Quando o beijo encaixa é foda

Hélder Silva
Medium Brasil
Published in
1 min readDec 18, 2019

Em meu repertório de saudades consta um beijo. Ele está junto às saudades que renascem com a persistência daquelas plantas em frestas de concreto. Poderia estar descrito no capítulo dedicado ao sabor, mas talvez fique melhor em outro, entre textura e tato. Está entre amassar com vontade uma massa de pão e meter a mão para fora da janela de um carro em movimento, entre tomar sol em um dia frio e deitar de bruços no lençol recém trocado.

Esse beijo poderia estar também no capítulo dos lugares, perto do parágrafo que registra a lembrança da Praia da Concha: corpo aberto, quase livre; mormaço tomando a pele; choque de mar. Talvez se encaixe na mesma página da varanda — que é qualquer varanda e não uma específica — o cômodo que me deixa suspenso, distante da realidade, apreciador do presente e do que posso ver somente.

Esse beijo já está por toda parte. Ele impregnou meu repertório, deu nova complexidade às minhas saudades: quando mato alguma delas, já não fico satisfeito, nem mesmo temporariamente. Sobra uma fração qualquer de falta.

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