A cidade ficou pequena demais para nós dois

Rafael Barbosa
Medium Brasil

--

Mais uma sexta-feira sentado na sala da minha casa, com as luzes apagadas acompanhado somente pela Alexa, uma playlist de músicas tristes e latas vazias.

Alexa, toca a mais triste do Spotify.
Tocando Falling, de Harry Styles, no Spotify.

Evitei sair por medo de te encontrar.

Essa é uma cidade grande para quem procura o amor. Milhões de pessoas, milhares de lugares para ir. Você pode andar a cidade inteira e não encontrar o amor da sua vida.

Mas para quem já encontrou e perdeu, a cidade é minúscula. Basta virar uma esquina para dar de cara com quem um dia você já amou. Mas quais as chances disso acontecer?

Todo dia que saímos de casa fazemos várias apostas. Voltar vivo ou parar debaixo de um ônibus? Pegar trânsito bom e chegar ao trabalho no horário ou enfrentar um congestionamento de horas? No meu caso, a única aposta que importa é se eu vou ou não te encontrar. Nesse caso, as probabilidades estão todas contra mim e essa já é uma aposta perdida.

A cidade ficou pequena demais para nós dois.

Mas existe uma diferença entre te ver e te encontrar. Eu não tenho medo de te ver. Já te vi algumas vezes. Em uma delas você quase me viu. Por alguns segundos eu tive certeza disso. Mas você continuou conversando como se nada tivesse acontecido. Acho que teria esboçado pelo menos alguma reação.

Bom, pelo menos gosto de pensar que você não me viu. Me machuca menos que a ideia de saber que hoje sou tão insignificante quanto uma pessoa qualquer que cruza o seu olhar em um sábado a noite.

Te ver ainda dói. Mas é uma dor suportável, parecida com a picada de agulha durante um exame de sangue. Você sabe que ela está entrando em sua veia para tirar algo essencial para a sua vida. Mas dura poucos segundos e não extrai o suficiente para te matar.

Te encontrar seria diferente. Envolve muita coisa, de medos à expectativas. Envolve não saber como vou reagir ao mesmo tempo em que eu sei exatamente o que vai acontecer. Será que vou perder o controle de tudo o que consegui recuperar nos últimos meses? Te encontrar é sentir medo que os cacos que juntei ainda não estejam bem colados e a brisa da sua presença seria o suficiente para espalhar tudo novamente.

Meu medo de te encontrar é ter de encarar o seu olhar. Da última vez em que nos vimos, ainda existia um pouco de amor. Não o suficiente para ficar, mas ainda estava ali. Pude ver por trás das suas lágrimas em nossa despedida. Hoje, temo que esse olhar já não tenha nenhum amor por mim.

Eu sei que é muito provável que não tenha, mas é como diz aquele ditado: o que os olhos não veem, o coração não sente. E não sei se o meu coração está preparado para sentir que realmente acabou.

Te encontrar seria uma dor parecida com abrir meu peito sem anestesia e arrancar meu coração ainda pulsando. Eu não sobreviveria por muito tempo, apenas o suficiente para encarar a inevitabilidade do fim.

Então prefiro me esconder em casa, no escuro, virando dose atrás de dose esperando a tristeza passar ou ficar tão bêbado a ponto de esquecer os últimos anos da minha vida.

Já aceitei que é impossível te esquecer. Me resta apenas descobrir quantas latinhas faltam para o fim da minha tristeza.

Parei de contar na primeira.

--

--

Rafael Barbosa
Medium Brasil

Eu escrevo. Às vezes sai algo legal. Insta: @rafabarbosa