Fundadora da The School of Life ensina como viver com mais amor
Sócia-fundadora da filial paulistana da escola, Jackie de Botton valoriza o exercício da inteligência emocional no dia a dia e explica como podemos ser mais felizes
“As pessoas só ficam verdadeiramente interessantes quando começam a chacoalhar as barras das suas jaulas.” A frase de Alain de Botton é uma inspiração permanente para a carioca Jackie de Botton, prima do filósofo e escritor suíço — e fundadora da The School of Life em São Paulo, ao lado da jornalista Diana Gabanyi.
Administradora e economista de formação, Jackie trocou a calculadora por temas tão particulares quanto “como fazer o amor durar” ou “como lidar com o fracasso” quando aceitou a proposta de Alain para abrir a filial da “escola da vida” no Brasil, em 2013. Em entrevista ao MECAJournal, ela defende o exercício da inteligência emocional no dia a dia. “Boa parte do nosso sofrimento vem do desejo de querermos parecer infalíveis”, analisa.
Por que devemos exercitar nossa inteligência emocional?
Quando a gente foi para a escola, disseram que ali aprenderíamos tudo o que importava: gramática, geografia, matemática, os afluentes do Rio Amazonas. Mas ninguém nos ensinou a perdoar, a lidar com opiniões radicalmente opostas, a administrar a falta de afeto. A gente vê que as pessoas perdem muito tempo com a falta de inteligência emocional. E por perder muito tempo, elas erram no mesmo lugar.
Você já disse que autoconsciência é a palavra do ano. Por quê?
“Uma vida não examinada não vale a pena ser vivida”, dizia Sócrates. Não podemos passar o tempo todo jogando a responsabilidade nos outros. Essa consciência de si próprio, da direção da sua vida, só você pode ter. Autoconsciência é a palavra do ano, principalmente quando passamos por um momento tão polarizado. É sempre o outro que está errado. E não é assim. Existem milhões de possibilidades para você viver a vida que quer viver.
"Boa parte do nosso sofrimento vem desse desejo de querer parecer infalível, bem-sucedido, competente, bem casado. Todos nós, 7 bilhões de pessoas, somos de alguma forma falhos. E a forma de lidar com isso é desenvolver nossas vulnerabilidades. É fascinante mostrar como nos sentimos nos piores dias. Ser confiante é estar bem com as partes da sua vida que não estão tão bem. É entender que todos têm vulnerabilidades e sentimentos."
Ao mesmo tempo, o Alain de Botton defende que é preciso lidar com sacrifícios.
Não tem como ganhar de um lado sem perder do outro. Se você é bem-sucedido profissionalmente, em alguma área você é mais fracassado. Se tem uma família excepcional, talvez não consiga montar um império. O sacrifício é uma virtude muito importante, e essa é uma visão adulta. Ser adulto é saber abrir mão de algo e estar bem com isso.
Por que temos tanta dificuldade de expor nossas fragilidades?
Boa parte do nosso sofrimento vem desse desejo de querer parecer infalível, bem-sucedido, competente, bem casado. Todos nós, 7 bilhões de pessoas, somos de alguma forma falhos. E a forma de lidar com isso é desenvolver nossas vulnerabilidades. É fascinante mostrar como nos sentimos nos piores dias. Ser confiante é estar bem com as partes da sua vida que não estão tão bem. É entender que todos têm vulnerabilidades e sentimentos.
Ser brasileiro é uma prova de resiliência?
A resiliência é a capacidade de lidarmos com as adversidades e de sairmos mais fortes. Isso se desenvolve no dia a dia. Ser brasileiro requer uma resiliência enorme. Se você consegue manter um negócio no Brasil ou se consegue morar no Rio de Janeiro e está consciente do que está acontecendo ao seu redor, nesses tempos difíceis, isso é resiliência. O que importa é compreendermos que, ruim ou bem, com dificuldade ou com facilidades, nós estamos vivos. E isso, por si só, é algo maravilhoso.
O que significa a expressão “o amor é um músculo”?
O amor dá muito trabalho e precisa ser exercitado. Outra noção é a das pequenas coisas. Se um avião não decola porque o parafuso do flap está solto, por exemplo, por que questões como onde colocar a toalha molhada são pequenas? São exatamente essas coisas pequenas que vão minando o relacionamento. Mas, antes de tudo, amor-próprio é fundamental. Você não pode amar os outros antes de amar a si mesmo.
Qual é o segredo da empatia?
É preciso entender que não necessariamente quem discorda de você está indo contra você. O que acontece é que estamos nos comportando como crianças crescidas. Qualquer coisa a gente joga tudo no chão, grita, xinga a mãe. É possível discordar e continuar sendo amigo. E se não der, simplesmente é porque não é possível ser amigo de todo mundo.
Saber ouvir é o maior desafio?
Não é apenas por causa do outro que temos que aprender a ouvir. Se você só fala com pessoas que concordam com você, seu intelecto é muito menos estimulado. Não necessariamente eu preciso que as pessoas concordem comigo. Mas também posso mudar de opinião. É libertador quando você se dá essa oportunidade. Mudar de opinião é incrível, é algo poderoso, muito mais do que ficar cristalizado em uma posição só.
Por que parece que as mulheres têm muito mais inteligência emocional? Existe um manual para os homens?
[Jackie solta uma gargalhada, surpresa com a pergunta.] Por sorte, lido com homens muito inteligentes emocionalmente. Acho que pelo fato de a mulher gerar uma criança, de alguma forma isso expande o instinto dela, faz com que seja mais humana. Gerar um filho, de certa forma, é expandir essa visão de entendimento dos outros. Mas nunca pensei nisso, se os homens precisariam de um manual. Pode ser uma boa ideia!
Esta entrevista faz parte da edição #024 do MECAJournal e foi feita pelo repórter Felipe Seffrin.
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