Simpatia, quase a/dor/
“Esse vai pro Centro?”, assim começou nosso diálogo que durou da Estação Cantagalo até a Carioca. Eu, indo pro trabalho e ela, uma senhora de uns 60 e poucos anos, encontrar uma amiga pra pegar um livro que “ela nunca leva”.
— Esse não vai só até Botafogo, né?
— Não, os que vão até Botafogo são da linha 2, quando vêm da Pavuna.
— Ah, mas outro dia eu peguei na Arco Verde e ele parou em Botafogo e não seguiu.
O assunto foi desenrolando e passou por segurança pública, política, obrigação de votar, “aquele maldito nojento do Lula que não gosto nem de ouvir o nome… bandido”, pela sua vida festeira “desde sempre”, culminando num “sambinha que tem ali em Botafogo”.
A cada novo assunto eu reduzia mais as minhas intervenções, limitando ao mínimo pra não deixá-la falando sozinha. Sabe quando a gente fala “verdade”, “isso mesmo”, “é…”, mas depois cai na asneira de abandonar esses recursos e realmente falar algo?
Foi quando vieram as afirmações de que o nosso sistema penal deveria ser igual a dos Estados Unidos, pois “lá eles prendem menores… é ruim de eles não saberem o que fazem… sabem sim. Outro dia prenderam um garoto de 14 anos… pegou prisão perpétua”. “Eu tenho até pena, mas antes eles do que eu ou meus filhos e netos”. Intervim:
— Mas imagina… uma pessoa que fique desde os 14 anos em prisão perpétua, que naquelas condições não vai durar mais que 60 anos… vai ficar pelo menos mais 46 anos preso. E a gente vai estar pagando por isso (não ia nem mencionar penas alternativas, já que faltavam apenas 3 estações pra ela descer e corria o risco dela resolver continuar lá… pensei rápido!)
— Pra mim todos eles deveriam ir pra uma ilha cheia de tubarões em volta… Não tem comida, vai e planta… se vira.
(Confesso que sou favorável aos detentos gerarem produtos, trabalharem e se auto-sustentarem de alguma forma. Acredito que seja mais benéfico pra mente e pra alma do que ficar nadafazendo o dia inteiro… só uma reflexão.)
— Político também é tudo ladrão… ladrão de elite. Não vou votar nas próximas eleições. Vou fazer greve. Se todo mundo fizesse greve eles iam se estrepar. Não voto. Se um candidato me der um apartamento de luxo e dinheiro no bolso até penso no caso dele. E esse monte de árabe que tem por aqui agora… Acho até que valia a pena dar uma grana pra eles e mandar atirar umas bombas em Brasília. Matava tudo. Ia se uma maravilha, não acha? No dia da votação eu vou pra praia, curtir o sol. Sempre fui festeira. Vou perder meu tempo?
Daí já emendou: — Hoje tem um sambinha… é de graça, a não ser quando o Diogo [Nogueira] toca… Vai lá se não tiver opção de programa melhor. — E saiu.
Tudo isso em uns 10 mi-nu-tos…
Acho que da próxima vez (como se desse pra adivinhar) vou dar uma de turista e dizer: — I don´t speak portuguese, sorry. E torcer pra pessoa não responder de volta.
