Roteirista de estação
O que os olhos vêem e a mente cria
Gostaria de poder me orgulhar do meu senso de direção, mas não sei me guiar por mapas, tenho uma gigantesca dificuldade em memorizar caminhos por ser altamente distraída. Acaba sendo normal me perder pelos lugares. Procuro sair de casa com antecedência por me conhecer bem demais, por saber que a pontualidade não é uma das minhas melhores qualidades. Mas minha distração não é de toda ruim, acabo descobrindo lugares e conhecendo coisas novas. Sou expectadora de cenas e situações que jamais seriam perceptíveis se meus olhos fossem adestrados pela pressa, se subestimasse a simplicidade e o banal.
Tenho o costume de namorar as vitrines dos sebos e de outras lojas sem compromisso, de escutar as canções que tocam nas ruas, de mudar a melodia ao atravessar os sinais. Paro para admirar os grandes prédios, as construções velhas, os artistas de calçada, malabaristas, palhaços, cantores, saxofonistas… Gosto de observar as pessoas e de imaginar suas histórias.
Tenho hábito de criar roteiros inteiros na cabeça. Se estou presa no trânsito sufocante de Recife, na fila do banco ou do supermercado, faço isso principalmente para passar o tempo. É um exercício criativo. Imagino seus nomes, o que fazem, para onde vão, o que estão pensando. Tento adivinhar o tom de suas vozes, suas personalidades, suas preocupações.
Fico tão imersa em suas histórias que perco a noção do tempo, quando percebo já chegou minha vez de passar as compras no caixa, de sacar o dinheiro ou de descer na próxima parada.
Tenho manias inevitáveis, quando dou por mim já estou olhando alguém atravessar a rua.
“Na rua do Sossego, uma moça descabelada anda pela calçada sem prestar atenção aos transeuntes. Pelo ritmo dos passos, pelo olhar aflito, está provavelmente indo para o aeroporto tentar impedir o amor de sua vida embarcar numa viagem sem volta para um país distante e pouco conhecido, ou quem sabe esqueceu o forno ligado?”
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