Pinóquio, o rei do marketing

Juliano Rigatti
Content Marketing
Published in
3 min readDec 26, 2014

Por Fernando Diniz, head de estratégia e conteúdo da Fbiz. Originalmente publicado em www.meioemensagem.com.br em 19/12/2014.

Se parte do nosso trabalho é temperar a realidade para deixá-la mais saborosa, em que medida se perde a mão a ponto de essa pitada de fantasia se tornar uma mentira? E qual o preço da mentira em uma estratégia de negócios?

Venho abordando há algum tempo esse tema, tanto em artigos para o Meio & Mensagem — por exemplo, “Somos fúteis” e “Bem-vindos à era do marketing da frustração”quanto na própria ESPM, onde leciono em um curso de especialização em estratégia. Penso que nós, marqueteiros e publicitários, estamos nos tornando Pinóquios frívolos.

Cada vez mais, na ansiedade de vender a qualquer custo, usa-se toda a sorte de inverdades na composição de estratégias e discursos. Como é o caso das histórias fictícias de Diletto e Suco do Bem que, apesar de muito atraentes, foram recentemente o foco desse debate. Li em um jornal que a justificativa era a criação de uma história lúdica para a marca. Para mim, ainda é uma mentira. Porque, como dizia Mário Quintana, “a mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer”.

Empresas que adotam um discurso falso para aumentar a sua atratividade ignoram a atual expectativa que os brasileiros têm sobre o papel das marcas. E essa mudança apresenta um enorme impacto na maneira como fazemos marketing e comunicação.

Mais valioso que debater os limites da mentira é refletir sobre o poder do uso da verdade. Esta traz valores em que se apoia a companhia e é capaz de gerar uma visão pela qual a marca é construída ou, como crença, tem o poder de inspirar e criar uma identidade entre as pessoas e a marca. Talvez o maior exemplo de marca ocidental que seguiu esse princípio seja os Estados Unidos. Fundada sobre os preceitos da democracia, da liberdade e da igualdade de oportunidades, os EUA até pode sofrer hoje com a distorção e a perda de seus valores fundamentais, mas é justamente apoiando-se neles que se procura retomar o caminho traçado por seus precursores.

Por esse motivo, nunca vi sentido em sintetizar uma mentira, sobretudo porque a verdade é um recurso natural capaz de tornar qualquer estratégia forte e consistente. Ainda que o uso da ficção absoluta pareça dar resultado mais rapidamente (e tenho minhas dúvidas sobre isso também), o ROI da construção de uma verdade é muito maior.

E não são poucas as verdades disponíveis como insumo ao nosso redor: elas vêm da companhia/marca, do mercado, do produto e da própria cultura do consumidor. Basta identificá-las e decodificá-las para se ter um elemento poderoso em mãos.

Elaborar uma verdade cria estruturas perenes e mais profundas. Uma vez que se tem clareza sobre elas, as verdades funcionam como uma enzima que permeia toda a cultura da empresa, orientando decisões, o relacionamento com os clientes, o desenvolvimento de produtos e serviços, o posicionamento da marca e a comunicação, por exemplo.

Obviamente, não trato aqui da verdade nua e crua, daquela desprovida de charme ou pouco atraente. Afinal, fazemos propaganda, somos artesãos de sonhos. A verdade pode ser bela e sedutora e ainda assim ser uma verdade. Enfim, sejamos honestos, quem aqui prefere transar com todas as luzes acesas?

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