A máquina do tempo era um Jipe.

Juliana Gallo
Medium Brasil
2 min readMay 22, 2015

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É possível que eu tivesse uns nove anos na última vez que andei de Jipe. E quando digo Jipe, me refiro ao calhambeque dos anos 50 usado na guerra e com conforto zero, daqueles criados para ser o melhor amigo do homem com uma bazuca ou metralhadora nas mãos.

Esse Jipe em especial pertencia ao meu avô. Sem cinto de segurança ou qualquer outro tipo de segurança, era de cor marrom e com partes já descascadas pelas quais era possível ver o metal original brilhante. As portas mais pareciam um primeiro rascunho do que deveria ser o desenho pronto de uma porta de verdade.

Eu era uma criança, pouco importava a segurança zero do veículo. Aliás, imagino que tenha sido justamente essa falta segurança que fez com que meu avô saísse vivo de um acidente em um lago na beira da estrada. E o Jipe também.

Mais do que o destino que o jipe nos levava, o melhor mesmo era a aventura que ele proporcionava. O conforto era paliativo, gerado por um pelego colocado na carroceria para sentarmos. Ou tentarmos, já que a cada metro da estrada de chão encontrávamos os mesmos buracos que faziam com que saltássemos quase para fora. É bom destacar que até hoje eu tenho a absoluta certeza que seria mais seguro se eu ficasse de pé na traseira do jipe do que sentada.

E, se sentar na carroceria era um “problema”, sentar na frente era ainda pior, uma vez que o sol intenso fazia com que o assento se tornasse um Super Bonder.
Mais do que esses momentos de alegria e dores no traseiro, o que ficou guardado na minha memória foi o cheiro que se podia sentir toda vez que entrava no jipe: um perfume rústico cujas notas olfativas eram a combinação de gasolina, poeira da estrada e raios sol escondidos entre as molas do assento. Era a fragrância de um domingo ensolarado pela manhã.
Se a estrutura do jipe não era nada confortável, o cheiro causava um aconchego maior do que qualquer estofado de couro.
Eu havia esquecido completamente disso. Até que eu entrei em um Jipe diferente, em um lugar diferente, em uma época diferente e senti exatamente o mesmo aroma de felicidade que até então eu pensava estar esquecido entre as muitas lembranças da minha infância.

Sorri feito uma boba. Quem diria que a minha máquina do tempo seria um Jipe do tempo da guerra?

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