Cada um escolhe suas prisões

sobre os vícios do dia a dia

Helena
Medium Brasil

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Na década atual podemos perceber uma insistência numa discussão que inunda todos os meios de comunicações possíveis: o aprisionamento. É quase um consenso na juventude intelectual associar o alienamento a prisões e jaulas. Assistir televisão: prisão. Passar o dia inteiro na frente do computador: prisão. Relógio: prisão. Rotina: prisão. Regimes capitalistas: prisão. Consumismo: prisão.

Para essa geração revolucionária, quase todos os hábitos fazem parte de uma alienação universal. É claro que todas as opiniões são divulgadas através de redes sociais, enquanto sentados em sua poltrona confortável no escritório, em casa, dentro da rotina que tanto repudia.

Ao mesmo tempo em que se critica a sociedade em que vivemos, uma onda de conformismo afoga quase todos os pensamentos revolucionários involuntariamente. Liberdade acaba tornando-se um sentimento utópico. E então a necessidade de sentir-se livre invade quase com a mesma intensidade que a urgência de ser diferente. E é nesse momento em que começamos a procurar conforto em um outro tipo de prisão: os vícios.

Procuramos qualquer coisa que nos faça sentir humanos. Procuramos, dentro dessa sociedade tecnológica, conforto no calor de outros braços, sentimento que nunca poderá ser substituído por cabos e telas. Procuramos sensações que nos façam sentir exclusivos, como se nenhum outro ser vivo nos 13,5 bilhões de anos de existência do universo se sentisse da mesma forma.

No nosso sentimento natural e evolucionista, sentimos urgência por algo que nos cause danos físicos e nos faça sentir vivos, mesmo que nos deixe à beira da morte. No nosso sentimento individualista, sentimos urgência de expressar-nos através de arte e deixar uma marca sem igual no mundo, para que nossos descendentes saibam que estivemos aqui. No nosso sentimento filantrópico, sentimos urgência de ajudar o próximo. E no nosso sentimento mais humano, sentimos a urgência de compartilhar a vida, pensamentos, sentimentos, urgências, alienações e prisões com outra(s) pessoa(s).

A urgência de sentirmos que não estamos a sós no mundo, de que alguém compartilha das mesmas confusões e complicações e existencialismos e manias sempre será superior a qualquer outro tipo de urgência e sentimento revolucionário. Afinal, revolução não se faz sozinho.

E então nos encontramos em bares, em cafés, em festas, em parques, etc, para discutirmos e compartilharmos os mesmos vícios e extravasar as mesmas necessidades, tão semelhantes e ao mesmo tempo tão singulares.

Fumando, bebendo, dançando, beijando, transando, discutindo, conversando, dormindo, acordando, compartilhando, amando.

Ser humano não é uma coisa que se faz sozinho. Ser singular não é uma coisa que se faz sem ser semelhante. Amor nunca será um sentimento independente, assim como a humanidade nunca será individual, e ambos sempre estarão entrelaçados, enrolados e inseparáveis.

Somos um conjunto de substâncias químicas. E encontramos outras substâncias que nos trazem sensações artificiais, incapazes de serem produzidas naturalmente. Encontramos em outros corpos uma amplificação dessas sensações: naturais ou artificiais. Todas essas sensações transformam-se em vícios, nos aprisionando automaticamente. Libertar-se desses vícios é um desafio que, na maioria das vezes, não é necessário aceitar.

Algumas prisões a gente escolhe.

Algumas prisões nos trazem liberdade.

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