eu descanso: janto vendo a TV, já sonhando com a cama. Peço ajuda ao mais velho para preparar os irmãos para dormir.

Depois que todos pregam os olhos, por voltas das 22h, começo a estudar para o mestrado. Encerro em torno de uma hora da manhã.

Nisso, claro, o maridão chegou, exausto. Tomou banho, foi para a cama e tudo que queria era um colo meu. Me esforço, tento ficar com ele e quando não consigo recebo um rosto mal humorado.

Eu não senti nem cheiro desse tempo extra aí que dizem na TV. Ele voou entre a ansiedade e a faxina. O que parece é que estou num caso duplo com o computador e a vassoura.

A coluna dói, a cabeça parece que vai explodir.

O meu filho mais velho até que ajuda na arrumação, mas… vamos ser honestos? Só quando está disposto ou quando peço diretamente. Ele também está com as aulas online e agora que já está chegando a semana de provas…

A casa fica de cabeça para baixo com uma frequência absurda.

Estou cansada. Estou cansada mentalmente e fisicamente. Nunca o relógio demorou tanto e foi tão rápido ao mesmo tempo. Na verdade, não há tempo: é uma roda viva. Tudo que quero, agora, é o travesseiro e deixar meus “amantes” em espera pela manhã seguinte.

Acho que quem está “se descobrindo” e tendo “tempo extra” ou vive em outro mundo ou não é mãe e trabalha, sem muita ajuda em casa. Mas vamos vivendo, né?

Vamos vivendo…

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