As perdas, amores e o esplêndido brilho de Noporn, atração do MECABrennand 2019

Saiba mais sobre referências criativas, passado e futuro do grupo que domina as pistas mais brilhosas do Brasil inteiro, em uma entrevista exclusiva

Noporn, dupla que nasceu no auge da onda do electropop e electroclash mundial, se destacou no cenário musical brasileiro por levar poesia para a pista. As músicas, com versos ritmados em spoken-word (mais falados que cantados), fazem os clubbers brasileiros dançarem desde o lançamento do álbum “Noporn” em 2006.

As músicas produzidas por Lucas Lauri e escritas por Liana Padilha são crônicas sobre amores, perdas e sexo, e fazem parte do imagético coletivo de uma legião de fãs. Foi assim que veio o segundo álbum, “Boca” (2016).
Com batidas potentes espelhadas no que rola nas pistas paulistanas, as canções abordam liberdade e sexualidade. Entre os 10 anos de lançamento dos álbuns, a dupla continuou criando em outras formas: desenhar e criar jóias são outras formas de expressão artística de Liana.

Pintura de Liana Padilha

Hoje, quem divide o palco com Liana é o produtor Lucas Freire, que assina os próximos lançamentos de Noporn. E é em ritmo de Baile de Peruas que Noporn estará comandando a pista mais brilhosa de Recife no MECABrennand 2019, dia 14 de setembro, na Oficina Cerâmica Francisco Brennand, em Recife (PE).

Quer saber sobre a música nova, histórias do passado, processos criativos e futuro de Noporn? Confira a matéria que nosso curador musical Dimas Henkes realizou com o duo Noporn!

Nas suas músicas, as letras são entoadas em forma de poema. Às vezes mais sátiras, às vezes mais críticas. Qual a relação da sátira e da crítica na hora de compor?

O que eu faço é canto-falado ou spoken-word. Não é uma coisa nova, mas não é igual a declamar poesia, é mais como o rap ou o repente. Eu crio as letras junto com as bases. Hoje em dia eu crio o Noporn com o produtor Lucas Freire, que toca nos shows comigo desde o ano passado. O Luca Lauri deu um tempo dos shows pra estudar mas continua fazendo curadoria do Noporn.

Nosso trabalho começa com jams ou laboratórios musicais e eu vou encaixando os assuntos que eu quero falar. Acho que a única música que é sátira e crítica é “Baile de Peruas”. As outras, mesmo que não pareçam, são sérias e sobre sexo, amor, encontros e desencontros. O disco 1 foi sobre perdas e amores, o segundo, “Boca”, é sobre as várias fases de um encontro amoroso – começo, paixão, tédio, amor, violência, solidão e fim.

Não me sinto muito satírica (ao menos não é a intenção), mas eu sou séria no palco e falo de sexo, então as pessoas acham engraçado ou riem de nervoso, porque acham sexo engraçado.

Entre um álbum e outro, 10 anos se passaram. Como foram esses anos para vocês?

Meu compromisso é ser livre e criar coisas que não sejam datadas ou só pra fazer sucesso, coisas que eu possa ouvir ou ver daqui 10/20 anos e não sinta vergonha. Faço poesia mas não falo como poesia, eu conto histórias.

Ficamos dez anos entre os discos porque não tínhamos o que falar e estávamos fazendo outras coisas. Somos artistas e vivemos criando, faz tempo que entreguei minha vida pra isso. Tem horas que eu faço músicas, outras que eu pinto, faço jóias, bijoux ou roupas. São só formas diferentes de criar.

Os dois álbuns se completam, o primeiro era sobre o que vivíamos no começo do século XXI, nas relações, no fato de estarmos virando adultos com o novo milênio e as transformações que o sexo estava passando. Estávamos virando adultos num momento que as pessoas jovens, os ídolos, os mais livres e sexualmente ativos, uma geração inteira, foi dizimada pela AIDS, perdemos vários amigos preciosos de uma geração que era muito solta, livre, não-monogâmica, nem de sexualidade definida. Parte dessa geração morreu por falta de informação, medo, preconceito e falta de remédio, falta de esclarecimento sexual.

Isso não mudou: a cada dez anos uma nova geração entra na vida sexual, totalmente exposta e se achando errada, porque não aprende sobre sexo na escola, aprende com a pornografia e na vida mesmo. E a AIDS ainda não foi totalmente controlada.

Sempre falo sobre isso nas letras. É tudo sobre sexo. Moda é sobre sexo, vida noturna, até mesmo o ideal romântico: estamos vivos aqui e agora porque alguém fez sexo.

Algumas músicas são crônicas da exuberante noite paulistana, em momentos do auge de toda a ferveção. Em momentos de crises atuais, como serão as próximas crônicas musicais do Noporn?

A noite corre no sangue. “A noite é princesa caída por mim.”

Continuarei falando de sexo enquanto falar de sexo for considerado tabu e a violência for considerada normal. Vou continuar falando de paus duros, cus, bocas e bucetas molhadas.

Enquanto as liberdades individuais forem ameaçadas, vou falar de pré e pós-pornô, de sexo virtual e robótico, sexo alienígena. Enquanto isso for um assunto reprimido, confuso, obscuro, criador de traumas e confusões tão grandes. Enquanto as pessoas forem educadas por padrões sexuais errados, limitantes, e não prazerosos.

Acho que os assuntos do Noporn sempre foram esses e continuam sendo.

Pro próximo álbum (se houver), penso em falar de posse, ciúmes, paixões, violência, poses sexuais, sexo digital e monogamia.

Em “Cavalo” vocês usaram um sample de “Baila Comigo”, da Rita Lee. Tanto Noporn como Rita Lee são nomes que traduzem a noite paulistana de gerações diferentes, mas de formas complementares. Partindo desse pressuposto, como seria a festa de Noporn com Rita Lee?

Arte do Estúdio Xingu

Rita Lee é uma musa única no caso do Noporn. Foi minha primeira referência musical, ainda criança, e do Luca Lauri também. Nós fazíamos lives no Xingu e no Vegas (clubes de SP onde tocávamos) e mashups das músicas dela e do Roberto de Carvalho, que é outro cara foda!

Fazer uma festa com esse espírito seria um sonho já que hoje, os tempos são outros. Mas seria uma festa muito misturada com gente de todos os tipos, idades, sexos e sexualidades. Shows, lives, drinks, performances e montação, mas sem regras nem dresscode.

Decoração do Estúdio Xingu (que até hoje continua inigualável), DJs e não-DJs também. Muito brilho, muitas cores e luzes, ah e fumaça, muita fumaça.

Se Noporn fosse uma planta, qual seria?

Uma planta carnívora?!

E qual música do Noporn você dedica para Recife?

Vamos dedicar o nosso novo single “Mulher Peixe”, que será lançado dia 13/09 em todas as plataformas digitais. Ela foi feita pro Pará. Estivemos lá no fim de 2018 e fizemos três músicas novas: “Índia Vedete”, “Mulher Peixe” e “Sol de Plumas”, que será lançada em breve. Mas “Mulher Peixe” será executada pela primeira vez no MECA. Fizemos em parceria com o André Lima (Baile de Peruas) e ela é sobre arquétipos femininos brasileiros. São também as primeiras produções do Lucas Freire pro Noporn. E em Recife tem muita “Mulher Peixe” também!

Quer conferir o som de Noporn e de todos os outros artistas que vão tocar no MECABrennand? Confira nossa playlist oficial!

MECABrennand⁠
14 de setembro de 2019⁠
Oficina Brennand — Recife/PE⁠
mecabrennand.com

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Dimas Henkes
MECA // Informação, cultura, criatividade e festivais: um radar da cena cultural do Brasil e do mundo. @mecalovemeca

Curador cultural, estrategista de conteúdo e conector de projetos e pessoas. Diretor do programa Bumbum na rádio Veneno.