Há vida (ou morte?) inteligente em Detroit

Odemilson Louzada Junior
Medium Brasil
Published in
2 min readJun 7, 2015

--

Assistir o filme It Follows, traduzido numa daquelas já clássicas pegadinhas de marketing de distribuidora brasileira com o título mais-trash-impossível de “Corrente do Mal”, é uma experiência interessante. Adianto que o filme do diretor David Robert Mitchell não é a descoberta da pólvora ou a invenção da roda, mas como vive-se um momento do cinema onde os gêneros de terror e suspense andam tão pasteurizados e pouco criativos, onde os recursos técnicos de fácil acesso estão tornando os filmes cada vez mais parecidos num mar de mesmice, chega a ser antipático alguém querer criticar esse filme só pra parecer gostosão “diante das câmeras”. E que a sua chegada nesse exato momento em um cenário tão patético e previsível fazem com que seu valor de mercado acabe subindo, em face à indigência do mercado.

Com um belíssimo olhar para a decadência de Detroit servindo como cenário, It Follows me surpreendeu inicialmente por mostrar jovens e adolescentes se comportando como jovens e adolescentes, como pessoas reais, e não como simulacros de adultos idiotizados e precocemente. Esqueça os simulacros de adultos deformados por uma estética que é típica dos jovens de filmes da geração do selfie, do duckface, das redes sociais. Esqueça Crepúsculo, esqueça Gossip Girls esqueça essa adolescência relegada a um status pós-hannahmontanesco de celebridade. Aqui, adolescente tem cara, jeito e personalidade de adolescente. Com tudo de bom e ruim que isso traz.

Apesar de aparentar se passar nos dias de hoje, o filme bebe direto da fonte estética dos anos 80, com ecos visuais rendendo homenagens claras ao legado de Halloween, Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo. E mesmo procurando inspiração na linguagem visual dos citados, a trama tem personalidade ritmo próprios, onde rende homenagem a elementos mas não se limita a eles, com alguns momentos de trabalhos de câmera, fotografia e enquadramentos muito evocadores do cinema dos anos 70 também. Ponto para o diretor e sua produção, que dessa mistura bem dosada, acaba conseguindo mostrar as maiores qualidades de terror e suspense do filme não ao se escorar apenas no apelo visual ou numa cópia de estilo, mas através da construção de uma atmosfera de angústia, da expectativa de um mal que se aproxima lenta, porém inexoravelmente, e pela originalidade da forma como apresenta esse mal na história. O fato do filme se negar a optar pelos sustos pré-fabricados com mudanças repentinas da equalização do som, ou das aparições repentinas, ou ainda pelo caminho torturantemente batido do found footage, servem como motivos de aplauso. No fim, seria correto dizer que não se trata de um grande ou genial filme, mas de um pequeno e discreto filme com algumas grandes qualidades.

--

--

Odemilson Louzada Junior
Medium Brasil

Desde 1974 driblando a lei de Murphy. Conseguindo na maioria das vezes.