Voando alto com Adriana Ferreira

Tiago Alcantara
Marie Curie News
Published in
8 min readNov 30, 2018

A fantástica história da Gerente de Diversidade & Inclusão Latam da IBM

Quem é?

  • Adriana Ferreira;
  • 49 anos;
  • Formada em Gestão de Recursos Humanos, com pós graduação em Psicologia Organizacional e do Trabalho;
  • Bacharel em Musicoterapia;
  • Foi comissária de bordo por 16 anos;
  • Gerente de Diversidade & Inclusão da América Latina na IBM;
  • Recebeu o Prêmio Empregue Afro pela Valorização da Igualdade Racial em 2015;

Até os 38 anos, a vida de Adriana Ferreira era uma viagem. E não estamos falando no sentido figurado. Com mais de 16 anos de carreira na companhia aérea Varig, ela sabe de cor o caminho entre São Paulo e o Aeroporto Internacional de Guarulhos. Segundo seus cálculos — por mais que seja improvável calcular algo que se faz durante tanto tempo — fez mais do que 500 idas e vindas entre a cidade e o principal destino de transporte aéreo do país. Numa instalação que movimenta, em média, 250 mil pessoas todos os dias, Ferreira e seus colegas de tripulação eram as presenças constantes pelos portões e esteiras do aeroporto.

Foram 11 anos como comissária de bordo. Some a esses, mais 5 anos como instrutora, treinando as pessoas para tornarem as viagens, breves ou longas, mais agradáveis para todo tipo de passageiro. Na época, ela nem tinha ideia do quanto essa experiência a ajudaria no futuro.

Depois de tanto tempo de casa, tendo passado por várias posições, é de se imaginar que a carreira profissional de Adriana estaria prestes a decolar. E realmente estava, mas ela precisaria fazer um pouso forçado e algumas conexões antes.

O fato é que a Varig faliu. Só que a queda, iniciada ainda na década de 90, aconteceu em câmera lenta. Com os atrasos de salários, a insegurança entre os funcionários só crescia e Ferreira não ficou de fora.

Depois de tantos anos em uma companhia, a recolocação do mercado de trabalho veio de um jeito inusitado. Foi numa revista, dessas que você compra em frente aos portões de embarque para passar o tempo, que comissária de bordo encontrou o seu próximo vôo: a centenária empresa de tecnologia IBM.

“Foi um abismo entre sair [da Varig] e procurar outro emprego. Eu li a revista 150 Melhores Empresas para Trabalhar. Nela, a IBM estava entre umas das primeiras. O título era algo como ‘Aqui você pode ser quem você é’. Eu achei estranho porque, na aviação, a questão de diversidade, ser autêntico, não é um problema — lidamos com isso o tempo todo”.

Nesse exato momento, a bacharel em Musicologia se deu conta de que o trabalho em uma corporação, num escritório mesmo, poderia trazer desafios. Ah, a gente não comentou a formação de Ferreira. Bem, com essa informação, pensamos em duas perguntas:

  1. Como raios alguém com esse histórico acadêmico/profissional vira estagiária no RH de uma empresa de tecnologia?
  2. Qual a rota até se tornar gerente de Diversidade & Inclusão?

A futura líder da IBM resolveu aplicar para uma posição de estagiária. Conseguiu o posto, mas passou por um período difícil para se adaptar à nova realidade. Seu salário era cinco vezes menor. E esse nem foi o maior obstáculo. Ela teve de adequar a forma como se vestia e se relacionava com as pessoas dentro da companhia de tecnologia. Por outro lado, a maturidade criou oportunidades para que ela pudesse se posicionar frente a outros líderes e até assumir responsabilidades incomuns para um estagiário.

“Busquei me capacitar quando percebi que estava difícil. Claro que ouvi muitas críticas sobre entrar num programa de estágio, ganhar tão pouco, competir com gente mais jovem tão melhor.”

A experiência anterior na companhia aérea, sua formação pouco usual e um senso de liderança abriram espaço para que ela fosse efetivada e, posteriormente, trabalhasse na ouvidoria da empresa. Nessa fase, ela tratava diretamente com as pessoas sobre as necessidades e os processos internos que poderiam ser mudados.

“As pessoas entram em contato com esse canal para falar sobre o que não está funcionando, sobre casos de assédio e discriminação. Foi muito importante porque pude entender melhor o negócio e os funcionários, as dificuldades que eles tinham. Também tive muito contato com colaboradores e lideranças — pude negociar com gerentes de projeto, gerentes de pessoas.”

Após essa experiência, Ferreira se voluntariou para ser líder da comunidade LGBT da corporação. E foi aí que sua carreira mudou de itinerário para tratar de temas como diversidade e inclusão. Antes, algumas coisas que você precisa saber sobre a International Business Machines, mais conhecida como IBM.

Foi assim que a IBM convidou a gerente para ser líder de divisão no Brasil. No lugar de atuar como voluntária, passou a coordenar a área de Inclusão e Diversidade da empresa. Ela indica que, basicamente, trabalha com 4 cenários para tentar mudar a vida de seus colaboradores:

1. Inclusão e desenvolvimento de portadores de necessidades especiais;

2. Trabalho para inclusão de mulheres no mundo de tecnologia;

3. Atendimento à comunidade LGBT e defesa de seus direitos;

4. Afrodescendentes e equidade racial.

Além destes pilares, existem outras atividades relacionadas ao equilíbrio entre vida e trabalho, como a revisão dos dias de licença paternidade. Como líder para a América Latina, é parte de seu trabalho observar as práticas de cada país e criar o conjunto perfeito de iniciativas para a região. Com um mercado cada dia mais competitivo, é natural que as empresas passem a oferecer benefícios para ter os melhores profissionais: vale refeição mais alto, academia, piscina de bolinhas. No entanto, a executiva descobriu que poderia ir além, caso realmente ouvisse os funcionários.

“O que conta mesmo é como essa pessoa se sente quando ela sai de casa para o trabalho. Tudo o que conta é como aquele gerente se relaciona com você: ‘as ideias que eu levo são consideradas, têm valor, as pessoas estão me ouvindo? Como medir com números algo que é subjetivo para as pessoas? Como eu meço a felicidade no trabalho? Como eu meço o quanto um feedback me ajudou?’”

E foi numa dessas conversas que outro benefício foi conquistado por seu time: um subsídio de 75% do valor de medicamentos que seus funcionários transsexuais precisam tomar. A ideia surgiu quando Adriana se encontrou com um grupo de funcionários que estava em processo de transição. O objetivo dessa política é fazer com que todos se sintam incluídos. O desconto, provavelmente, não seria sugerido em uma reunião que levasse em conta apenas a maioria dos executivos da companhia, conta.

“Os líderes que deveriam pensar nisso não são pessoas que conviveram com minorias (no trabalho). Viveram fora ou já vem de fora, de grandes faculdades, não é que eles não tenham passado por adversidades, mas o fato é que boa parte deles nunca estudou com uma pessoa com deficiência ou teve amigos negros como colega de escola”.

1) Como a IBM aborda a questão de gênero? A companhia tem uma CEO e 24% de executivas é de mulheres globalmente. Como fazer essa conta chegar nos 50%?

“ A gente não tem essa meta porque seria colocar um objetivo, mesmo que fosse para 2030, acho muito difícil pela própria escassez hoje. Eu dei palestras em faculdades e é absurdo o número de mulheres (às vezes, 4 numa sala de 60 alunos de engenharia), então não dá pra ser assim. Uma das formas [de chegar nos 50%] é ter uma voz ativa. Mulheres sentem que não são ouvidas em ambientes masculinos e masculinizantes, nos quais elas sentem que precisam ter um tom mais severo.Então, a princípio, existem metas de crescimento ano a ano: a gente recebe globais que são acompanhadas uma vez por trimestre. E mensuram a evolução no número de mulheres total e os cargos de gerência e executivo. O avanço desses números depende de 1) conseguir atrair mulheres no mercado e 2) conseguir elevar as que estão aqui dentro. Desenhamos alguns programas de desenvolvimento com foco em mulheres talentosas.

Outra coisa importante: temos um grupo de mulheres (da mesma forma que de LGBT). Essas mulheres se unem para falar de coisas que estão relacionadas com o dia a dia, como licença maternidade, por exemplo. Um trabalho mais recente nosso é o fomento ao interesse em tecnologia nas meninas no ensino médio ou que acabaram de ingressar na faculdade.”

2) Quando se fala em diversidade, um dos discursos mais comuns é pregar que Mas, diz aí, Adriana. Diversidade gera inovação?

“ Diversidade por si só não inova. Existem outros fatores que, juntos, podem nos levar até a inovação que a gente tanto espera. Que não é necessariamente uma inovação tecnológica, mas que é uma inovação de novas ideias. Novas formas de pensar. Novas maneiras de ser. Novos modelos de família.”

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