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MAYARA WANCOK

Redatora freelancer. Experiência com redação de textos jornalísticos; produção de conteúdos (para web ou impressos); diagramação de imagens para mídias sociais; editoração de jornais e revistas; e edição de áudios e vídeos simples.

A Ética socrática, platônica e aristotélica

9 min readSep 14, 2021

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Photo by Spencer Davis on Unsplash

1. Contrastes entre Ética e Moral

A Ética é uma ciência filosófica e, por isso, é composta por reflexões teóricas acerca do comportamento humano e das ações morais, tencionando distinguir o correto do incorreto e o bem do mal para melhorar a convivência entre os indivíduos de uma determinada sociedade. Por esse motivo, a Ética também é chamada de filosofia moral.

No entanto, por se tratar de uma ciência, ela ultrapassa a opinião e busca construir uma resposta a um problema, apoiando-se em estudos de antropologia cultural e semelhantes. Pode-se dizer que a Ética corresponde à escolha, pelo indivíduo, de que vida viver e quem ser. Ela é universal, atemporal e sempre reflexiva, e é isso o que a diferencia da Moral.

Esta última é criada socialmente e consiste nas regras de convivência social que nos dizem o que devemos ou não fazer e como fazer. A Moral é particular e temporal, pois envolve hábitos e tradições de um determinado grupo social em um determinado tempo. Nesse sentido, uma ação seria errada apenas enquanto ela não fosse o tipo de um novo comportamento vigente. Além disso, a Moral é resultante de uma adesão e carrega consigo o sentido de obrigatoriedade.

Portanto, pode-se considerar que a Ética engloba a Moral. Isso porque, ao refletir sobre o que é certo e o que é errado e ao decidir que vida viver e quem ser, o indivíduo também decide quais princípios serão validados e seguidos por ele, fazendo a adesão a um determinado código de conduta que formará o seu caráter.

Os filósofos da Grécia Antiga tiveram diferentes interpretações do que viria a ser ato moral, vícios e virtudes. Para os sofistas, a Ética seria subjetiva, porque não existem normas nem verdades universalmente válidas, nem verdade nem erro, e as normas seriam transitórias por serem humanas. Então, para eles, se não existia uma moral universal, o que importava era a persuasão. É por esse motivo que eles ensinavam a retórica — a arte de discutir, argumentar e convencer.

Já Sócrates entrava em embate frequentemente com os sofistas. Primeiro porque eles se colocavam como “os sábios” e “vendiam” conhecimento ao cobrar uma taxa para ensinar a arte do convencimento; segundo, porque Sócrates acreditava que existia sim uma verdade universalmente válida.

Após Sócrates, diversos filósofos gregos debateram sobre Ética. Seu discípulo, Platão, e o discípulo de seu discípulo, Aristóteles, desenvolveram o Racionalismo Ético iniciado por Sócrates e fizeram suas próprias interpretações acerca do assunto, além de propor suas próprias ideias.

2. A noção de Ética para os principais filósofos da Grécia Antiga

2.1. Ética Socrática

Sócrates foi pai do debate ético, revolucionou a filosofia antiga e se tornou um dos grandes responsáveis pela formação da tradição ocidental. Ao longo de sua vida, fez indagações pertinentes acerca do comportamento humano e buscou justificativas filosóficas para os conceitos de vícios e virtudes.

Para Sócrates, a Ética reside no conhecimento e o ponto de partida é a consciência do agente moral. Isso significa que, para ele, uma pessoa é ética apenas se sabe o que faz, sendo todo erro um fruto da ignorância e toda virtude um fruto do conhecimento. E quando o indivíduo se deixa enganar por meros “achismos”, comete o mal crendo praticar algo que o leve à felicidade, o fim da ação.

Logo, o indivíduo precisa conhecer-se, saber as causas e os fins de sua ação, o significado de suas intenções e de suas atitudes e a essência dos valores morais. Aqui fica claro porque é tão importante para ele reconhecer que a maior das virtudes é saber que nada se sabe e que a maior luta do homem deve ser pela educação.

Sócrates acreditava que a felicidade dependia somente de bens imateriais e, para se chegar a este fim, era fundamental cultivar a virtude controlando sentimentos e ações, uma vez que os sentimentos nos fazem agir por impulso e, nesse caso, não seremos conscientes dos motivos do nosso comportamento.

Sendo assim, para Sócrates ninguém peca voluntariamente, e quem faz o mal, o faz porque disso espera extrair um bem, ou seja, ele considera impossível conhecer o bem e não o fazer. Ele também acredita que é impossível fazer o bem quando não o conhecemos.

2.2. Ética Platônica

Platão foi discípulo de Sócrates e responsável por eternizar as ideias do pensador grego em manuscritos. No entanto, Platão também contribuiu com sua própria produção filosófica ao se basear na filosofia de Sócrates para disseminar suas convergências e divergências.

É importante mencionar que, para Platão, o homem é a sua alma, mas sua alma não pertence ao mundo humano. Ela está de passagem entre o mundo das ideias (inteligível) e o mundo concreto (sensível), habitando apenas temporariamente em um corpo. Por isso, o filósofo acredita que só é importante ter uma conduta ética durante a vida humana para disciplinar e aperfeiçoar a alma, que é imortal.

Por acreditar em uma vida depois da morte, Platão prefere o ascetismo ao prazer terreno e até condena a vida voltada exclusivamente para os prazeres. Ele considera a prática da virtude a coisa mais preciosa para o homem. Para o discípulo de Sócrates, é na prática da virtude onde se encontra a felicidade, logo uma pessoa virtuosa, que age corretamente, é uma pessoa feliz.

No entanto, a alma a que se refere Platão se aproxima muito mais do intelecto, do que a noção de alma da cultura ocidental cristã. Ele acreditava que a questão central da ética sobre as formas de vida e “a melhor forma de vida” poderia ser formulada e discutida racionalmente, independentemente das respostas dadas pela tradição e pela religião.

A alma também seria tripartite, tendo um lado racional, um lado colérico/ irascível e um lado apetitivo/ concupiscente. E Platão prega o princípio da proporcionalidade, em que se deve equilibrar essas três partes da alma. Ao mesmo tempo em que prega que a parte racional deve preponderar em relação às outras duas.

A teoria da alma explica o fato de adotarmos comportamentos eticamente incorretos. E é importante mencionar aqui que para Platão nós não nascemos virtuosos, a virtude é algo que procuramos alcançar enquanto no mundo sensível para aperfeiçoar a alma antes de transcender ao mundo das ideias.

2.3. Ética Aristotélica

Aristóteles foi discípulo de Platão e também desenvolveu uma reflexão Ética Racionalista, mas discordou de seus mestres em alguns pontos. Ele propôs uma teoria ética do “meio-termo”, onde a virtude estaria em procurar o ponto de equilíbrio entre o excesso e a deficiência.

Seguindo essa teoria, a virtude está entre dois vícios: o vício por excesso e o vício por deficiência. Um exemplo, para ilustrar, seria a virtude do respeito próprio, que se encontra de um lado com sua presença exagerada resultando no vício da vaidade, e do outro lado com sua total ausência resultando no vício da baixa autoestima. Então, para Aristóteles, todos os sentimentos podem ser sentidos em grau excessivo ou em grau ou insuficiente, e, tanto em um caso quanto no outro, isso é um mal.

Ele vê a felicidade como fim último do ser humano, pois tudo que todos buscam alcançar é para sermos felizes. A felicidade, por ser a melhor coisa humana, o que há de melhor e mais nobre, para Aristóteles não poderia nunca ser deixada ao acaso. Ela seria uma atividade virtuosa da alma, algo divino, sendo os demais bens apenas instrumentos para sua realização.

Então, ele tem uma posição mais realista acerca deste pensamento se comparado a Sócrates e Platão, pois ele acredita que a felicidade, além de depender de virtudes, depende de bens materiais. Segundo o filósofo, a felicidade é uma atividade da alma identificada com a virtude, porém necessita de bens exteriores, pois não é possível realizar atos nobres sem os meios.

E por não poder ser deixada ao acaso, Aristóteles concorda com a ideia de Platão quanto a não nascermos virtuosos, mas sim sermos ensinados a ser virtuosos. Para ele, as virtudes intelectuais devem ser ensinadas e as morais devem ser praticadas de forma a se tornarem quase como uma segunda natureza.

Isso significa que as virtudes intelectuais são o resultado do ensino e, por isso, precisam de experiência e de tempo. Já as virtudes morais são formadas pelo hábito. Nos tornamos virtuosos pela reiteração da conduta, ou seja, a prática das virtudes é um pré-requisito para que se possa adquiri-las. Não basta saber, é preciso praticar.

É válido mencionar que Platão e Aristóteles viam a Ética vinculada à vida Política, sendo esta um meio da Ética, por ser o indivíduo um ser sociopolítico por natureza, ele necessita da vida em comum para alcançar a felicidade. O ser humano não consegue alcançar a plenitude moral sozinho.

3. Considerações finais

Sócrates acredita que uma pessoa é ética apenas se sabe o que faz, sendo todo erro um fruto da ignorância e toda virtude um fruto do conhecimento. Ele também acredita que é impossível fazer o bem quando não se conhece o bem. No entanto, é corriqueiro ter ciência de casos em que as pessoas vivem na mais profunda ignorância, sem acesso algum ao conhecimento, e mesmo assim vivem uma vida virtuosa, com virtudes como a coragem, a generosidade, a humildade, entre outras.

Para ele, ninguém peca voluntariamente e quem faz o mal, o faz porque disso espera extrair um bem. No entanto, a virtude está no poder de escolha, porque as cada pessoa é capaz de escolher entre a virtude e o vício, visto que um desejo pode ser deliberado.

Por isso, pode-se concluir também que todos os atos são voluntários, porque a decisão de agir foi tomada, mesmo que haja arrependimento e não se possa voltar atrás. O ser humano é capaz de conhecer o bem e mesmo assim optar por fazer o mal, conscientemente.

Sócrates também acreditava que a felicidade dependia somente de bens imateriais, assim como seu discípulo. Platão acreditava que a alma humana não pertence ao mundo sensível e que o tempo de vida terrena servia para aperfeiçoar a alma, que é imortal.

Por isso, Platão era adepto à filosofia de vida na qual se realizam certas práticas visando o desenvolvimento espiritual. Ele abdicava de prazeres terrenos e até condenava quem tinha uma vida voltada para esses prazeres, porque sua ideia gira em torna de que é na prática da virtude onde se encontra a felicidade, logo uma pessoa virtuosa, que age corretamente, é uma pessoa feliz.

No entanto, apesar de praticar atos morais ser o suficiente para a felicidade de alguns, essa não é uma verdade universal. Assim como existem pessoas que possuem dinheiro suficiente para ter acesso a todos os prazeres possíveis e mesmo assim não são felizes, a prática de atos morais pode não trazer felicidade para algumas pessoas.

Para Aristóteles, a felicidade é nosso propósito maior e tudo o que buscamos é para alcançá-la. Isso independe se a buscamos em bens imateriais ou materiais, tanto virtudes como prazeres são meios para este fim.

Aristóteles concorda com Platão ao dizer que não nascemos virtuosos, e sim somos ensinados a ser. Em outras palavras, nosso caráter é moldado no decorrer da nossa vida e depende das nossas experiencias e das nossas interpretações. Os dois também acreditam que o ser humano não consegue alcançar a plenitude moral sozinho, o que é justificável dado que somos seres políticos e a própria natureza humana exige a vida em sociedade.

Ainda segundo Aristóteles, ser moralmente virtuoso depende da prática de condutas corretas para que elas se tornem hábito e, assim, passem a fazer parte do nosso caráter. Assim, uma pessoa virtuosa pode cometer atos falhos algumas vezes na vida, e isso não faz com que ela deixe de ser virtuosa. Assim como pessoas viciosas podem praticar um ato moral durante a vida e nem por isso deixarão de ser viciosas. É a maneira usual de ser da pessoa que a define, e não ações esporádicas.

Já para Platão, cada indivíduo é capaz de formular e discutir racionalmente sobre quem quer ser e que vida quer ter, independentemente das normas tradicionais e religiosas da sociedade em que nasce. Um ser humano possui a capacidade de refletir sobre as próprias atitudes e sobre o poder de escolha que tem acerca do próprio caráter.

Ele também justifica a importância de ter uma conduta ética durante a vida humana perante o objetivo de se aperfeiçoar para o que vem depois. No entanto, independentemente da existência de uma vida depois da morte, é importante ser virtuoso pela convivência harmoniosa e pelo bem-estar dentro de uma sociedade.

Após esta análise, pode-se concluir que tudo só é bom se está em equilíbrio, nada em escassez ou em excesso é aprazível. Ser muito corajoso pode te tornar precipitado, não ser nada corajoso pode te tornar covarde, e ambos são vícios.

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23 anos, carioca, estudante de Jornalismo na FACHA — Faculdades Integradas Hélio Alonso.

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