A tristeza é o sentimento primordial
Às vezes estou no meu quarto em frente ao computador escrevendo algum texto ou deitado na cama lendo um livro e de repente me vem alguns flashes de momentos da minha infância.
Talvez seja algum gatilho inconsciente relacionado a algo que digitei, escutei em uma música ou li em algum livro. A lembrança vem muito forte e de forma muito aleatória.
Mas ela não vem sozinha. Vem sempre acompanhada de uma certa tristeza.
Não que eu ache ruim envelhecer. Pelo menos até o momento, quando posso dizer que estou no ápice da minha vida — em relação ao que já vivi até agora — eu realmente não tenho problemas com essa questão da idade.
Mas lembrar da minha infância me leva de volta a um tempo em que as coisas realmente eram simples e mais fáceis.
Me levam de volta a uma época em que eu ainda podia dar um abraço e um beijo em parentes que já não estão mais aqui.
Me levam de volta a uma época em que as amizades eram diferentes e de certa forma me pareciam mais sinceras.
Também me leva de volta para algumas lembranças que eu preferia esquecer ou simplesmente não ter vivido.
Isso me faz pensar que talvez o estado de espírito padrão de todos os seres humanos é a tristeza.
E em meio a tristeza, a gente tem alguns momentos de felicidade, outros de paz, alguns de raiva e até mesmo de excitação.
Porém tudo volta a ser tristeza em algum momento.
É claro que algumas pessoas se sentem mais tristes que as outras.
Eu, por exemplo, sei disfarçar muito bem o fato de estar triste em 99,9% do tempo.
Mesmo contando uma piada ou rindo, no fundo sempre existe aquele sentimento mais forte que a gente luta para manter escondido.
Eu não conheço ninguém que é feliz o tempo inteiro.
Acho que você também não conhece.
Talvez nem exista uma pessoa assim no mundo.
Acredito que o ser humano não foi criado para ser feliz.
Já reparou como todo mundo gosta de falar que a felicidade está nas pequenas coisas da vida?
Em compensação, a tristeza, a raiva, o ódio e todos os outros sentimentos ruins são facilmente despertos pelas outras coisas da vida, aquelas que são gigantes.
Quando eu compreendi que algumas pessoas ao meu redor usavam a bebida e as drogas para afastar esse sentimento permanente de tristeza, a sensação foi a mesma de descobrir o verdadeiro sentido da vida.
Ainda me surpreende o fato de não ter cedido a esses subterfúgios.
Talvez meu vício seja a tristeza. O meu barato. O que me dá onda.
Talvez o impacto da realidade que vem logo após a ressaca seja forte demais para aguentar.
Se me perguntar por que eu sou assim, não saberei te responder.
Não faço ideia de quando começou.
Tenho a impressão que já nasci assim, com um estoque de tristeza permanente.
Acho que eu era feliz até descobrir a tristeza. Desde então ela se tornou meu sentimento favorito.