Os impactos do prorrogação da LGPD

Éber Gustavo
MarkeTHINKers
4 min readMay 6, 2020

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Foto de Kaique Rocha no Pexels

No dia 29 de abril de 2020 foi publicado no Diário Oficial da União a Medida Provisória 959 que adia a entrada em vigor da Lei no 13.709, de 14 de agosto de 2018, Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), para o início de Maio de 2021.

A medida teve como preocupação não punir as empresas que ainda não se adaptaram para atender as exigências previstas na lei devido a situação pandêmica e de quarentena que teve início em Março.

No entanto, várias empresas brasileiras não estão considerando a lei com a devida criticidade.

Em Agosto de 2019, a Serasa Experian publicou o resultado da pesquisa que foi realizada em março do mesmo ano e que entrevistou executivos (Gerentes, Diretores e C-level) de 508 empresas de 18 ramos de atividades. O resultado é preocupantes: 85% das empresas brasileiras declaram que ainda não estão preparadas para atender as exigências da LGPD.

“Segundo pesquisa da Serasa Experian, 85% das empresas brasileiras afirmaram que ainda não estão preparadas para garantir os direitos e deveres em relação ao tratamento de dados pessoais exigidos pela Lei de Proteção de Dados Pessoais (LGPD)…”

Para as empresas que não se adaptaram pode ser um momento de alívio para reconsiderarem e iniciarem as atividades de adequação. Porém, a nação brasileira sofrerá com o atraso da prorrogação da lei — trataremos deste assunto mais adiante.

Vale lembrar que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) ainda não foi devidamente estabelecida e pronta para iniciar suas atividades. A ANPD é a entidade responsável por estruturar as normas que definirão as regras para a adequação da lei e punição das empresas que não estiverem de acordo.

A importância da lei

A lei tem grande importância e, conforme descrito na nota técnica do Ministério Público Federal (MPF), “garante a proteção de dados pessoais, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas.”

Isto quer dizer que a lei define como que o poder público e privado tratarão os dados dos cidadãos brasileiros e estrangeiros residentes no país.

A lei define a governança de quais dados poderão ser capturados, tratados, como serão utilizados, se há consentimento para usá-los e sua finalidade de acordo com a natureza jurídica de cada entidade.

A falta de governança sobre o tratamento dos dados capturados gera insegurança jurídica e impede o compartilhamento de informações importantes como, por exemplo, no tratamento da doença covid-19 entre países que estão com pesquisas científicas avançadas e que exigem transparência e garantias de como os dados partilhados são utilizados.

Outra preocupação é o controle das tecnologias que capturam informações de maneira passiva, ou seja, sem a percepção e/ou consentimento de seus usuários. Hoje em dia é possível facilmente capturar a geolocalização (na abertura de e-mails e através do uso de aplicativos), comportamentos de navegações em sites, audios diversos (aplicativos, telefonemas, comandos para assistentes virtuais, por exemplo), vídeos assistidos, informações digitadas nos campos de pesquisa de buscadores entre muitas outras tecnologias e canais de comunicação.

O uso da Inteligência Artificial possibilita a análise das informações capturadas de maneira passiva para inferir perfis de comportamentos de consumo, informações demográficas e prever comportamentos futuros — gerando compras por impulso, mudanças de comportamentos e até mudanças de opiniões.

Impactos

Ao postergar a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoas (LGPD) o Brasil atrasa ainda mais a garantia da privacidade de dados dos cidadãos brasileiros e fecha as portas para relações comerciais internacionais.

Os impactos são grandes que vão da proteção de dados pessoais garantidos na Constituição, relações comerciais e até o compartilhamento seguro de informações sanitárias entre países.

O uso das informações dos cidadãos (que são consumidores) é feito de maneira irrestrita hoje. Este é mercado multibilionário com impactos imensuráveis na sociedade.

A lei impede, por exemplo, que empresas manipulem dados com o objetivo de experimentos sociais — testes psicológicos ou sociológicos para avaliar como as pessoas reagem a determinadas situações. Em 2012, por exemplo, o Facebook manipulou o algoritmo de seu feed de notícia para avaliar o impacto emocional de 700 mil usuários.

Outro exemplo é evitar a venda de dados pessoais entre empresas como ocorreu nos Estados Unidos quando a Google comprou dados da Mastercard de milhões de americanos para associar o comportamento de compras em lojas físicas com anúncios digitais.

Estes não são casos isolados. Soma-se a isso as vendas abusivas, manipulação de votos, priorização de conteúdos com objetivos escusos, desvantagens competitivas entre outros usos arbitrários.

Sem a devida segurança jurídica, os governos e empresas sofrerão para desenvolver relações com outras instituições internacioanais. A lei não é uma opção, é uma obrigação a ser cumprida o quanto antes para evitarmos impactos em nossa economia.

O interessante é que quando analisamos os países que têm uma lei em vigor que protege os dados pessoais e privados observamos que eles tiveram maior engajamento com os consumidores. Isto quer dizer que os consumidores se sentiram confortáveis de compartilhar seus dados e interagiram mais com as marcas de seu interesse.

Então podemos concluir que a aplicação da lei é benéfica para todos os envolvidos:

  • Deixa os cidadãos tranquilos sobre os dados que estão sendo capturados e garante que seus eles estão sendo usados de maneira correta;
  • Evita uso abusivo das informações dos cidadãos pelos governos;
  • Inibe que empresas realizem ações abusivas e arbitrárias.

O dono dos dados pessoais

Vamos relembrar que o dono dos dados pessoais é o cidadão ou consumidor. Nenhuma empresa ou governo é dono de dados dos consumidores. A lei reforça esta verdade constitucional e empodera cada cidadão na maneira como suas informações serão tratadas.

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Éber Gustavo
MarkeTHINKers

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