Uma carta aos Sementeiros

Isadora Martins
Masters of Learning
5 min readDec 20, 2020

Durante o segundo semestre de 2020 (esse ano com "sensação térmica" de três), recebi um presente de maravilhamento: o convite para ser tutora de uma comunidade de aprendizagem autodirigida, o Masters of Learning, idealizado e conduzido pelas mãos cuidadosas do Alex Bretas. Essa carta é minha apreciação a todes que participaram do grupo da minha tutoria, os Sementeiros.

Todas as imagens dessa carta são do trabalho delicado da Clarice Borian

A quem faz parte dessa floresta, muito obrigada!

Tarik, Ludo, Farah, Rosa, Bel, Marina, Paula, Maria, Malu, Pri, Polly, Garjan, Sophia e Sophia, Regina, Rai, Renata, Sanket, Taísa, Mirella, Murilo, Maria Eduarda, Nathalie, Mozo, Paulo e Paulo, Patrizia.

Obrigada a quem, pela força do destino da escolha alfabética de Alex Bretas, chegou nesse grupo que se auto intitulou de Sementeiros.

Sinto que não poderíamos ter escolhido nome mais apropriado. De fato, éramos sementes quando nos encontramos pela primeira vez — sementes de horizonte. Nessa comunidade, aqui e no MoL, encontramos berço, terra, ar, água, sol. Germinamos — cada um em seu próprio tempo, com suas próprias cores, ganhando raiz e céu a cada movimento de aprendizagem.

Outro dia escutei de um amigo querido, o Tarik Fraig, que a melhor gratidão é aquela que vem crua, sem florear ou pensar demais. Ao longo dessa semana, imaginei diversas vezes o que iria apresentar a vocês. O que nasceu é simples, nasceu porque tinha que nascer: uma carta, apenas uma carta.

Minha entrega a vocês é a minha gratidão.

Quero fazer uma confissão: eu aceitei esse convite do Alex sem saber muito bem o que esperar — e não sem antes hesitar um bocado. Nunca tinha trabalhado com isso e sentia-me um tanto insegura em “ser tutora”. Afinal, o que raios é ser tutora?

Isso eu aprendi em relação, junto com vocês. Esse foi o aprendizado mais precioso que eu encontrei nesse ano de tanta incerteza e tristeza coletiva. Como diz o Gustavo Gitti: "nós fazemos as relações e as relações nos fazem".

Aprendi que ser tutora é ser apoio. É ser alguém que se interessa pelos seus movimentos de aprendizagem, que te escuta para que você se escute. Aprendi que, mais do que oferecer respostas, o que eu podia mesmo oferecer era minha amizade. Isso eu sempre soube ser: amiga. E como tal, encorajar, impulsionar e dizer:

- vá, caminha, confia no teu próprio pé! Caminha um passo por vez no ritmo do teu pulso!

- Brinque, se experimente! O chão se faz enquanto você pisa.

- Não tenha medo de errar o passo, essa é a sua coreografia. Eu estou aqui para celebrar essa dança só sua, tão sua!

Aprendi que ser tutora é ser testemunha. Quando percebi isso me senti a mais afortunada das criaturas! Que alegria tivemos todos de testemunhar uns aos outros. Contemplar os movimentos de cada um, observar cada salto, cada descoberta, cada tropeço e cada pirueta. Aprendi que ser tutora é ver o outro em seu desabrochar e amar cada instante — sem nunca, contudo, querer congelá-lo ou capturá-lo.

Aprendi que ser tutora é estar disposta e estar disponível, sem esquecer dos meus limites. Que atenção é um ato de amor, mas atenção em demasia é o contrário disso. E que amor tem muito a ver com fluir com a vida e com enxergar o outro como um legítimo outro.

Aprendi que ser tutora é ser tutorada também. É troca. É aprender junto. É pisar o mesmo chão. É dizer, às vezes: “não sei, vamos descobrir?”. É receber alguém na sua casa (que na pandemia se tornou nossos encontros de terça e sábado) e oferecer café e bolo. É também pedir ajuda. É não achar que o outro precisa de você. É fazer-se desnecessária. É cuidar — por amor e não por dever. É fazê-lo com a paciência e a consistência de um jardineiro.

Vocês foram meus tutores tanto quanto eu fui de vocês. Nesse nosso pequeno mundo, nosso molzinho, nossa floresta, suas descobertas foram minhas — e vice-versa. Foi na relação com vocês que eu me descobri facilitadora de comunidades de aprendizagem; que eu redescobri o quanto amo e necessito escrever; foi com vocês que eu me apropriei do fato de que, sim, sou educadora (todos somos!). Vocês foram mercadores dos meus sonhos. Hoje meus sonhos já não habitam apenas o futuro. Percebo, com leveza, que o sonho não morre, mesmo quando deixa de ser apenas ideia para se tornar…vida.

Obrigada pela amizade, meus queridos! Outro dia escutei que as pessoas buscam uma comunidade pelo propósito, mas permanecem por conta dos afetos que encontram. Sinto que isso é muito verdadeiro.

Quem diria que, em meio a uma pandemia, que nos impede de sair de casa sem sentir medo, sem usar uma máscara que comprime nosso rosto, que esconde nosso sorriso e abafa nossa voz, quem diria que experimentaríamos a abundância de uma comunidade?

Quem diria que faríamos amigos, nos encantaríamos de novo por uma expressão, um gesto, uma presença que atravessa a tela do computador para arrebatar nossas almas?

Quem diria que, cada um num canto do Brasil ou da Nova Zelândia, iríamos pisar e dançar no mesmo chão de confiança, de pertencimento, de investigação e de emoção?

Quem diria que, confinados nas fronteiras de nossos lares, nos arriscaríamos a ser cada vez mais livres?

Que privilégio nos encontrarmos! Que privilégio fazermos amigos num ano tão difícil! Que privilégio.

A amizade é uma comunidade.

A amizade é a comunidade.

Com todo meu amor,

Isa

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Isadora Martins
Masters of Learning

Educadora, jornalista, jardineira de comunidades de aprendizagem autodirigida. Escrevo para continuar nascendo.