O caso João Alberto e o racismo estrutural

Matheus Machado
Matheus Machado
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7 min readJun 22, 2021

Podcast narrativo aborda a morte de João Alberto Freitas e sua relação com um problema que está entranhado nas relações sociais.

Foto de João Alberto Freitas | Imagem: Reprodução | Edição: Matheus Machado

Matheus Machado e Carolina Teixeira Cesa

No dia 19 de novembro de 2020, pouco antes da data destinada a Consciência Negra, João Alberto Freitas, 41 anos, foi espancado e morto na saída do hipermercado Carrefour, na zona norte de Porto Alegre (RS). Os funcionários da loja que conduziram Beto (como era chamados por familiares e pessoas próximas) foram os responsáveis pelo espancamento que resultou na morte do homem.

“O caso João Alberto e o racismo estrutural” é uma produção dos estudantes Matheus Machado e Carolina Cesa como trabalho final da disciplina de Ética na Comunicação do curso de jornalismo do Centro Universitário Ritter dos Reis — UniRitter. O tema aqui abordado foi uma das discussões realizadas em aula.

Ouça o programa a seguir e leia, na íntegra, o roteiro do podcast.

TÉC… Sobe o som áudio “Morte no Carrefour”… Cai para BG…

CAROL: O áudio que você está ouvindo é o da gravação da câmera de segurança que registra os últimos minutos de João Alberto Freitas em vida.

MATH: Beto, como era chamado por familiares e amigos, estava saindo do supermercado Carrefour, no bairro Passo D’Areira, na zona norte de Porto Alegre.

C: Na saída, João Alberto estava acompanhado por Giovane Gaspar da Silva e Magno Braz Borges, dois seguranças terceirizados do Carrefour, e Adriana Alves Dutra, uma fiscal do supermercado.

M: Ao sair da loja, João Alberto dá um soco em um dos seguranças. Como resposta, os dois vão para cima de Beto, distribuem socos e chutes, principalmente na cabeça do homem. Giovane e Magno tentam imobilizar Beto, o jogam no chão, montam em cima dele, e continuam dando socos e pontapés no rosto e na cabeça.

C: O vídeo com som ao fundo, traz comentários de algumas pessoas que assistiam a gravação. Em alguns segundos, clientes que estão de saída e de chegada na loja assistem a cena, alguns tentam fazer algo, outros apenas olham. Funcionários também saem da loja para conter Beto, e um deles até ajuda os seguranças a mantê-lo imobilizado.

M: A esposa de João Alberto chega ao local onde a agressão está sendo realizada. Deixando o carrinho de compras de lado, Milena Alves tenta ajudar o marido, mas é contida por funcionários do supermercado.

C: João Alberto Freitas, de 40 anos, gritou e pediu socorro. Mesmo com a chegada do SAMU, Beto morreu no local.

TÉC… Sobe o som “Mission to Mars” e cai para BG…

M: A morte de João Alberto Freitas, um homem negro de 40 anos, aconteceu na noite de 19 de novembro de 2020, horas antes do Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro.

C: A data foi marcada por protestos históricos em Porto Alegre e em outras cidades do Brasil. A notícia repercutiu no mundo todo. E foi mais um acontecimento triste de 2020, um ano marcado não só pelas milhões de mortes causadas pela pandemia do novo coronavírus, mas também por ser o mesmo ano do assassinato de George Floyd nos Estados Unidos.

M: A morte de Beto desencadeou diálogos necessários sobre a sociedade brasileira e das relações dos indivíduos para com o outro. As discussões sobre racismo e racismo estrutural ganharam foco na rede nacional e dominaram as redes sociais.

C: Depois da conclusão das investigações da Polícia Civil sobre a morte de João Alberto, a delegada titular da 2ª Delegacia de Homicídios de Porto Alegre Roberta Bertoldo apontou que um dos motivos qualificadores da ação foi o racismo estrutural, e não a injúria racial. Neste caso, a morte de João Alberto não se tratou diretamente ou somente da cor de sua pele, e sim por uma série de concepções cultivadas na sociedade brasileira.

M: A delegada Roberta foi procurada pela produção, e comentou sobre a apresentação das conclusões do inquérito por mensagens de áudio em um aplicativo de mensagens.

TÉC… Cai o som “Mission to Mars” e sobe o som “Áudio 07”…

Início em 00’25: “O que eu apontei foi o racismo estrutural…”

Termina em 01’12: “…se apresenta muitas vezes alguém hipossuficiente economicamente ou socialmente”.

C: Para a delegada, quando os seguranças do Carrefour se aproximam de João Alberto, eles estavam com essas concepções automatizadas em suas ações.

TÉC… Sobe o som “Áudio 07”…

Início em 01’36: “ou seja, se ali estivesse alguém bem vestido…”

Termina em 01’48: “todos nós temos plena consciência disso.”

M: Com este apontamento, o caso de João Alberto, segundo a delegada Roberta Bertoldo, está ligado a situações de discriminação social, onde diariamente inúmeras pessoas são submetidas a pré-julgamentos a partir das suas roupas, pela aparência física, e acabam se tornando alvos de possibilidades suspeitas e irregulares.

C: A partir disso, a delegada acredita que esse condicionamento social ditou a abordagem que resultou na morte de João Alberto Freitas.

TÉC… Sobe o som “Áudio 07”…

Início em 02’13: “Então, eu entendo que a abordagem…”

Termina em 02’40: “absolutamente nada de agressivo com relação a ela”.

TÉC… Sobe o som “Mission to Mars” e Cai para BG…

M: Olá, eu sou Matheus Machado.

C: E eu sou Carolina Cesa. Nós somos estudantes de jornalismo na UniRitter, em Porto Alegre.

M: Este podcast está sendo produzido como trabalho final da disciplina de Ética na Comunicação. E aqui abordaremos alguns temas trabalhados em aula.

C: Antes de dar continuidade ao episódio deste podcast, é importante ressaltar o seguinte: a delegada Roberta Bertoldo foi a única entrevista direta realizada pela produção. Outras fontes que foram contatadas não responderam até o momento da gravação.

M: Com as declarações feitas pela delegada no bloco anterior, é necessário entender de forma simples o que é o racismo estrutural e como ele cria estereótipos na sociedade.

C: O racismo estrutural começa depois da colonização do continente americano que ocorreu entre os séculos XVI e XVII, e com a herança histórica vinda desses anos de escravidão.

M: O Brasil foi o último país da América Latina a abolir a escravidão, o que aconteceu apenas em 1888. Mesmo com a liberdade, um milhão e meio de pessoas negras foram inseridas na sociedade brasileira sem nenhum apoio ou suporte.

C: O racismo, de fato, surge com o fim da escravidão. Quem disse isso foi o advogado e professor da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade Presbiteriana Mackenzie Silvio Almeida. Ele também é autor do livro Racismo Estrutural. E a sua declaração aconteceu em uma entrevista ao Canal da Lili, no YouTube.

M: O Canal da Lili é comandado pela antropóloga Lilia Schwarcz, que leciona no departamento de antropologia da Universidade de São Paulo.

C: Ouça o que disse o professor Silvio Almeida.

TÉC… Sobe o som “Lila Entrevista Silvio Almeida”…

Início em 07'11: “o racismo é reconfigurado…”

Termina em 07'37: “como racismo.”

M: Em um outro depoimento, desta vez para a TV Boitempo, Silvio Almeida traz uma definição ainda mais clara sobre o racismo estrutural e de como ele configura as relações na sociedade.

TÉC… Sobe o som “O que é racismo estrutural”…

Início em 06'00: “agora o que espanta…”

Termina em 08'19: “é um dado que constitui as nossas próprias relações”

C: O racismo estrutural trata, principalmente, sobre as estruturas da nossa sociedade que internalizaram e normalizaram discursos e atitudes preconceituosas.

M: É por isso que casos como o de João Alberto Freitas ocorrem. Casos com uso de força desnecessário. Como bem disse a delegada Roberta, abre aspas “se ali estivesse alguém bem vestido, independente da sua cor, o tratamento seria outro”, fecha aspas.

C: Em meio a tanta violência e preconceito, surge a dúvida: como podemos contribuir para combater o racismo e promover a quebra de estereótipos?

M: Uma das soluções, entre tantas e que demandariam muito mais do que um episódio de um podcast, é que as pessoas brancas reflitam, identifiquem e reconheçam seus privilégios.

C: Durante a conversa pelo aplicativo de mensagem com a delegada Roberta Bertoldo, perguntamos a ela que lições a sociedade deveria tirar de um caso brutal como o da morte de João Alberto Freitas.

TÉC… Sobe o som “Áudio 08”…

Início em 00'01: “A principal lição…”

Termina em 00'36: “entender o outro em suas peculiaridades”

Início em 00'57: “um caso como esse…”

Termina em 01'34: “… em qualquer de seus aspectos.”

M: E para que casos como o de Beto não se repitam, o exercício que precisa ser feito é o de pensar. Como já dito aqui, é necessário refletir sobre as estruturas sociais, sobre os espaços e as suas ocupações, sobre as desigualdades e a quem elas atingem.

C: Quem mais sofre com a violência? Quem é mais desassistido ou desamparado de políticas públicas?

M: E ao pensar sobre por onde começar a combater o racismo, retomamos a fala do professor Silvio Almeida, que na entrevista concedida a Lilia Schwarcz também refletiu sobre a diferença entre não ser racista e ser antiracista.

TÉC… Sobe o som “Lila Entrevista Silvio Almeida…

Início em01'54: “você não ser racista…”

Termina em 03'11: “estruturada em bases raciais também”.

Início em 08'18: “como é que se combate racismo?”

Termina em 08'32: “reorientação ideológica e política da sociedade”

M: Com este pensamento, conclui-se que além de refletir sobre as bases da sociedade, também é necessário a criação de políticas públicas que possam combater o racismo estrutural.

TÉC… Sobe o som “Mission to Mars” e Cai para BG…

M: Este podcast foi produzido como o trabalho final da disciplina de Ética na Comunicação, no curso de Jornalismo da UniRitter, e abordou o caso da morte de João Alberto Freitas e sua ligação com o racismo estrutural./ A produção, roteiro e a apresentação foram de Matheus Machado e Carolina Cesa./ A edição foi de Matheus Machado./ O projeto foi supervisionado pelo professor Roberto Villar Belmonte.

TÉC… Sobe o som “Mission to Mars” e Cai para fade out.

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Matheus Machado
Matheus Machado

Um lugar que você, talvez, não devesse conhecer. Sou jornalista. Um alguém que gosta de escrever.