Bilhete à Clarice
Prezada,
Inicio com uma pergunta:
e há [Ré — mel — Dios] coisa qualquer
nessas nossas alegorias letradas?
Existir dói. Escrever comprime o peito;
silenciar mais,
e eu estou num instante de sufoco –
perplexo, inerte, (co)movente!
Lê direito: a bula, a chave mestra,
o tratado hermético disposto por ti,
que esteve tão perto de nossa selvageria
e anteviu a sina de nunca chegar às estrelas.
Você deixou o universo num ovo –
o antídoto…
Vê. É lispectorante!
Agora, respira, engole as palavras…
(Super) Existe. Come.
O gozo, o vaticínio ou a epifania.
Das coisas que aprendi a devorar contigo,
irei vomitar as vogais e as consoantes
com meu sopro atônito diante da vida,
com a alegria clandestina, a cidade
ou com a tristeza crucial do corpo
numa descoberta convulsionante de mundo.
Vê. Você avisou. Eu aviso. É lispectorante!
Xaropada!
Macera e bota em efusão — o medo, a vida.
Clara e se…
A química dissesse a verdade:
a água viva na pleura,
a paixão segundo a tenho,
o destino macabeu, enfim…
Que toda a angústia passa em três doses…
Então, tomo a liberdade e digo:
melhor percorrer um livro
quando inseto e incerto nos perturbam!
Puxar o fôlego e partir rumo a outra lufada,
não para se ter a cura — você não desejou a cura,
mas a náusea! Porque apesar de tudo,
eu sou neuma e doce…