7 coisas que aprendi sobre a questão “sair ou não sair” de uma rede social
Tenho visto por aqui recentemente um aumento significativo na quantidade de histórias sobre especificamente “deixar o Facebook”. Há histórias de todo tipo, com vários enfoques. Há histórias complexas, como a da americana que explicou de maneira muito detalhada como um stalker que a perseguia no passado voltou a persegui-la por conta do que ela considera uma falha na maneira como a rede social administra suas políticas de privacidade. Há histórias prosaicas, como a de muitos heavy users de internet ( que em muitos casos são heavy users por força da natureza de seus trabalhos), mas que se sentem prisioneiros dos tentáculos sugadores de tempo e alimentadores de procrastinação da rede social. Há também histórias ainda mais simples, algumas intencionalmente bem-humoradas, outras que acabam ficando engraçadas de tão mal-humoradas, mas que tem em comum apenas servir como uma catarse de seu autor. Uma justa necessidade de expelir o fel acumulado por anos de bombardeio de postagens com conteúdo pesado de proselitismo político e religioso, gente que sente um tesão (não admitido, claro) por compartilhar imagens bizarras de animais torturados e despedaçados, interações desconfortáveis com familiares, excesso de informação sobre assuntos desinteressantes e muitos, muitos erros de português.
Depois de tanto ver (confesso, ver mais do que ler pois o número aumenta cada vez mais, sem mudança no assunto) matérias falando sobre “o porque saí do Facebook” que no frigir dos ovos acabam virando um grande sambão de uma nota só, me lembrei de um tempo em que as coisas eram mais simples. Do alto da minha “velhice” (confesso: sou daquelas pessoas que quando pensam em 10 anos atrás, se lembram dos anos 90, e não de 2005) resolvi relembrar de uma outra rede social, das experiências boas e ruins de uma década atrás, do que todos esses anos loucos trouxeram e do quanto essa onda de “sair ou não do Facebook” pode estar fazendo com que as pessoas percam uma boa chance de aprendizado ao polarizar uma questão em termos de “o Facebook é uma merda e eu vou sair” ou “o Facebook é OK e eu vou ficar”. O que nos leva ao título desse artigo, as coisas que aprendi ao descobrir que “sair ou não uma rede social” é dificilmente a melhor pergunta ou a mais certa a se fazer . Vamos a elas…
1-Uma rede social dificilmente será melhor ou pior que o uso que você faz dela.
Eu usei o Orkut. Durante um bom tempo. E foi bom enquanto durou. O advento do Orkut (a primeira rede social que realmente chegou com força no Brasil) coincidiu com a separação do meu primeiro casamento. Num momento da minha vida em que eu me encontrava sozinho e morando numa cidade diferente de onde eu tinha as amizades dos tempos de solteiro, a dinâmica do Orkut caiu como uma luva pra mim. Através da rede social tive a oportunidade de conhecer pessoas novas, estabelecer um novo círculo social, que me levou a frequentar lugares e me divertir. Novos relacionamentos, amizades, namoros, ficadas e afins acabaram sendo consequência desse novo facilitador. Mas além da dinâmica dos Orkontros (quem lembra?) o Orkut possuía um caráter de reunião de pessoas em comunidades de interesse (que até hoje o excesso de imediatismo automatizado e a impermanência dos grupos do Facebook não foram capazes de superar) que na minha experiência pessoal, ofereciam o que havia de melhor naquela rede social. Claro, pra quem tivesse a capacidade de separar o joio do trigo, evidentemente. Você podia perder grande parte de seu tempo em comunidades enormes, com milhares e milhares de pessoas, onde se falavam besteiras e idiotices 24h por dia, 7 dias por semana. Mas também podia fazer grandes amizades, conhecer pessoas inteligentes e interessantes, aprender mais sobre quase qualquer assunto em que pudesse pensar, trocar dicas e conhecer livros, filmes e discos aos quais nunca teria acesso, nessa mesma e democrática ferramenta. Houve uma época em que uma onda de futilidade imbecilizante tomou conta do Orkut. Os famosos “scraps com desenhos” e os “scraps purpurinados” proliferavam como um vírus zumbi mutante. Todos reclamavam que “o Orkut estva um saco”, que “legal era no início”, e que “vou deletar minha conta”. Nascia ali o hoje onipresente MIMIMI. É certo que a onda imbecil era visível e infelizmente abrangente. É certo que o então novato Facebook aparecer como uma alternativa mais interessante naquele momento era tentador pra quem não aguentava mais. Mas algo que a maioria das pessoas deixou passar é que perdeu-se com o Orkut um jeito de se reunir em fóruns que os fóruns tradicionais de internet jamais alcançaram, e com uma dinâmica interpessoal invejável e com uma capacidade de permanência de informações e de privilégio ao conteúdo que o Facebook jamais teve. Eventualmente, a grande maioria dos que estavam no Orkut acabou indo para o Facebook. Mas pra quem soube aproveitar o verdadeiro potencial daquela rede social, o buraco emocional-tecnológico-social que ficou o Facebook jamais conseguiu preencher. E nenhuma outra rede social conseguiu reproduzir novamente. E a única razão para isso ter acontecido foi porque algumas pessoas conseguiram explorar um jeito de usar aquela rede social e tirar um proveito pessoal altamente otimizado daquilo.
2-Redes sociais são como ilhas
Eu penso nas redes sociais como ilhas em um arquipélago perdido. Há semelhanças grandes entre algumas, umas são mais populosas, outras não tem quase ninguém. Umas são maiores, outras são ilhotas de pedra com meia dúzia de gaivotas e um farol. Entre algumas há trânsito frequente de barcos, trocando informações, negociando víveres, e levando e trazendo gente. Já em outras, os habitantes não gostam de sair, preferindo sentirem-se parte de sua ilhota de criaturas estranhas do que se perderem na multidão das ilhas maiores. Volta e meia uma erupção vulcânica submarina faz com que uma ilha afunde para nunca mais ser vista. Em outros momentos, a mesma dinâmica de erupções pode fazer uma ilha aumentar de tamanho, ou receber a população que conseguiu escapar da que afundou. Algo importante pra se pensar é que por mais que se ame uma ilha, se ela é feita só de pedregulhos e gaivotas, você não vai conseguir plantar nela. Em algum momento terá que viver ou pelo menos passar um bom tempo em uma ilha maior pra viabilizar sua convivência, sobrevivência e todo o resto. E ilhas grandes, com metrópoles, enormes populações e cidades complexas podem ser muito frustrantes. Ou você se adapta e aprende a conviver com os desconfortos, ou você cai fora para sua ilhota de pedra. Mas não reclame quando estiver lá, sentir vontade de ver flores e só tiver cocô de gaivota para contemplar.
3-Há bactérias que infestam espécies diferentes
Uma das reclamações que mais vejo quando alguém decide sair de uma rede social é sobre as “pragas” que infestam o lugar. Sejam os posts carregados no proselitismo político ou religioso, sejam os trolls e haters, sejam os parentes sem noção, os amigos inconvenientes, seja qualquer uma das pragas que infestam uma rede, a pessoa às vezes esquece que essas são pragas sociais, que existem desde que o ser humano desceu da árvore. Não são uma exclusividade do Facebook, Twitter ou Instagram. Correntes já circulavam via xerox nos tempos em que eu era criança lá nos anos 80. E eu (já naquela época) me perguntava porque cargas d’água alguém perdia tempo datilografando e depois tirando fotocópias daquela merda! Até hoje não consegui entender o mecanismo mental que leva alguém a querer, gostar, e perder tempo para produzir esse tipo de material… Espero que algum dia alguém explique de maneira satisfatória, ficarei contente ao sanar uma dúvida de décadas. As pragas e chatices são inevitáveis, mas as redes sociais como Facebook, Twitter e afins nos trouxeram uma ferramenta que a vida em sociedade não trouxe: a capacidade de seguir quem você quiser, bloquear pessoas e conteúdos que não deseja acompanhar e filtrar vários tipos de informação. É óbvio que eu sei que a liberdade para fazer esse tipo de filtragem não é total nem perfeita. É óbvio que ainda que se utilize esses recursos, você não está livre de uma besteira ou outra, mas pense bem: se você segue gente interessante, se você escolhe receber feeds e notícias de assuntos do seu interesse, a quantidade de lixo não solicitado vai diminuir consideravelmente. E isso ajuda muito a tornar a experiência de uso menos irritante. Exemplo: se na época do Orkut, houvessem os recursos do tipo “deixar de seguir”, “não quero ver isso” e assemelhados que o Facebook possui hoje, quantas coisas irritantes eu não teria deixado de ver, e talvez a rede pudesse ter evoluído para durar até os dias de hoje. Ok, eu sei que é só um palpite, mas quem sabe?
5-Se você não se diverte, não significa que outros não possam se divertir
Essa é simples. Se você é um fã fiel de heavy metal, pra que vai entrar em uma casa de funk ou pagode? Se você é apaixonado por dançar um forrozinho pé de serra, será que vai se divertir “fritando” por mais de 24 oras ininterruptas numa rave? Claro que vai depender de o quanto eclético você seja, mas creio que deu pra entender, certo? Um metaleiro jamais vai se divertir tanto quanto um funkeiro num baile funk. E o fã de forró não ter aproveitado muito a rave não significa que aquela menina louca por eletrônica não tenha achado a melhor rave que ela já foi. Ou seja, é uma lição muito difícil, não só na convivência em redes sociais, mas na vida mesmo, entender que a nossa visão de um assunto pode variar em infinitos graus de intensidade com a do coleguinha do nosso lado, e que ainda assim nem a nossa nem a dele estarão corretas. Ou erradas. Tudo depende. Tudo muda. O tempo todo. Então, amizade… uma coisa é você não estar se divertindo na festa. Direito que você tem. Outra coisa é a festa estar ruim. Pode estar, pode não estar. Mas se é uma festa com milhões (usar a entonação do Sr. K do Nerdcast aqui, por favor) MILHÕES (!!!) de pessoas, não será APENAS a sua opinião sobre ela que vai valer pra determinar se ela está ruim. Sua opinião, assim como sua bundinha, pertence apenas a você. Pode até coincidir de momentaneamente, muitas outras pessoas compartilharem dela (da sua opinião, claro!) mas não se iluda. Ela continua valendo só pra você.
6-Anúncio de saída passa uma imagem negativa de quem sai
Desde os tempos do Orkut, aqui a regra é simples, e não a estou cagando. Até porque hoje em dia todo chato chama de “cagar regra” tudo que alguém diga que não concorde com o que ele pensa. A regra é antiga, e boa porque faz um bem danado pra quem segue: Se você quiser sair, você sai. Pega seu chapeuzinho no cabide perto da porta, acene um tchauzinho silencioso e elegante, e au revoir. Não precisa escrever textão, não precisa explicar motivo, não precisa passar atestado de carente por atenção. Faça como o Johnnie e aquele cavalo na parada de 7 de setembro: keep walking, largue pelotas generosas e verdinhas (simbólicas, of course) no meio da avenida, e mantenha a cabeça erguida. O povo vai aplaudir assim mesmo. Agora, se deixar cartinha de mimimi-estou-saindo-porque pode ter certeza que os aplausos (mesmo que pareçam) não serão os mesmos.
7-O vício está em você, não na substância
Por fim, se o motivo de você sair é porque você não consegue fazer outra coisa, se é porque você é completamente e compulsivamente absorvido por aquilo de ficar 24/7 na rede social checando coisas, talvez o problema não seja da rede. Talvez deletar seu perfil só abra espaço para uma outra compulsão. Então aí não se trata de o quanto a rede social está fazendo mal pra sua vida, mas sim a falta de atenção que você está dando para suas ansiedades, compulsões, obsessões e afins. Nesse caso, procurar ajuda profissional, médica ou espiritual pode ser mais difícil e caro que deletar seu perfil, mas pode ser infinitamente mais eficaz, porque quando se trata de algo que está enraizado na gente, trabalhar nos efeitos e não nas causas é tapar o sol com a peneira. Ajude-se!