Como você pode fazer política? Em ano de disputas eleitorais, conheça pessoas que estão transformando a democracia brasileira, com amor e engajamento, por meio de iniciativas focadas em compartilhar conhecimento e na ação direta

Fazer política vai muito além de defender seu candidato no grupo de WhatsApp da família, votar consciente ou até mesmo ir para as ruas — ainda que essas atitudes sejam muito importantes. Em ano de eleições, o debate polarizado entre partidos contribui pouco para o país e se torna um motivo a mais para o questionamento: como fazer mais? Além de cobrarmos respostas de Brasília, iniciativas individuais são o caminho possível para uma sociedade mais justa, igual e democrática.

O poder de transformação começa no entendimento do real significado de democracia e passa pela nossa responsabilização individual para além do bipe das urnas. “Entender o que é democracia em todos os sentidos muda tudo: não só o que se referente a governos e políticos, mas o que é ser autoritário ou democrático, participativo e colaborativo”, observa a empresária e pesquisadora ativista Carla Mayumi, 48 anos, hoje à frente da consultoria TalkInc.

“Entender o que é democracia em todos os sentidos muda tudo: não só o que se referente a governos e políticos, mas o que é ser autoritário ou democrático, participativo e colaborativo” — Carla Mayumi.

Em 2014, Carla coordenou a pesquisa “Sonho Brasileiro da Política”, desenvolvida pela agência de tendências Box1824, com o objetivo de mapear o que o jovem de 18 a 32 anos pensa da própria atuação política. A pesquisa com 1.400 participantes apontou que 45% se aproximariam da política se o processo fosse mais transparente. Mostrou que muitos apoiam causas como igualdade de gênero (74%) e meio ambiente (88%) e revelou que 16% dos entrevistados atuam em ONGs ou em novas formas de fazer política.

De quatro anos para cá, muita coisa aconteceu. Percepções politizadas foram consolidadas e novas formas de ver o mundo foram construídas. A sociedade está diante de uma nova geração com expectativas mais conscientes e consistentes. Mas se os dados de 2014 ainda apontam um distanciamento entre os jovens e a forma tradicional de fazer política, a solução é a mesma: através da ação é que vem a transformação.

A pesquisadora, empreendedora e ativista Carla Mayumi desenvolve projetos com foco político como o Fome de Política e a Bancada Ativista.

Ao conhecer uma juventude engajada, Carla decidiu impactar o mundo ao seu redor e se tornou uma ativista social. A atuação política veio a partir da criação e manutenção de múltiplos projetos, todos com a essência democrática e colaborativa. Ela se tornou co-organizadora da Virada Política, evento com financiamento coletivo que leva o debate sobre temas sociais para as ruas. Também ajudou a fundar a Bancada Ativista, movimento mobilizado em torno de candidatos ligados a causas ambientais, de mobilidade, de gênero e raciais. A eleição da vereadora Sâmia Bomfim, em 2014, e a candidatura coletiva de nove pessoas para deputado estadual em São Paulo, em 2018, são exemplos de que o esforço produz resultados palpáveis.

O mesmo impacto também pode ser identificado em outra iniciativa de Carla: o Fome de Política — série de jantares em que recebe amigos e conhecidos de diversas crenças e origens para debater por horas a fio. “As pessoas chegam inseguras, dizendo que nem sabem porque estão ali. Mas, no decorrer da noite, percebem que fazem escolhas políticas o tempo todo”, revela. O jantar foi um marco para desmitificar a política e já incentivou, por exemplo, um casal a realizar mutirões para melhorar as condições de uma escola.

Políticas possíveis

Há muitas formas de fazer política. Algumas já estão estabelecidas e outras ainda podem ser criadas. O exercício político está, por exemplo, na promoção e participação de diálogos construtivos, no apoio e financiamento de causas em que acreditamos, na educação cidadã dos filhos e até dos pais. Está no consumo consciente, na tolerância e na valorização da diversidade. Pode estar no livro que você lê e no filme que você escolhe para assistir no cinema. Afinal, “todo coração é uma célula revolucionária” — frase do filme “Edukators”, de 2004, destacando que qualquer um pode ser protagonista da mudança.

É a partir dessa motivação que Evelyn Gomes, diretora do LabHacker, desenvolve seu ativismo político ao apostar na difusão do conhecimento e do bom uso da tecnologia e da ética hacker. A alagoana de 31 anos desenvolve atividades em várias cidades como o “Cara-a-Cara”, colocando jovens frente a frente com vereadores para explicar quem são e o que os políticos pensam. O Laboratório Brasileiro de Cultura Digital liderado por ela também edita livros sobre política para o público infantil e promove oficinas sobre software livre e projetos de lei para auxiliar a população a protocolar solicitações na Câmara.

“Não adianta ser cool. Temos que ajudar a transformar o mundo” — Carla Mayumi.

“Uma vez, na cidade de Catas Alta da Noruega (MG), com 3 mil habitantes, crianças fizeram parte de uma oficina e levaram um projeto de lei em cartolina. A Câmara teve que aceitar, porque tinha validade”, recorda Evelyn. “Muita gente acha que é preciso estar de terno para acessar o universo político, mas só precisamos entender como o sistema funciona”, defende. “Quando estamos empoderados pela política, nosso poder de transformação social é muito maior.”

Em São Paulo, sete amigos fundaram a Escola Comum, dedicada a criar jovens lideranças na periferia. A escola de governo é gratuita, em um complemento ao ensino médio, e oferece aulas semanais teóricas e práticas sobre temas como economia, política e direitos humanos a alunos de 14 a 19 anos. “A mudança no entendimento deles sobre democracia e pluralidade de ideias é evidente”, comemora o sociólogo paulistano Túlio Custódio, 33, um dos criadores da escola.

À esquerda, o sociólogo Túlio Custódio, um dos criadores da Escola Comum. À direita, registro de uma das atividades do LabHacker.

Por meio de financiamento coletivo, a iniciativa aproxima jovens da periferia a voluntários como Raquel Rolnik, Márcia Tiburi e Djamila Ribeiro. “Queremos oferecer um repertório de referências que eles possam aplicar em seus bairros e áreas de atuação”, explica Túlio. “Isso faz a diferença na vivência de cada um em seus bairros e nos grupos dos quais eles fazem parte. É um ganho absurdo de qualidade de formação e vivência democrática”, conclui.

Quanto maior for o compartilhamento de informações e a nossa consciência de responsabilidade na construção do país, melhor será o resultado. “Não adianta ser cool. Temos que ajudar a transformar o mundo”, conclui a pesquisadora Carla Mayumi.

5 aplicativos para você usar antes das eleições,

indicados pela pesquisadora, empreendedora e ativista Carlota Mingolla:

Guia do Voto // Desenvolvido em parceria com o cientista político Humberto Dantas, o app explica o complexo processo eleitoral e o papel de cada cargoeletivo.

BússolaEleitoral // Plataforma para explorar candidaturas para deputado federal, estadual e distrital que se alinham com seus valores e prioridades.

#MeRepresenta // Ajuda a encontrar candidaturas comprometidas com temas como segurança, trabalho, saúde, educação, raça, gênero e meio ambiente.

#TemMeuVoto // Plataforma independente que usa dados do judiciário e ajuda a encontrar o candidato a cargos legislativos com quem você mais se identifica.

Politize! // Oferece conteúdo multimídia sobre o sistema político brasileiro. Também inclui o app Politiquiz, que testa seus conhecimentos sobre política e cidadania.

Esta reportagem faz parte da edição #023 do MECAJournal e foi escrita pelos repórteres Helder Ferreira e Felipe Seffrin.
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MECA // Informação, cultura, criatividade e festivais: um radar da cena cultural do Brasil e do mundo. @mecalovemeca

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