o equilibrista

gabriela arthur
Medium Brasil
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2 min readJul 9, 2014

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os dois sabiam que precisavam se despedir, mas evitavam falar no assunto. como se o não falar fosse prorrogar o tempo que teriam juntos, fosse modificar a situação, fosse inventar um final feliz para aquela história. como se o não falar fosse evitar o inevitável: a partida dele.

ela nunca havia sido tão preenchida de vazio. tão grande que até transbordava em lágrimas. o coração doía tanto que até lhe faltava o ar. as pernas bambeavam e por alguns segundos até desaprendeu a andar.

ela queria pedir: “fica, vai” mas ele não iria escutar. respondia com a tranquilidade de um equilibrista profissional caminhando em uma corda bamba. passos firmes, não hesitava em instante algum. olhos fixos ao horizonte, nada o poderia atrapalhar. não tinha pressa, afinal, não existia um tempo mínimo para completar aquele trajeto. apenas precisava chegar ao outro lado sem nenhum arranhão.

ela não tinha dúvida de que ele iria conseguir.

ele tinha um foco admirável.

não que ela admirasse isso nele.

ela queria o tirar dali, mas não sabia muito bem como fazer isso. checa seu arsenal e não encontra uma arma sequer capaz de mudar o rumo daquela história. pensa em subir também na corda, mas tem vergonha de seu desequilíbrio. não seria capaz de andar cuidadosamente, com passos lentos e destino certo. queria voar sem saber para onde, experimentar um pouco daqui, depois um pouquinho mais de lá. definitivamente a corda bamba não era sua atração predileta. mas esse era o único jogo que ele sabia jogar.

checa o relógio e estima que tem tempo até o final do trajeto. a única certeza é a do desembarque na plataforma oposta. aceita que de nada adiantará ela, coadjuvantemente, apenas apreciá-lo. ela abre as asas na busca de algum outro jogo que seja mais habilidosa. se ao menos soubesse a hora do apito final, poderia se posicionar na linha de chegada e lá do alto gritar: “então vem”.

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