Journey: a metáfora da vida

Mauro Amaral
SobreNós
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3 min readApr 10, 2012

Quando eu já achava que seria relegado a categoria de um jogador casual de social games, soube da existência de Journey (thatgamecompany.com, 2012). Não que tenha levado a sério quando o meu filho mais velho — absolutamente dentro da cena gammer desses anos ´10 — , chegou aos gritos entusiasmados de “Olha isso aqui, é muito bom, simplesmente genial”.

Olhei com desdém, como só alguém criado no mundo dos 16bits pode fazer afirmando que, muito provavelmente era mais uma das chatíssimas versões em que você pilota um personagem que pula de muro em muro, coleta poderes e enfrenta chefes de fase cada vez mais difíceis. Disse isso pois passei 2011 inteiro tentando explicar para a geração mais nova de gammers que Assassins Creed, Infamous e Force Unleashed eram uma mesma história com peles difrerentes.

De nada adiantava e a escaramuça me servia apenas para atestar que o que eu sentia falta era mesmo de uma boa história. Considero os games uma das plataformas para se contar histórias mais intensamente adaptadas ao século XXI. Universal, ultraconectada, sequencial e, claro, social. A turma de hoje não joga, “joga com alguém”. Mas, a julgar pelo que via até então, era uma plataforma subutilizada.

Então, dei um voto de confiança e baixamos Journey. E tudo mudou.

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Lindo, exuberante e imperdível. Assim é Journey[/caption]

O que vemos na tela é a completa reinvenção de antigas convenções do mundo dos games. Você não tem uma barra de energia ou chefes de fase, não tem pontos, não tem… fases.

O que você encontra em Journey é, antes de tudo, uma experiência emocional. Uma narrativa na qual você é personagem e protagonista, guiado apenas pela inexorável marcha a que se propõe.

O jogo começa em meio ao deserto com um personagem-você no qual nitidamente se percebe o ar da dúvida fundamental: o que faço aqui? Para onde vou? É essa dúvida que persegue você enquanto dunas, castelos em ruínas e seres (espiriuais? alienígenas?) translúcidos pontuam seus sucessos.

A cada etapa, você vê escrito em tapeçarias (livro da vida?) seu progresso. A cada momento, sua trajetória é contada e recontada. E sua dúvida parece ser substituída por perseverança. Aliás, sua única força em Journey pode ser definida como um misto de determinação e solidez mental. Em resumo: esperança.

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Direção de arte primorosa que não se rende às tendências mais banais.[/caption]

E por falar nesse sentimento tão nobre, é ele que parece pontuar outro grande pesonagem do game: sua trilha sonora. O trabalho de Austin Wintory não deve nada aos clássicos de Hans Zimmer para filmes como Gladiador e Falcão Negro em Perigo. Em alguns momentos eu apenas larguei o controle e me deixei levar pela melodia. Sério.

Journey não foi feito para ser díficil, demorado ou cansativo. É uma história curta e bem contada, pela qual você passa em grandes atropelos em pouco mais de uma hora. Um espetáculo visual, sonoro e sensorial que guarda o melhor para a sua metáfora final.

O início, o fim e o meio

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Em Journey, o que vale é o caminhar e as pessoas que você encontra pelo caminho[/caption]

Ao chegar ao topo de uma montanha de luz, suas forças se esvaem, suas pernas tremem e finalmente, você cai. Após isso é envolvido por intensas descargas de energia, caminha para uma brancura infinita e… é brindado com cenas de suas passagem pelo deserto, das pessoas que encontrou em sua jornada (jogadores reais que vez por outra dividem a tela com você) e, finalmente… recomeça seu percurso no mesmo ponto onde começou a caminhar.

Journey é a metáfora universal da esperança do nosso próprio renascimento. Apenas uma vida, mas sempre em frente. O que vale, como dizem, não é extamente o final da caminhada, mas cada passo.

Recomendo.

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