Quais imóveis a Prefeitura poderia vender com o Projeto de Lei 404?

Bernardo Loureiro | Medida SP
MedidaSP
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3 min readAug 22, 2017

Em breve a Câmara dos Vereadores deve votar o Projeto de Lei 404/2017 (PL 404), apresentado pela gestão Dória em junho deste ano. O PL 404 permite que a Prefeitura venda alguns dos seus imóveis sem precisar passar pela Câmara, como é necessário hoje.

Os imóveis que poderão ser vendidos, segundo o Projeto, são aqueles com terrenos de até 10 mil metros quadrados, desde que não possuam uso "nas áreas de educação, cultura, saúde, esportes e assistência social" há mais de 12 meses.

(De bônus, o PL inclui o imóvel da Prefeitura Regional de Pinheiros, que possui mais de 50 mil metros quadrados, para poder viabilizar a polêmica permuta do Parque Augusta entre a Prefeitura e as construtoras Setin e Cyrela.)

Quantos e quais imóveis poderão ser vendidos se o PL 404 for aprovado?

Ao nosso ver, essa é uma pergunta fundamental que deveria ser respondida no PL 404. Colocado de outra maneira, quais são os critérios e evidências que embasaram a escolha dos fatores que definem os imóveis que podem ser vendidos?

Nossa análise dos dados do IPTU indica que os imóveis com terrenos de até 10 mil metros quadrados representam mais de 25% de todos imóveis da Prefeitura de São Paulo, totalizando 6,8 km quadrados.

Já os terrenos de até 10 mil metros quadrados e que não possuem aqueles usos descritos no PL representam aproximadamente 17% dos imóveis da Prefeitura, também segundo dados do IPTU.

É razoável então estimar que o PL 404 possibilitaria a venda de algo entre 17 e 25% dos imóveis da Prefeitura, sem precisar do aval da Câmara.

Onde ficam esses imóveis?

Essa pergunta é mais difícil de ser respondida, devido à baixa qualidade dos dados de lotes disponíveis. Utilizando os melhores dados disponíveis dos quais temos conhecimento, fizemos o mapa abaixo destacando os lotes da Prefeitura que, de acordo com os dados do IPTU de 2017, se encaixariam nos critérios para venda do PL 404.

Uma breve análise desse mapa revela alguns problemas com os dados. Primeiro, há informações desatualizadas no IPTU, como por exemplo terrenos que estão marcados como vazios mas que estão na realidade ocupados. Segundo, a base de lotes apresenta uma série de inconsistências: há lotes diferentes que possuem os mesmos códigos SQL (setor-quadra-lote), além de vários lotes listados na base do IPTU que não apresentam correspondência com a base de lotes. Além disso, a base de lotes é de 2004, não refletindo mudanças no loteamento desde então.

Uma das prováveis fontes dessas inconsistências é o fato da Secretaria de Finanças, responsável pela cobrança do IPTU, ainda realizar o cadastramento de lotes a partir de croquis desenhados à mão.

Apesar desses problemas, esses dados são os melhores que existem atualmente, e já significam um avanço ao possibilitar uma discussão baseada em evidências sobre assuntos como o PL 404.

Precisamos de dados melhores para gestão e participação

O caso do PL 404 revela a importância dos dados abertos e de qualidade, tanto para a gestão quanto para a participação pública. Sem dados de qualidade, fica extremamente difícil para o poder público avaliar o impacto de projetos como o PL 404, transformando-os ou em um tiro no escuro, ou em um cheque em branco.

Já a abertura e transparência desses dados é fundamental para que vários setores, incluindo a sociedade civil e o próprio legislativo, possam debater com o poder executivo.

Os dados que existem atualmente, com suas falhas e incongruências, não devem servir para nos desmotivar ou para descreditar análises feitas a partir deles. Todos dados possuem uma margem de erro, e o importante é saber os limites dos dados com os quais se está lidando. Por fim, eles devem servir como base para uma discussão mais aprofundada sobre o assunto e de incentivo para produzir e disponibilizar dados melhores no futuro.

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