Instituições

Sobre a definição e as principais constatações tiradas da literatura econômica e social.

Mateus Bernardino
Economia e Filosofia
7 min readDec 12, 2018

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(Publicado em Outubro 2012)

Em uma perspectiva puramente jurídica, o conceito “instituição” privilegiaria vantajosamente uma referência ao quadro de leis e o conjunto dos organismos e fundações políticas em determinado regime governamental. Reagrupam-se aqui, então, os órgãos políticos, associativos, legislativos, administrativos, judiciários e até mesmo os cargos do poder público.

Para a sociologia, o termo instituição designa toda estrutura social ou sistema de relações sociais dotado de estabilidade temporal. Uma perspectiva mais sociológica do conceito estenderia a definição para todas as estruturas sociais materiais e imateriais que guardam caráter estável, como a família, a igreja, o matrimónio, ou mesmo, um diploma do sistema educativo.

Essa dimensão essencialmente humana se mantém no entendimento econômico do conceito.

Os economistas designam a instituição como uma estrutura de origem legal ou costumeira tendo por conteúdo um conjunto de normas objetivando a organização das relações sociais, da sociedade ou do Estado. A instituição reagrupa o conjunto de regras formais (de jure) e informais (de facto) governando as interações sociais e os comportamentos individuais.

De um ponto de vista puramente económico, as instituições concentrariam o conjunto de regras regendo as relações produtivas, desde o regime de propriedade até as cláusulas normalizando os contratos entre os agentes em uma cadeia de produção, passando pela moeda, meios de pagamento, normas trabalhistas ou salário mínimo, por exemplo.

Em qualquer perspectiva de abordagem as instituições transmitem essencialmente um conjunto de normas de conduta estruturando as interações humana. São regras que limitam em determinada escala o leque de comportamentos, decisões e ações individuais possíveis ou viáveis.

A própria economia é um processo institucionalizado, e uma série de autores e famílias teóricas compartilha essa tese de que as instituições são fundamentais para o estudo económico.

A Economia Institucional reagrupa todo o conjunto de teorias, escolas, e autores que consideram fundamental o estudo das instituições para compreender e analisar o desenvolvimento dos fenómenos econômicos.

Oliver Williamson

Famílias Teóricas e Importância das Instituições

A título introdutório, e para fins de apresentação, é possível organizar em três grandes famílias institucionalistas as escolas de autores que se interessaram e se debruçaram sobre a importância das instituições económicas e uma abordagem institucional da economia.

O primeiro grande grupo englobaria os pioneiros, ou seja, os autores tendo aberto as portas para uma abordagem institucional da evolução dos fenómenos econômicos. Faz-se referência aos trabalhos de Gustav Von Schmoller (1838–1917) e autores do institucionalismo americano, nomes como Thorstein Veblen (1857–1929), Walton Hamilton (1881–1958) e John Roger Commons (1862–1945).

O segundo grupo de autores é aquele da Escola Austríaca de Economia, que destaca principalmente os trabalhos de Carl Menger (1840–1921) e Friedrich Von Hayek (1899–1992), que fizeram consideráveis contribuições sobre a origem e a importância das instituições para o estudo e compreensão dos fenómenos econômicos.

O terceiro grupo de autores é o da Nova Economia Institucional, que inclui principalmente os trabalhos de Oliver Williamson, Douglas North e Masahiro Aoki. Nessa fase de renascimento das instituições encontramos ainda dos desenvolvimentos da Economia das Convenções, ou ainda, os estudos da Escola da Teoria da Regulação, de tradição marxista.

É crucial ressaltar que as interrogações levantadas pela análise econômica não podem fazer abstração da importância e influência das instituições sociais. Trabalhos recentes de economistas como Daron Acemoglu (2005), Edward Glaeser (2004) e Janine Aron (2000) procuraram demonstrar a importância dos arranjos institucionais e da 'qualidade’ das instituições para compreensão do desenvolvimento económico.

Um bom número de estudos se focaliza também nas diferenças institucionais para procurar compreender as diferenças socioeconômicas entre os países, os modelos de desenvolvimento, ou ainda, para analisar a relação e a dinâmica das mudanças institucionais e económicas (Amable 2005; Hall et Solskice 2001).

Como gostam de realçar alguns institucionalistas, as condições geográficas, os recursos naturais, o clima, o capital humano e material, ou a cultura não seriam fatores suficientes para entender a evolução dos processos de desenvolvimento e enriquecimento das nações, como foi demonstrado historicamente no caso das duas Coréias e das duas Alemanhas (do leste do oeste).

Elementos puramente institucionais ajudam a compreender e determinam a evolução dos eventos econômicos, esses aspectos estariam inclusive entre os mais relevantes. A responsabilidade individual, o respeito aos direitos de propriedade e a liberdade contratual seriam vetores fundamentais para o desenvolvimento e os verdadeiros fatores determinantes para o progresso económico, independentemente do clima, traços culturais ou populacionais de um país.

Friedrich Hayek

Instituições e Liberdade Económica

Estudos portando sobre nível de liberdade económica e a facilidade de realização de negócios corroboram a direção apontada pelos institucionalistas, mostrando que os aspectos institucionais devem não somente incorporar em estudos econômicos mas também servem de referência para a compressão do subdesenvolvimento.

Ilustrativamente, se uma determinada região, por motivos costumeiros fundamentados na crença popular ou na ação de grupos de pressão, institui um salário mínimo como norma social, digamos à níveis severamente elevados, as escolhas organizacionais e produtivas serão diretamente influenciadas.

Se numa região os direitos de propriedade são parcialmente respeitados, se o comércio internacional é restringido por normas fiscais ou regulamentárias, se as próprias normas fiscais representam custos insuperáveis à inciativa privada, se as profissões, setores de atividade e inciativas produtivas são consideravelmente sufocadas pelos poderes públicos, se é instituído no país um importante sistema redistributivo para financiar serviços públicos, se as normas penais são demasiadamente complacentes com a corrupção, e etc., todas as escolhas contratuais e ações produtivas serão diretamente influenciadas.

Indo mais além, e para o que diz respeito às instituições informais ou não inscritas nos códigos legais, se numa sociedade os costumes pregam que as mulheres devem se concentrar exclusivamente aos afazeres domésticos — não podendo comerciar, dirigir ou empreender –, ou se o consumo de apenas algumas drogas é socialmente tolerado, encontraremos igualmente repercussões sobre a atividade econômica, ilustrativamente.

As instituições apresentam um carácter delimitador, associado ao próprio conceito de regra e norma de conduta enquadrando os hábitos e a ação humana. Elas são um fator chave para a compreensão das escolhas organizacionais e segurança dos contratos privados. As mudanças institucionais influenciam diretamente os modos de governança e por consequência a arbitragem entre os diferentes esquemas de produção e de contractualização.

As normas de conduta dizem o que os indivíduos podem e não podem fazer legalmente, elas transmitem também os ideais e os valores morais de um grupo de indivíduos ou mesmo da própria sociedade.

Douglas North (1991, p.2) sublinhou justamente que o carácter delimitador das instituições tem importância na redução dos níveis de risco e incerteza atrelados ao ambiente e ao comportamento dos indivíduos na esfera produtiva, comercial ou associativa.

Esse elemento de gestão dos riscos intrínseco às instituições seria provedor de toda estrutura de incentivos necessária ao bom funcionamento das relações de mercado e desenvolvimento económico.

“Instituições são restrições aplicadas à conduta humana. Elas estruturam as interações políticas, econômicas e sociais. As restrições podem ser informais (sanções, tabus, costumes, tradições, e códigos de conduta), ou formais (constituições, leis, direitos de propriedade).

Ao longo da história, instituições foram impostas aos seres humanos para criar ordem e reduzir as incertezas associadas às trocas. Junto às restrições econômicas naturais impostas pelo ambiente, as instituições definem (e limitam) o leque de escolhas, elas determinam os custos de transação, custos de produção, o nível de realizabilidade e rentabilidade de uma atividade produtiva ou projeto econômico.

Elas incrementam a conexão do passado com o presente e o futuro. A História é uma estória da evolução institucional na qual a performance económica só pode ser compreendida desde a compreensão desta evolução institucional. As instituições provêm os incentivos estruturais de uma economia. Esta estrutura de incentivos envolve e molda a direção das mudanças económicas, levando ao crescimento, estagnação ou declínio.” (North 1991, p. 2. tradução livre)

Douglas North

Resumo Conclusivo

As instituições descrevem o quadro de regras formais e informais da sociedade.

As normas sociais e as convenções não inscritas na legislação ou nos contratos podem ser consideradas como regras informais. As instituições informais refletem as crenças individuais, os costumes e as tradições de uma sociedade. Elas podem apresentar um caráter espontâneo, por exemplo, a maior parte dos indivíduos tende a exercer espontaneamente o hábito de ceder o lugar aos mais velhos em um ônibus lotado, ou simplesmente respeitar suas promessas pois tem como objetivo não perder a confiança ou o respeito das outras pessoas.

Por outro lado, a Constituição, os códigos jurídicos e os contratos privados são regras formais regendo as interações humanas e as condutas individuais em uma sociedade. A qualidade e respeito das instituições são aspectos fundamentais ao desenvolvimento dos estudos organizacionais e fenômenos de mercado.

A Nova Economia Institucional buscou então retomar essas questões para o centro do debate econômico em matéria teórica e empírica, e relevar a natureza essencial das regras sociais para o progresso e desenvolvimento econômico.

Referências

ACEMOGLU, D., et al. Institutions as a fundamental cause of long-run economic growth. In: AGHION, P., DURLAUF, S. (Ed.). Handbook of Economic Growth, Vol. 1, Elsevier, 2005, p. 386–464.

AMABLE, B. Les cinq capitalismes. Paris: Collection Economie Humaine, Editions du Seuil, 2005.

ARON, J. Growth and institutions: a review of the evidence. The World Bank research observer, v. 15, n. 1, p. 99–135.

CHAVANCE, B. L’économie Institutionnelle. Paris: Collection Repères, Éditions La Découverte, 2007.

GLAESER, E. L. et al. Do institutions cause growth? Journal of Economic Growth, v. 9, p. 271–303, 2004.

HALL, P. A.; SOSKICE, D. (Ed.). Varieties of capitalism: The institutional foundations of comparative advantage. Oxford: Oxford Press, 2001.

HAYEK, F. V. Droit, Législation et Liberté: une nouvelle formulation des principes libéraux de justice et d’économie politique. Paris, Quadrige Grands Textes, Editions puf, 2007.

NORTH, D. Institutions. The Journal of Economic Perspectives, v. 5, n. 1, p. 97–112, 1991.

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