Como desenhamos um serviço digital para a maior região produtora de café do mundo

Barbara Borges
Matilha Estúdio de Design
7 min readApr 6, 2020

A Agrotopus é uma empresa do ramo de tecnologia agrícola, voltada para a cafeicultura. Hoje possuem dois produtos: o Armazém Inteligente, que automatiza estoque e logística do café dentro da cooperativa; e o Fazenda digital, que traz em um aplicativo a possibilidade de controle e manejo da fazenda de produtores. Seu modelo de negócios é voltado para pequenos e médios produtores, que consomem o serviço por intermédio de cooperativas — as quais servem como hub de distribuição dos seus produtos.

Processo e Ferramentas

A fase de pesquisa do projeto foi dividida em 6 sprints, onde utilizamos o processo do Double Diamond, com a abordagem do Design Thinking.

As etapas do projeto se dividiram em:

Planejamento: aqui foram calculadas as horas necessárias para o projeto, a equipe envolvida e quais ferramentas seriam usadas.

Fundamentação teórica: aqui fomos descobrir um pouco mais sobre o agronegócio e tecnologias voltadas para essa área.

Benchmarking: fizemos um levantamento de outras empresas concorrentes da Agrotopus, para fazer um comparativo de funcionalidades e recolher possíveis insights.

Pesquisa de campo: para compreendermos melhor o dia a dia do produtor e quais eram suas dificuldades, prioridades e perfil.

Pesquisa quantitativa: utilizada para recolher dados numéricos e demográficos do público alvo.

Personas: uma representação do público-alvo segundo seu perfil, que aponta suas dores, necessidades e oportunidades.

Critérios Norteadores: com o objetivo de deixar claro o que deve ser priorizado durante o projeto e também trazer futuras oportunidades, geramos uma lista de requisitos para os próximos passos do projeto.

Blueprint do Serviço: utilizado para demonstrar um fluxo ideal do serviço, as ações dentro dele e oportunidades de cada etapa.

Execução

Esse projeto tinha características bem específicas: por se tratar de um produto para um público e contexto bem específico — e que já estava sendo realizado em conjunto com uma cooperativa de café — vimos a necessidade de ir até o campo (literalmente), e entender a realidade e necessidade das pessoas que iriam usar o produto.

O produto digital que iríamos redesenhar era o Fazenda Digital: um aplicativo que ajuda produtores agrários a organizar e monitorar as tarefas da sua fazenda, bem como fazer o manejo de funcionários, além de conseguir analisar os dados de cada período e cultivo. Exploramos esse nicho com o objetivo de descobrir quais eram as necessidades reais dos usuários, suas dificuldades, preferências e saber quais oportunidades poderiam ser abordadas no futuro.

A empresa tinha também um outro produto: o Armazém Inteligente. Um sistema que faz a logística e controle de estoque dentro da Cooperativa, utilizando tecnologia RFID no maquinário, nos galpões de estoque e nas sacas de café. O controle e input de dados é feito por um aplicativo utilizado pelo corpo técnico da Cooperativa. Conhecemos esse sistema de perto e vimos todo o processo. Tivemos a chance de conversar com as pessoas envolvidas diretamente na execução desse serviço.

Em paralelo, executamos o projeto buscando entender o que já
existia no contexto atual. O sistema, até então, tinha sido feito apenas por desenvolvedores. Não havia pensamento de design ou experiência do usuário.

Realizamos análises de benchmarking de empresas nacionais e internacionais — que são referências na área — e uma desk research, para entender o cenário atual da tecnologia no agronegócio. Conseguimos trazer dados relevantes, que indicaram o grande potencial dessa área. Para imergir ainda mais, entramos em diversos grupos de agronegócio no Facebook, para entender o comportamento, necessidades e preocupações das pessoas que estão de alguma forma relacionadas à área da agricultura.

Um público que, para nós, estava bem longe da nossa realidade e modo de pensar, precisava muito ser ouvido e levado em consideração. Só assim o serviço realmente faria sentido para ele.

Nos preparamos para fazer entrevistas e entender o processo de perto: nossa equipe (duas pesquisadoras e um UX Designer) viajou até o Sul de Minas, para a cidade de Varginha, uma das principais produtoras de café da região.

Com os roteiros para entrevistas na fazenda e cooperativa, câmera fotográfica, gravadores de áudio, e nossos cadernos para anotação, estávamos com todas as ferramentas necessárias para executar o planejamento.

Falamos com pessoas de cinco perfis diferentes: colaboradores da Agrotopus (cliente); colaboradores da Cooperativa de café; Agrônomos; Proprietários e gestores de fazendas. Cada um deles trouxe um ponto de vista diferente, e dados importantes para o direcionamento do projeto.

Percebemos que a forma como se comunicam, principalmente no dia a dia da fazenda, é bem diferente do que estamos acostumados. O que é falado vale mais do que coisas escritas formalmente, como por e-mail ou mensagem de texto. Ainda sim, muitos dos produtores tem o WhatsApp como sua principal forma de comunicação a distância.

Toda coleta de dados foi muito rica. Era a primeira vez que fazíamos uma pesquisa em profundidade junto com o UX designer que iria desenhar o aplicativo. Vivenciar a realidade do usuário, vendo de perto seus hábitos, costumes e prioridades, impactou diretamente na qualidade da pesquisa e nos resultados que vieram depois.

A partir dessa visão e das informações, consolidamos duas personas que representam os principais usuários do produto.

A partir de todos os dados coletados, foram gerados Critérios Norteadores. Com o objetivo de guiar os próximos passos do projeto, tanto em UX/UI quanto em desenvolvimento, separamos esses itens em Requisitos e Oportunidades (futuras).

Todas as informações foram indexadas e traduzidas em um blueprint do serviço ideal, que leva em consideração não só o sistema, mas todo o pré e pós-serviço também — englobando as jornadas do produtor, do gestor, da cooperativa, e da Agrotopus como fornecedora.

A partir daí, o trabalho de experiência do usuário realmente começou: desenhamos o escopo completo do projeto e iniciamos o projeto da interface.

Um pouquinho dos resultados da interface:

Na home, o usuário tem a visão geral de sua propriedade, com dados de clima, maquinário e alertas. O mapa da propriedade, no painel da direita, fica sempre evidente e pode ser visualizado com diferentes filtros (na imagem acima, com filtro de calor). Aqui, o usuário tem todas as informações que precisa de forma direta e fácil.

Na sessão de maquinários, o usuário tem a visão de todas as suas máquinas registradas, com dados de uso e trajeto realizados. Dessa forma, o produtor ou gerente pode acompanhar e planejar o trabalho dos funcionários de forma mais assertiva.

Nas tarefas, é possível adicionar, organizar e visualizar as atividades que devem ser realizadas na propriedade, atrelando elas aos respectivos funcionários. A visualização é simples e traz os status de cada uma de forma fácil, sempre mostrando no mapa ao lado à qual área da fazenda está relacionada.

Ao entrar em uma das tarefas, o usuário observa seu status e progresso, podendo utilizar filtros que trazem as informações específicas desejadas no momento.

Resultados e Iterações

O sistema foi lançado em uma das maiores feiras agrícolas de Minas Gerais, e teve grande repercussão nos meios de comunicação e mídia agro. Mas o que fizemos em um mês (já com o desenvolvimento), teve que ser adaptado para o usuário real, e não apenas para uma feira.

Com boa parte do sistema desenhado e ajustes na interface (mas ainda não desenvolvida), fomos novamente para Varginha. Agora com o objetivo de validar as features atuais para dar continuidade, além de apresentar também novas oportunidades para os usuários.

Fizemos testes de desejabilidade com os mesmos perfis entrevistados anteriormente. Mas aqui, tivemos resultados explícitos de diversos aspectos que deveriam ter diferentes prioridades no sistema. Pontos que não estavam sendo levados em consideração, e que para essas pessoas eram de extrema importância; e ao mesmo tempo, features que estavam inflando o serviço, e que não tinham importância para os usuários.

A maior parte das novas oportunidades teve resposta negativa diante da apresentação para os usuários. E isso foi um resultado muito importante. Conseguimos validar com as pessoas que alguns itens não eram interessantes para elas. Sendo assim, não houve um investimento para o desenvolvimento dessas funcionalidades.

Aqui um pouco do resultado de toda a coleta de dados.

Quem participou desse projeto:

Service Design
Barbara Borges
Caroline Mello

UX/UI Design
Guilherme Assis
Fernanda Bocchi

Front-end
Bruno Vaz
Onélio Marchi

Head deDesign
Piercarlo Melatti

Gerente de Projeto
Daniel Imaeda

Comercial
Guilherme Utko

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