Momentos

Gabriel Hislla
Medium Brasil
Published in
3 min readMay 16, 2016

Há momentos que eu queria trazer de volta,
ou copiar,
ou viver minha vida toda até chegar naquele ponto de novo,
dar a volta.
Ou pelo menos segurá-los, que te segurar naquele dia foi muito bom
e por mais coincidente que seja a natureza, a tua beleza e a astronomia
nenhum alinhamento de planetas faz jus àquelas circunstancias.

Sintonia.

O formato exato que tuas centenas de milhares de fios de cabelo tomaram
assim que te tomei e nossos corpos consentiram
e a textura que senti nisso
e os calafrios que não me deixariam mentir
e nossas temperaturas, a minha, a tua
a do mar abaixo de nós, a do vento passando
a do sol acima de tudo.

A textura dos teus lábios
mais o gosto da tua saliva
mais o gosto de sal
mais o cheiro de nós
mas enquanto o tempo passava,
mais o tempo passava.

Um momento é feito de todas essas coisas
e muitas outras, é feito de todas as coisas.
E um momento só é momento se não faltar nenhuma delas
e nenhuma delas jamais vai voltar,
não juntas,
nunca mais.

Terei teu cabelo um dia, talvez teu beijo em outro, talvez eu use a mesma roupa na quarta feira e a gente se esbarre por coincidência,
mas aquela coincidência, por mais que queira,
está nos esperando em um momento que já passou.

Um momento é isso. Um momento é uma coincidência universal acontecendo o tempo todo, mas que nunca mais se repetirá. Um momento não tem a ver com o tempo, o momento é todo o resto. O tempo é só o adversário. O tempo te mostra esses momentos, por um tempo, pra dar oi e adeus e viver pra sempre em saudades.

A gente vê o tempo como se fosse roteiro,
como se fosse contínuo,
como se o ontem fosse o capítulo anterior de hoje
que constrói o arco do amanhã
que aponta pra um final feliz,
mas me diz se alguma coisa termina,
me diz se alguma coisa começa,
me diz se não está tudo indo.
O tempo todo indo.
Todo primeiro segundo continuando no segundo seguinte.

O passado e o presente e o futuro.

O passado é uma caixa desorganizada de peças de mesmo valor.
Não há distinção no seu passado.
Depois de certo tempo,
não há mais tempo ou menos tempo,
tudo é passado.
O passado são mil fotos sobrepostas
ao mesmo tempo.

Eu estou agora te beijando naquela praia;
Eu estou agora vendo o último aceno de meu vô antes de morrer,
que Deus o tenha;
Eu estou agora com 12 anos e ainda acredito em religião;
Eu estou agora sozinho no chão da minha sala;
Eu estou agora certo da minha solidão no mundo;
Eu estou beijando pela primeira vez;
Eu estou agora sem certeza de nada;
Eu estou te beijando de novo;
Eu sou momentos.

Tudo o que eu sou é o agora
e todos as coincidências universais
que um dia
por coincidência
testemunhei.

Eu sou momentos.

Há momentos que eu queria trazer de volta.

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