O tempo está sempre com pressa

Rafael Barbosa
Medium Brasil

--

Eu não sabia se a visão embaçada era pela chuva no para-brisa ou pelas lágrimas nos meus olhos. Já não gosto de dirigir a noite com chuva. Chorando, é uma experiência de quase morte. Se bem que naquele momento morrer não me parecia uma ideia tão ruim assim.

Ainda me lembro da música que tocava enquanto você saía do carro, sem olhar para trás, decidida a ir embora. “And I get the feeling that you’ll never need me again. Suspirei, resignado, e soltei o que havia segurado por todo o caminho. A respiração, as lágrimas e a certeza de que estava te vendo pela última vez.

Um milhão de pensamentos vieram à tona. O que eu poderia ter feito de diferente? O que eu poderia ter dito que fizesse você ficar? Se eu não existisse, você estaria chorando uma hora dessas? Se nunca tivéssemos cruzado o caminho um do outro, nossas vidas seriam diferentes? Isso é um pesadelo e eu irei acordar daqui a pouco? Dói pensar em todas essas coisas, mas pensar em você indo embora me machuca ainda mais.

Eu imaginei como seria esse dia. E tive certeza que sou péssimo em imaginar as coisas. Ou talvez o nosso cérebro não seja capaz de imaginar uma dor tão forte. Existem casos de pessoas que passam por traumas físicos tão violentos que o cérebro simplesmente se desliga para não sentir a dor. Mas naquele momento o meu cérebro estava bem desperto, registrando cada segundo e montando um plano sequência que me atormentaria pelos próximos meses.

Parecia cena de filme. A música, a chuva e os personagens. Só que nos filmes você sabe que o casal fica junto no final. Na vida real é mais complicado. Na maioria das vezes, esse é o final feliz que você pode esperar: uma despedida relativamente tranquila, sem brigas e sem ódio. Mas ainda assim é uma despedida.

Dei a partida no carro quando o que eu mais queria era ficar. Seria a última vez que faria aquele trajeto. Eu sabia a distância exata que nos separava. Pelo menos a física. A emocional já não era possível calcular.

Às vezes sinto que ainda estou preso naquela noite. A noite sem fim. Tão infinita quanto a minha tristeza. Acho que hoje completa um ano. Não tenho certeza, pois parei de contar os dias. Hoje, tudo o que eu queria é que o tempo tivesse parado naquele sábado antes do fim.

Mas o tempo está sempre com pressa e não espera por ninguém. Nada permanece. E me apego a essa verdade como um passageiro que se segura nas barras de um ônibus desgovernado. Tudo passa. A saudade e a tristeza talvez demorem um pouco mais.

Enquanto isso, escrevo para fazer o tempo passar.

--

--

Rafael Barbosa
Medium Brasil

Eu escrevo. Às vezes sai algo legal. Insta: @rafabarbosa