Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal é sobre um serial killer, mas sem o killer

Matheus Zanin
Matheus Zanin — Portfólio
3 min readNov 15, 2019

Disponível em: jornalismojunior.com.br/ted-bundy-a-irresistivel-face-do-mal/

Interpretado por diversos atores ao longo de várias adaptações, a história de Ted Bundy é conhecida mundialmente. O serial killer americano foi condenado à morte por ter cometido 30 homicídios (ou mais) em diversos locais dos Estados Unidos. Em Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal (Extremely Wicked, Shockingly and Vile, 2019), vemos um ponto de vista diferente para a história contada diversas vezes.

O filme é corajoso por fugir do convencional — ou esperado em produções semelhantes. [Imagem: Brian Douglas/Sundance Institute]

Um fato se destaca: não há praticamente nenhuma cena de assassinato no longa. A abordagem é outra. Através do olhar da personagem Liz Kendall (Lily Collins), noiva de Ted e por quem sofre um conflito interno, o roteiro escrito por Michael Werwie opta por colocar a figura de Bundy (Zac Efron) em posição de sofredor, destacando o julgamento e prisão do criminoso em detrimento da reconstituição de suas ações. É uma escolha proposital tanto boa quanto ruim. Boa porque foge do convencional em filmes parecidos, gerando dúvidas no próprio espectador quanto à possibilidade de Bundy ser culpado — provocadas pela constante negação de seus atos. Ruim porque perde a oportunidade de explorar o relacionamento vítima-assassino em abordagem de sua parte killer, além de possibilitar interpretações de descaso por parte da obra em relação às vítimas.

Não é necessária a reconstituição dos homicídios para que o espectador entenda o perigo oferecido por Bundy. Sua maior maldade consiste em tentar comprovar-se puro e inofensivo. [Imagem: Brian Douglas]

No fim, as consequências boas são maiores. O caráter traiçoeiro de Ted, escondido em rosto de galã, é acentuado pela não exposição de seus crimes. Efron faz o melhor trabalho de toda sua carreira, interpretando o assassino e seu cinismo fielmente. Assim como Norman Bates, ele é carismático, enigmático e mentiroso.

Ao optar por um caminho não convencional, o roteiro permite que o espectador compreenda a angústia sofrida pela personagem de Collins, que ama o serial killer. Caso o filme se limitasse retratando os assassinatos e o julgamento de Bundy como consequência, tal visão não funcionaria.

A suposta imagem sofredora de Ted é reafirmada através da genialidade do roteiro em não mostrar, durante uma hora e quarenta minutos, o homicida derramar qualquer sangue. Longe de humanizá-lo (o diretor, Joe Berlinger, parece o fazer inicialmente), isto ressalta sua maldade e desumanidade, tendo em vista o conhecido desfecho do caso. Com fotografia atraente, seu êxito está em tornar compreensível o porquê de alguns, na época, acreditarem na inocência do criminoso.

O longa, no entanto, falha na edição conturbada. Saltos temporais são estranhos e confusos, sendo a maioria não essenciais. Além do casal principal como destaque, Kaya Scodelario oferece uma excelente interpretação para Carole Ann Boone, ex-esposa e mãe da filha de Bundy.

À primeira vista, a história parece batida. Porém, trata-se de um filme corajoso, que foge de conveniências e apresenta uma nova visão sobre os atos do serial killer. O responsável por compreender suas verdadeiras intenções, acima de colocar Bundy como vítima, é o próprio espectador.

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Matheus Zanin
Matheus Zanin — Portfólio

Journalism student at University of São Paulo (ECA — USP).