O Caso Cocielo e a necessidade de gestão de imagem e carreira para influencers e youtubers

Rafael Barbosa
Medium Brasil
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5 min readJul 3, 2018

Quem acompanhou o Twitter nos últimos dias viu a repercussão dos tweets racistas do youtuber Júlio Cocielo.

Tudo começou quando ele fez um comentário sobre o jogador Mbappe da seleção francesa.

A internet não passou pano (ao contrário de outros youtubers amigos dele) e caiu em cima. Buscaram tweets antigos e o que se viu foi um show de frases com alto teor racista.

Como era de se esperar, as marcas que mantinham alguma campanha ativa com Cocielo, entre elas Adidas, Itau, Coca-Cola, Submarino e Gilette, foram cobradas a se posicionar. E a posição foi de encerrar contratos e repreender qualquer tipo de preconceito.

Esse texto não é para “explicar” o que houve. Nos links acima você consegue ter uma visão de todo o desenrolar da história. Eu quero falar é sobre a responsabilidade dos youtubers e digital influencers sobre o que publicam em suas redes sociais e como eles não estão preparados para lidar com situações como essa.

Preconceito não é mais tolerado

Estamos em 2018. É impossível que uma pessoa que trabalha produzindo conteúdo para a internet não esteja por dentro das discussões que acontecem diariamente sobre este assunto.

Diariamente temos exemplos de produtores de conteúdo que são “expostos” após comentários racistas, misóginos, sexistas, machistas ou homofóbicos. E o que acontece é exatamente o que o Cocielo está vivendo agora: críticas, perda de patrocínios, contratos e relevância.

Não há mais espaço para esse tipo de comentário (ou piada, como ele disse).

A pessoa tem que ser completamente alienada para não se informar sobre esse assunto. Pior ainda: sabendo que influencia mais de 16 milhões de pessoas no Youtube, 11 milhões no Instagram e 7 milhões no Twitter, alguém como ele deveria ter a responsabilidade de refletir sobre o que fala nas redes sociais e como isso será interpretado.

No caso do Cocielo é ainda pior pois no início do ano sua esposa, a youtuber Tata Estaniecki, passou pela mesma situação. Ela foi ao baile da Vogue com uma mascara que simulava um instrumento de tortura usado contra escravos.

Quando abordada sobre o assunto, sua justificativa foi: “É uma homenagem aos escravos”.

Não é possível que depois dessa situação e toda a repercussão que teve na época, o Cocielo faça um comentário desses sem imaginar que poderia ofender alguém e ser interpretado como o que foi: um comentário racista.

Toda a situação me fez questionar se com todo o alcance que esses influenciadores possuem, não há nenhum tipo de assessoria por trás.

Profissionalismo e gestão de imagem

Uma das discussões mais antigas quando falamos sobre produção de conteúdo na internet é a “profissionalização”. Começou com os blogs e hoje em dia discute-se bastante em relação aos Youtubers e Instagrammers profissionais.

É um mercado que já movimenta milhões de reais no Brasil. E a tendência é que o investimento aumente nos próximos anos.

Um dos motivos que explica o sucesso e o crescimento desses perfis é a identificação do público com as suas histórias.

A audiência enxerga o youtuber como alguém parecido. Não existe essa distância de antigamente entre os “astros da televisão” e os fãs. O produtor de conteúdo está interagindo com os seguidores no Twitter ou curtindo o comentário de um usuário no Instagram.

No dia a dia isso é ótimo.

Mas quando acontece uma situação como a do Cocielo, percebemos que muitos não estão preparados para lidar com esse tipo de crise. É nessas horas que precisamos cobrar o profissionalismo que tanto se discute.

Fica cada vez mais claro que Youtubers e influenciadores digitais não tem a menor noção de como falar e se posicionar em uma situação como essa.

Estão tão acostumados a falar a “mesma língua” do seu público, adolescentes na maioria, que quando é necessário uma postura mais adulta e madura, acabam se complicando justamente por não ter essa maturidade e noção do impacto que suas palavras tem.

Não é o caso de todos. Alguns influenciadores digitais possuem equipes que fazem a gestão da sua imagem e de carreira por trás, mas são aqueles que estão há mais tempo no mercado, movimentam maiores quantias de dinheiro e falam para um público mais adulto.

O que não é o caso aqui.

Quando as primeiras críticas surgiram, a reação do Cocielo foi “culpar quem interpretou errado”.

Imagem retirada do Buzzfeed

O que se espera de uma pessoa que está representando várias marcas e falando para um público que ainda está formando a sua própria opinião é o mínimo de profissionalismo para reconhecer um erro e se desculpar.

Jogar a culpa em quem está interpretando errado e ficou ofendido é um dos comportamentos mais tóxicos que existe. É como se o problema não fosse um comentário racista e sim a interpretação racista de quem se sentiu ofendido.

Quando percebeu que a situação pegou mal, ele apagou o tweet. Só algumas horas depois foi se manifestar novamente com um pedido de desculpas e aí já era tarde demais.

É nesse momento que uma assessoria se faz necessária. Ter alguém com vivência em gestão de crises que saiba orientar sobre o que deve ou não ser dito.

Ele estava errado. Não havia nenhuma justificativa para o fato de ter feito um comentário racista. E a forma como se justificou e depois se desculpou só agravou ainda mais a situação.

Eu não sei se essa é uma das pautas do YOUPIX em suas oficinas para “creators”, mas vejo a necessidade urgente desses influenciadores aprenderem como gerir a própria imagem e carreira.

A partir do momento em que você se torna uma pessoa pública, todas as suas palavras adquirem um peso muito maior. Ao falar para milhões de pessoas, é preciso entender que haverá diversas interpretações do que foi dito.

No caso de um comentário racista, quem disse pode até não ser alguém racista, mas valida e dá voz a quem é. E sabemos que esses discursos sobrevivem justamente por isso.

As marcas estão cada vez mais atentas aos seus embaixadores. Com as mudanças que o Youtube vem realizando em sua plataforma, esses produtores de conteúdo estão cada vez mais dependentes de contratos publicitários. E nenhuma marca quer se associar à pessoas que propagam qualquer tipo de preconceito.

Chegou o momento de influenciadores digitais começarem a pensar com mais cuidado em suas carreiras. Reputação só se perde uma vez e, nesse mercado, ela é uma das principais ferramentas do sucesso.

Ou você se adapta e evolui ou fica para trás.

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Rafael Barbosa
Medium Brasil

Eu escrevo. Às vezes sai algo legal. Insta: @rafabarbosa