Ana Lúcia.

Eri6ck Lota
Medium Brasil
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5 min readAug 8, 2017

Suava deitada em sua cama, um sonho intenso, acordou ofegante e molhada, não sabia o que era aquilo a anos, não sonhava daquela forma a anos.

Tomou um banho frio, não queria ceder aos desejos, colocou a agua do café no fogo e pegou o jornal na porta ainda vestindo roupão, fechando rápido para que ninguém a visse, muito menos desse bom dia, ter sonhado daquele jeito não fazia daquele dia um bom dia.

Tomou café lendo a parte dos horóscopos, a luz da manhã atravessa a janela do lado da mesa da cozinha, janela que dava para a mata com o Cristo Redentor ao fundo. “Hoje é o dia em que você encontrara seu grande amor.” não gostou do que leu. Depois dessa perdeu o interesse, jogou o jornal de lado, terminou o café e foi para o computador.

A muito Ana Lucia desistirá do amor, a muito desistira da vida lá fora também, não precisava, depois de tantas decepções, realmente não precisava.

Com 18 anos terminou a faculdade e por sorte conseguiu um emprego em uma grande agencia de publicidade, em pouco tempo se transformou em uma das sócias, mas enquanto tinha sorte na vida profissional em outros quesitos sua vida desandava. Só
naquele primeiro ano de trabalho sofreu 15 assaltos, depois que comprou o primeiro carro foi assaltada novamente, além disso, nunca conseguiu se envolver com ninguém e apesar de ser uma mulher linda, de olhos verdes, corpo todo “no lugar” e sorriso perfeito não dava sorte com homens, algo nela repelia o sexo oposto a tal ponto que com 22 anos não sabia o que era beijar na boca, cansada, se trancou em casa, perdeu todos os amigos, mas ainda ganhava muito dinheiro trabalhando de casa com a agencia, passou a fazer suas compras na internet, guardou suas melhores roupas e sapatos no lado do armário que nunca abria e sabia que não precisava de mais nada além do que tinha, não queria mais decepções, não queria mais correr riscos.

Agora com 50 anos as ruas do Rio a assustava mais do que nunca, em todo local as notícias que lia e via na tv só falavam de mortos, bandidos, assaltos e tiroteios, nada na rua lhe dava motivo para sair do conforto de sua casa.

Porem aquele dia começou estranho.
Ana se via diferente das meninas que conhecia uma vez ela mencionou para uma antiga amiga que seu sonho era encontrar um amor, não apenas para casar, ter uma família, mas sim para transar, muito, todo dia, o quanto pudessem a partir daquele momento a amiga passou a olhar para Ana com um jeito diferente e ela apenas pensava; “até parece que mulheres não
têm desejo sexual, eu tenho e muito.” Mas o sonho era ter um amor e apenas esse amor e ali, do alto de seus 50 anos continuava virgem.

Sentada na frente do computador começou a trabalhar, precisou abrir o Google e quando olhou ao redor do site todas as publicidades diziam; “hoje é o dia em que você vai encontrar seu amor.” Ficou vermelha de raiva, não conseguiu fazer mais nada, desligou o PC e voltou para o quarto.

Deitada na cama olhando para o teto pensava na sua vida, tudo parecia lhe dar sinais, sentia que aquele era um dia diferente e depois de alguns minutos perdida em meio aos seus pensamentos resolveu que sim, aquele era o dia em que finalmente encontraria um amor, precisa sentir um homem, anos dentro de casa não apagaram aquilo que ela sentia e pela primeira vez, sentiu que poderia arrumar alguém.

Levantou rapidamente da cama, sentiu uma energia enorme em seu corpo, sentiu aquele tesão que não sentia a anos, lembrou de um bar que suas antigas amigas viviam a chamando para ir, diziam que lá seria um ótimo lugar para achar alguém, que muitas delas arrumaram namorados lá; “será que 30 anos depois o bar ainda existiria?” pensou rapidamente com a certeza de que ia arriscar, sabia onde era. Entrou na internet, abriu o Maps, olhou e o bar estava lá.

Abriu o armário em um lado onde ficavam as roupas de “sair” a muito tempo guardadas, o cheiro de naftalina e poeira tomou conta do ambiente, pegou aquele vestido verde que amava tanto, pendurou de frente para a janela, encheu de perfume que também estava guardado no armário a anos e graças a deus não estragará; “perfume francês é outra coisa!” pensou sorrindo.

Se sentia animada, sentia algo que não fazia parte de sua vida a muitos anos, no banho, fantasiou sobre tudo chegando até um possível casamento; “calma Ana, uma coisa de cada vez.” Quando saiu do banho o vestido não estava mais impregnado com aquela cheiro de guardado, vestiu e ainda cabia perfeitamente, não saia mas se alimentava muito bem, fazia alguns exercícios e mesmo na idade em que estava seu corpo era praticamente o mesmo de quando era nova, como tinha seios pequenos, bunda pequena quase nada caiu e isso a deixava muito feliz, para completar colocou aquele broxe que ganhara de sua tia, um broxe enorme de esmeralda, colocou afixado entre os seios denunciando mais ainda sua idade.

Estava arrumada, pouca maquiagem, detestava, desceu o prédio, saiu pelo portão, parou de frente para rua e tremeu um pouco, estava quente, mas era a primeira vez em anos que colocava o pé na rua, a rua suja e empoeirada do seu bairro.

Passou o primeiro taxi e ela deu sinal, parou em um caixa, sacou dinheiro, estava tão animada que nada era impedimento. Em menos de 20 minutos estavam no bar.

Entrou sorrindo, se sentia ótima, a noite estava agradável, o bar estava até um pouco cheio, sentou no balcão, pediu um Bloody Mary, sua bebida favorita, tomou um gole e ficou olhando ao redor, os homens que ali estavam nem lhe olhavam, recebeu alguns olhares quando entrou, mas nenhum que parece algo, mas, a esperança queimava seu peito e sua calcinha.

Duas horas depois, dois drinques depois ainda esperava o bar cheio, pessoas bem mais jovens que ela passavam de um lado para o outro com suas cervejas, suas vodcas, suas bebidas e seus sorrisos, sentavam ao seu lado e era como se ela não existisse, sentiu que não se encaixava ali e sendo assim, ninguém iria notar
sua presença. Quatro horas depois pagou a conta e saiu carregando o pior sentimento que poderia ter, sozinha, cansada e nem bêbada estava, completamente desolada e decepcionada com o universo, não, não conseguiu amor algum aquele dia.

Chegou em casa, tirou o vestido, abriu o armário e tacou lá dentro, fechou com a chave e jogou pela janela, deitou na cama, seu corpo ainda quente, sua mente ainda bagunçada pelo álcool, seu coração pesado, olhou pro teto por alguns minutos, colocou a mão por baixo da melhor calcinha que tinha, se masturbou e depois de gozar, um orgasmo de ódio, de solidão, de raiva da vida, chorou, chorou e dormiu, não precisava de nada por que simplesmente não podia ter nada, se trancaria de novo naquela casa e aquela dor embalou seu sono até de manhã.

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Eri6ck Lota
Medium Brasil

"Não grites, não suspires, não te mates: escreve."